Entre o pânico e o descaso, a imbecilidade!

Presidente Jair Bolsonaro participa das manifestações contra o Congresso e o STF no dia 15 de março de 2020 (Foto: José Cruz/Agência Brasil)

Artigo publicado originalmente no Blog do Frederico Vasconcelos, do jornal Folha de S.Paulo, no dia 16 de março de 2020.

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O que é desconhecido sempre nos assusta. Especialmente quando se trata de um vírus, com capacidade letal, para o qual ainda não temos vacina. Natural, portanto, que muitas pessoas neguem a gravidade da pandemia e que, inclusive, ajam em sentido exatamente contrário ao recomendado: saíam as ruas, debochem das medidas de prevenção.

Essas pessoas, de certo modo, refletem a mesma histeria coletiva daquelas que se encerram em um quarto e estocam alimentos, preocupando-se apenas consigo mesmas, enquanto exigem que seus empregados sigam trabalhando para servi-los.

Entre o pânico e o descaso, o que mais assusta, porém, é a imbecilidade de quem, ciente da gravidade da doença e tendo o dever de agir para prevenir a disseminação e proteger a população que o elegeu, adota conduta absolutamente irresponsável.

Na América Latina, enquanto praticamente todos os demais países adotaram medidas de prevenção, suspenderam aulas ou restringiram o trânsito de pessoas em rodoviárias e aeroportos, no Brasil o presidente saiu às ruas domingo cumprimentando e fazendo selfies, mesmo sabendo que pelo menos 11 pessoas da comitiva de sua última viagem aos EUA estão infectadas.

A histeria coletiva que pode levar tanto ao pânico quanto ao descaso é melhor evitada quando as autoridades demonstram serenidade e preocupação com a adoção de medidas de prevenção. Afinal, estamos falando de uma doença que para as pessoas com condições precárias de saúde ou com mais de 80 anos pode atingir uma taxa de mortalidade de até 20%. Não é pouca coisa.

Estamos falando de um país em que faltam vagas em leitos hospitalares, especialmente no inverno, mesmo sem pandemia. Um país que contingenciou os gastos com saúde por 20 anos e que, portanto, tem hoje menos capacidade de atendimento do que tinha há dois anos. Um país desgovernado.

É urgente a adoção de medidas simples, como a distribuição gratuita de álcool gel e a suspensão das atividades escolares ou que de algum modo gerem aglomeração de pessoas, e de medidas estruturais, como a revogação da Emenda Constitucional 95, que promoveu corte orçamentário, além de um pesado investimento em saúde e em distribuição de renda aos miseráveis.

Subestimar um vírus que pode ser letal não é apenas infantilidade ou maldade. É crime de responsabilidade, que atinge toda a população brasileira.