PROCESSO TRT/15ª REGIÃO Nº 01622-2004-000-15-00-5
MANDADO DE SEGURANÇA COM PEDIDO DE LIMINAR
IMPETRANTE : BANCO DO ESTADO DE SÃO PAULO S. A. - BANESPA
IMPETRADO : JUIZ DA 2a. VARA DO TRABALHO DE AMERICANA
LITISCONSORTE PASSIVO: CÍCERO MANOEL DE ARAÚJO
Trata-se de Mandado de Segurança impetrado pelo BANCO DO ESTADO DE SÃO PAULO S.A. - BANESPA (fls. 02/14), em face da r. decisão do MM. Juiz 2ª da Vara do Trabalho de Americana, que deferiu antecipação de tutela na reclamatória trabalhista nº 01237-2004-099-15-00-0 determinando a reintegração do reclamante.
Afirma que a resilição do contrato de trabalho não foi discriminatória, não havendo nenhuma ilegalidade na dispensa, pois inexiste previsão legal que proíba a dispensa do portador do vírus HIV ou que determine a sua reintegração no emprego, dando guarida à garantia legal de emprego. Argumenta que exerceu seu direito potestativo de dispensa. Aduz que há flagrante violação ao art. 5º, II da Constituição Federal.
Alega ainda que em razão do litisconsorte não estar afastado, bem como não ter desenvolvido os sintomas da doença, não pode ser mantida a reintegração.
Por fim argumenta que não estão presentes os requisitos do art. 273 do CPC, necessários para a concessão da tutela, havendo perigo de irreversibilidade do provimento antecipado.
Pugnou pela concessão de liminar para suspensão do ato atacado, face a manifesta violação a direito líquido e certo.
Fls. 68 - Os autos foram distribuídos ao Exmo. Sr. Juiz Edison Giurno.
Fl. 69 - Foi indeferida a liminar e solicitadas as informações da autoridade dita coatora.
Fls. 74/77- Prestadas as informações.
Fls. 78 - Cessada a convocação do Exmo. Sr. Juiz Edison Giurno, os autos foram remetidos a esta Relatora.
Fls.79 - Determinada a citação do litisconsorte e a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho.
Regularmente citado, o litisconsorte não apresentou manifestação.
Fls.90/91 - Parecer do Ministério Público do Trabalho pela improcedência do mandado de segurança.
Agravo Regimental encontra-se apensado.
Relatados.
V O T O
A decisão atacada (tutela antecipada concedida anteriormente à prolação de sentença) não comporta recurso de imediato. Também, não há notícia nos autos que já tenha sido proferida sentença no feito trabalhista, em que o ato impugnado fora exarado. Assim, de acordo com a jurisprudência dominante do C. TST, entendimento cristalizado pela OJ nº 50 da SDI-2 é cabível a presente ação mandamental, pois impugna tutela concedida anteriormente à sentença de primeiro grau.
O banco impetrou a presente ação rebelando-se contra tutela concedida na ação trabalhista que determinou a reintegração do litisconsorte no emprego. Argumenta que tal decisão não pode prevalecer, pois não cometeu nenhum ato discriminatório, como foi alegado pelo reclamante na ação trabalhista, além disso, argui que a decisão viola direito líquido e certo.
O impetrante justificou a dispensa do litisconsorte, aduzindo que na localidade onde o reclamante laborava, este não foi o único a ser dispensado, o que bastaria para validar a demissão e afastar a alegação de discriminação e que não há embasamento legal para manter a antecipação de tutela concedida pelo r. Juízo impetrado.
Entendeu a autoridade impetrada que o fato do reclamante ser soropositivo, militava em seu favor a presunção que a demissão seria uma ato discriminatório, em razão de ser portador da referida patologia. Justificou que diante do quadro que lhe foi apresentado estavam presentes os requisitos jurídicos necessários para a concessão da tutela.
Feitas essas ponderações, ressalto que se tratando a presente ação de Mandado de Segurança, por evidente que, somente pode ser apreciado nessa via eleita pelo impetrante, se a decisão que concedeu tutela antecipada, incorreu em ilegalidade ou abuso de poder. NADA MAIS.
Não há que se perquirir, nesse feito, sobre a legalidade ou ilegalidade da dispensa efetivada pelo impetrante, já que tal matéria é específica e própria de discussão na ação trabalhista, jamais em sede mandamental.
Ademais, não obstante o impetrante sustente que a motivação da dispensa não se tratou de ato discriminatório, a apreciação da matéria é inerente à ação trabalhista. E, em sede mandamental, não é permitido se adentrar ao mérito do feito onde se originou o ato atacado, como já explanado acima.
Como se vê, o enfoque a ser dado neste feito, concentra-se na verificação de ilegalidade ou abusividade de direito da autoridade dita coatora, quando concedeu a tutela antecipada. E no provimento jurisdicional concedido, ora atacado nesta ação, não vislumbro qualquer prática de ilegalidade ou de abuso de poder por parte da autoridade impetrada, até porque presentes os requisitos do artigo 273 do CPC.
Apenas a título de argumentação e reforço para demonstrar a ausência de ilegalidade ou abusividade no ato hostilizado na presente ação, às fls. 51 consta prova inequívoca ser o impetrante portador do vírus HIV. O fundado receio de dano irreparável restou evidente, visto que, infelizmente, trata-se de patologia sem cura, o que inexoravelmente acarreta a extrema necessidade de se manter trabalhando, até para o devido custeio do tratamento médico. Se todo cidadão tem o direito em trabalhar para suprir as suas necessidades básicas, com maior razão em relação àquele que, infelizmente, foi acometido por um mal físico maior. O artigo 1º, inciso III da Carta Magna c/c inciso XLI do artigo 5º também da Lei Maior concedem como garantia fundamental a dignidade do ser humano. Entendo ser esta uma garantia primordial. Não observo qualquer violação ao princípio da igualdade, como suscitado pelo impetrante.
Sopesando os fatos, em maior desigualdade estaria o litisconsorte, por além de estar acometido por um mal físico incurável, estaria afastado da sua atividade produtiva, não podendo inclusive manter suas condições de sobrevivência. Já a arguição do impetrante que a manutenção do litisconsorte o oneraria, não resta evidenciado, pois terá a força de trabalho em contrapartida, portanto, a contraprestação paga pelo impetrante, será em virtude da força de trabalho que continuará a usufruir.
Necessário esclarecer ainda que toda a problemática de fundo da ação trabalhista (AIDS), preocupa as autoridades públicas, pois atingiu um nível alarmante, inclusive sua maior incidência é na população em idade produtiva, por tais motivos, não poderia deixar de repercutir na esfera trabalhista.
As razões em exame não lograram demonstrar a violação de direito líquido e certo do impetrante, que tornasse possível a concessão da segurança pretendida, com o fito de cassar a ordem de reintegração do litisconsorte, deferida em antecipação de tutela.
Em recente julgado o C. TST, pronunciou-se quanto ao tema, conforme ementa, que ora peço venia para transcrever:
RECURSO ORDINÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. ATO DO JUIZ QUE LIMINARMENTE ANTECIPA A TUTELA, DETERMINANDO A REINTEGRAÇÃO DO RECLAMANTE NO EMPREGO. AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. Segundo a atual jurisprudência desta Corte, consubstanciada na Orientação Jurisprudencial nº 142 da SBDI-2, inexiste direito líquido e certo a ser oposto contra ato de Juiz que, antecipando a tutela jurisdicional, determina a reintegração do empregado até a decisão final do processo, quando demonstrada a razoabilidade do direito subjetivo material, como nos casos de anistiado pela Lei nº 8.878/1994, aposentado, integrante de comissão de fábrica, dirigente sindical, portador de doença profissional, portador de vírus HIV ou detentor de estabilidade provisória prevista em norma coletiva. Recurso a que se nega provimento.( ROMS 4/2003-909-09-00, DJ - 25/06/2004, Rel. Ministro Barros Levenhagen)
Não bastasse, vale ressaltar que, uma vez acolhido o pedido de tutela antecipada, somente prova robusta da inexistência dos pressupostos que fundamentaram a decisão atacada aconselhariam sua revogação. Não é o que se verifica no presente caso.
Como já afirmado anteriormente, a manutenção do vínculo, não ocasionará qualquer gravame impossível de ser suplantado pelo empregador, pois, usufruirá da força de trabalho do reclamante, e arcará com a correspondente contraprestação(remuneração). Indene de dúvidas que não haverá prejuízo irreparável ao impetrante, independentemente do resultado final da reclamação trabalhista.
Amparando essa conclusão, podemos citar o seguinte julgado:
“Mandado de Segurança. Antecipação de tutela. Cabimento. Contra a concessão de tutela antecipada não há recurso previsto em lei para reexaminá-la na Justiça do Trabalho, razão pela qual entendo possível a impetração de mandado de segurança, desde que presentes os requisitos legais, como no presente caso.
Mandado de Segurança. Antecipação de Tutela. Reintegração. Tratando-se de execução de obrigação de fazer, notadamente de reintegração de trabalhador antes da sentença de mérito, é possível a tutela antecipada, em razão da verossimilhança do direito postulado a autorizá-la, já que a eventual demora na entrega da prestação jurisdicional definitiva causará prejuízos ao trabalhador, face a natureza alimentar dos salário e a impossibilidade de estabilizar-se em outra relação empregatícia, sem considerar o fato de que a prestação de serviços por parte do empregado não acarreta nenhum dano ao empregador. Portanto, a decisão impetrada foi proferida dentro dos limites da lei.” (grifo nosso)(TRT 15a Região-Seção Especializada-Ac. 246/00-A - Processo 659/98-MS, Relator Juiz Antonio Tadeu Gomieri, DOE 25/03/2000, pág. 2)
Destarte, a determinação do Impetrado mostra-se lícita e regular, não sendo cabível a pretensão externada neste mandamus.
Posto isto, decido: julgar improcedente a ação mandamental e denegar a segurança pretendida, observada a fundamentação supra.
Custas pelo impetrante, no importe de R$ 200,00, calculadas sobre o valor dado à causa.
MARIANE KHAYAT
Juíza Relatora