O Pânico e sua Reação

Marcelo Semer

Não há quem não tenha assistido, estarrecido, aos acontecimentos do final de semana do dia das mães no Estado de São Paulo. Cadeias entregues aos detentos, policiais entregues à própria sorte e a população entregue ao pânico. Nos dias seguintes, outro medo tem tomado conta da sociedade, de que a barbárie enfim tenha prevalecido, e que suspeitos estejam sendo executados numa ação de revide.

É importante que a reação à afronta às instituições seja firme, mas não ilegal. Os fatos devem ser esclarecidos e responsáveis punidos na forma da lei, cujo respeito é indispensável para a preservação do Estado Democrático de Direito. O momento exige serenidade, inclusive para evitar que o sensacionalismo e a demagogia provoquem mudanças legislativas que piorem a situação.

É preciso ter em conta que o recrudescimento da legislação penal instalado na década de 90 (em especial com a Lei dos Crimes Hediondos), aumentou exponencialmente a população carcerária, sem qualquer impacto na redução da criminalidade. O Estado de São Paulo tem hoje, sozinho, a população carcerária que o Brasil tinha há cerca de dez anos atrás, cento e cinquenta mil presos.

Nunca se sentiu tanto a ausência do Estado em seu próprio reduto. Nem somos capazes de agir para trazer os reeducandos ao convívio social, nem para mantê-los sob disciplina. Não se cumprem normas de respeito à integridade dos detentos e não há instrumentos de ressocialização. Tampouco funcionam mecanismos de controle. Cinco anos depois da rebelião que tomou o controle de dezenas de instituições prisionais, ainda soa como promessa a proibição de celulares, presos aparecem portando armas, e a droga corre solta nas cadeias. No vácuo de poder, facções criminosas filiam presos como se fossem organizações partidárias, intimidam detentos e vendem proteção como verdadeiras máfias.

É necessário retomar o controle dos presídios, fortalecer as polícias e aumentar a capacidade de integração dos sistemas de segurança. Mas não é necessário recrudescer a legislação, basta cumpri-la. Maior prisionalização só fará aumentar o exército de franco-atiradores à disposição das organizações criminosas.

Marcelo Semer, é juiz de direito em São Paulo e presidente do Conselho Executivo da Associação Juízes para a Democracia