Desempenho está aquém das Expectativas

Marcelo Semer

O corporativismo foi um dos impulsionadores da resistência dos setores mais tradicionais do Judiciário à idéia de controle externo. Recentes deliberações do Conselho Nacional de Justiça, no entanto, permitem questionar se o corporativismo também não se imiscuiu no próprio órgão de controle.

Nas últimas semanas, soube-se que o CNJ pretendeu instituir jetons para seus membros, possibilitando furar o teto fixado na Constituição Federal. Encaminhou projeto para criação de uma centena de cargos, vários deles de livre provimento, preenchidos por indicação, e não concurso. Cedeu a pressões e permitiu a retomada das férias coletivas, contrariando determinação expressa da Constituição.

É verdade que o Conselho Nacional de Justiça ainda palmilha para encontrar lugar no horizonte institucional. Também é certo que tomou decisões corajosas, como a resolução contra o nepotismo, prática patrimonialista e anti-republicana. Mas seu desempenho ainda está aquém das expectativas. O conselho tem supervalorizado uma função legisladora, preocupando-se mais em editar minuciosas resoluções do que em efetivar cumprimento das determinações, como ocorreu com a exigência de critérios para a promoção de juízes ou a limitação do teto salarial.

Deu pouca relevância à democracia interna no Judiciário e mesmo ao primado da independência do magistrado. Indeferiu requerimento para preservação do princípio do juiz natural, mantendo a livre designação de juízes pelas presidências dos tribunais, o que ofende o predicado da inamovibilidade. Teve conduta hesitante na questão da eleição para os órgãos especiais dos tribunais. Impediu a votação, no primeiro momento, e depois acabou por restringir os cargos em disputa. Por fim, esvaziou a atuação democrática no interior dos tribunais plenos, obstando a modernização da administração.

A Justiça é serviço público e deve responder ao princípio da transparência, permitindo ao cidadão o controle de seu funcionamento. Por isso, a idéia de controle externo não pode ser desprezada. Mas sem o apego a princípios básicos - como o prestígio à independência do juiz e à moralidade administrativa sem espírito de corpo, além do respeito à democracia interna - o CNJ dificilmente se desincumbirá a contento de seus objetivos.

*Marcelo Semer, juiz de Direito em São Paulo, é presidente do Conselho Executivo da Associação Juízes para a Democracia

[ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL "O ESTADO DE S. PAULO", NA EDIÇÃO DE 07/12/06]