Brasil: Nada a celebrar no Dia de Prevenção aos Acidentes de Trabalho

No mundo, de acordo com as estatísticas da OIT, a cada 15 segundos, morre uma pessoa em virtude de um acidente de trabalhado ou de doença relacionada com a sua atividade profissional. Ou seja, 6300 mortes por dia num total de 2.3 milhões de mortes por ano.

No Brasil, segundo dados do Observatório de Segurança e Saúde no Trabalho, elaborado pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), de 2012 a 2020, foram notificados 5.589.837 acidentes de trabalho e 21.467 trabalhadoras e trabalhadores brasileiros, perderam suas vidas como consequência de acidentes de trabalho, - uma taxa de 6 óbitos a cada 100 mil empregos formais nesse período. Calcula-se que 1 morte ocorra a cada 3h 51m 28s.
O Brasil vivencia um violento processo de retrocesso social, exatamente no mesmo momento em que o país é assolado pela maior crise humanitária e de saúde vivenciada no Século XXI, encontrando no país um ambiente de negacionismo, obscurantismo, falta de empatia e descaso que nos impediu de enfrentar esta chaga por meio de políticas públicas adequadas, atingindo de forma avassaladora as nossas trabalhadoras e trabalhadores, que perderam suas vidas ou que sofreram sequelas, inclusive de natureza mental.
Os dados recentes do Caged dão conta que o número de pessoas que tiveram o contrato de trabalho encerrado por morte do trabalhador, cresceu em 70% no último ano. Ainda que as estatísticas oficiais não estabeleçam o percentual de mortes decorrentes da Covid 19 e os ambientes em que a contaminação ocorreu, é fato que os dados demonstram que as trabalhadoras e trabalhadores nos setores saúde, de segurança e vigilância e transporte de cargas concentram o maior número de desligamentos por morte entre 2019 e 2020, de acordo com dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged). Os riscos de contaminação por COVID 19 nestes setores, em razão das especificidades das atividades desenvolvidas, são superiores a outros setores econômicos, o que leva a inexorável conclusão da contaminação dos trabalhadores em seus ambientes de trabalho. 
A Carta Constitucional de 88 considera como direito fundamental a proteção ao meio ambiente, incluído o meio ambiente do trabalho, e na consagração do Estado Democrático de Direito considera a dignidade da pessoa humana um valor supremo, destacando que a ordem econômica tem por finalidade assegurar a todos a existência digna, conforme ditames da justiça social. 
Hoje, no dia nacional da prevenção de acidentes do trabalho, precisamos repensar o modo de produção. A compatibilização dos princípios do trabalho digno com a livre iniciativa é essencial para a viabilidade da própria vida humana e é a aplicação do princípio do Desenvolvimento Sustentável, que deve servir de baliza para atuação de todos os atores sociais. É urgente buscar um mundo que seja capaz de adotar uma lógica diferente. A única forma eficaz de fazer face a novos e antigos riscos passa pelo estabelecimento de uma forte cultura de prevenção que garanta a saúde e a segurança dos ambientes de trabalho, dando efetividade ao princípio constitucional da integridade psicofisiológica do trabalhador, estabelecido no inciso XXII do artigo 7º da CRFB/88, cujo dispositivo prevê que é direito dos trabalhadores a redução dos riscos inerentes ao trabalho por meio de normas de saúde, higiene e segurança no trabalho, com a adoção de medidas voltadas para a efetiva proscrição dos acidentes de trabalho. 
 
Afinal, viver bem é permitir que todos vivam bem, não somente alguns.
 
Germana Morelo e Ana Paula Alvarenga são juízas e associadas da AJD