DECISÃO - Indenização suplementar: Juros compensatórios - SP

Recurso Ordinário Trabalhista 0010100-58.2018.5.15.0125

Processo Judicial Eletrônico

Data da Autuação: 08/10/2019

Valor da causa: R$ 38.000,00

Partes:

RECORRENTE: NELITO CORREIA DE ANDRADE ADVOGADO: ALINNE MARCI CORREA BARBOSA ADVOGADO: TIAGO DE MELO RIBEIRO ADVOGADO: EDUARDO SILVA CORREA ADVOGADO: BETANIA TORRACA DE TOLEDO

RECORRIDO: FERTRON AUTOMACAO E ELETRICA LTDA - EPP ADVOGADO: JOAO DOS REIS OLIVEIRA

ADVOGADO: TALITA REZENDE DE ALMEIDA RECORRIDO: VIRALCOOL - ACUCAR E ALCOOL LTDA. ADVOGADO: RICHARD DANIEL SOLDERA DA COSTA ADVOGADO: GISELI DE PAULA BAZZO LOGO ADVOGADO: JULIANA GARCIA DE TOLVO ZAMONER

 

Identificação

3ª TURMA - 6ª CÂMARA

PROCESSO TRT/15a nº 0010100-58.2018.5.15.0125 RECURSO ORDINÁRIO

RECORRENTE: NELITO CORREIA DE ANDRADE

RECORRIDO: FERTRON AUTOMAÇÃO E ELÉTRICA LTDA. - EPP RECORRIDO: VIRALCOOL - AÇÚCAR E ÁLCOOL LTDA. ORIGEM: 2ª VARA DO TRABALHO DE SERTÃOZINHO

JUIZ SENTENCIANTE: WELLINGTON CÉSAR PATERLINI

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Ementa

EMENTA: CORREÇÃO  MONETÁRIA  E JUROS TRABALHISTAS. ENTENDIMENTO FIXADO PELO STF NAS ADCs 58 e 59. INCONSTITUCIONALIDADE DA TR. APLICAÇÃO DO IPCA-E E DA TAXA SELIC (ART. 406 DO CÓDIGO CIVIL). EQUIPARAÇÃO DO CRÉDITO TRABALHISTA AO CRÉDITO CIVIL.       INDENIZAÇÃO        SUPLEMENTAR        (JUROS COMPENSATÓRIOS). APLICAÇÃO DO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 404 DO CÓDIGO CIVIL

  • ATUALIZAÇÃO DO CRÉDITO: IPCA-E E SELIC (ART. 406 DO CÓDIGO CIVIL)

 Apreciando o mérito das ADCs 58 e 59, o STF, em dezembro de 2020, definiu a nova forma de atualização dos créditos trabalhistas e rechaçou a aplicação da TR, substituindo-a pelo índice do IPCA-E. Além disso, afastou a aplicação dos juros de mora fixados na Lei n. 8.177/91, limitou a aplicação do IPCA-E até a data da citação (notificação do reclamado) e determinou a aplicação, desta data em diante, da taxa SELIC, conforme previsto no art. 406 do Código Civil, fixando o pressuposto da equiparação dos créditos trabalhistas aos créditos civis.

II-  MODULAÇÃO

Conforme definido na Resolução 672/2020, publicada pelo STF no dia 18/12/20:

  • são reputados válidos e não ensejarão qualquer rediscussão (na ação em curso ou em nova demanda, incluindo ação rescisória) todos os pagamentos realizados utilizando a TR (IPCA-E ou qualquer outro índice), no tempo e modo oportunos (de forma extrajudicial ou judicial, inclusive depósitos judiciais) e os juros de mora de 1% ao mês;
  • devem ser mantidas e executadas as sentenças transitadas em julgado que expressamente adotaram, na sua fundamentação ou no dispositivo, a TR (ou o IPCA-E) e os juros de mora de 1% ao mês;
  • os processos em curso que estejam sobrestados na fase de conhecimento (independentemente de estarem com ou sem sentença, inclusive na fase recursal) devem ter aplicação, de forma retroativa, da taxa SELIC (juros e correção monetária), sob pena de futura alegação de colisão com o posicionamento do STF (art. 525, §§ 12 e 14, ou art. 535, §§ 5º e 7º, do CPC).

III-  LIMITAÇÃO TEMPORAL

A aplicação desses parâmetros, no entanto, só tem vigor a partir da vigência da Lei n. 13.467/17 (11/11/17), vez que as ADCs 58 e 59 se destinavam, precisamente, a questionar a constitucionalidade do § 7º do artigo 897 da CLT, que foi introduzido pela referida lei. Antes disso, o índice de correção monetária trabalhista, inclusive para devedores entes públicos, será o IPCA-E (a partir de 30/06/2009), acompanhado dos juros fixados na Lei n. 8.177/91.

IV-      EFEITO DA EQUIRAÇÃO. REPARAÇÃO DE DANOS E INDENIZAÇÃO SUPLEMENTAR/JUROS COMPENSATÓRIOS (APLICAÇÃO DO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 404 DO CÓDIGO CIVIL)

A decisão do STF, de forma vinculante, equiparou o crédito trabalhista ao crédito civil e é a partir dessa equiparação que se deverá, enfim, conceber o desrespeito ao direito trabalhista como um ato ilícito, o que impõe a superação da restrição indevidamente imposta de onerar o desrespeito à lei, que se integra aos contratos de trabalho na forma de conteúdo obrigacional, apenas com os efeitos da incidência de juros mortuários judiciais (desde a propositura da reclamação) e correção monetária, atraindo, por consequência, a possibilidade de se imputar ao empregador que agiu ilicitamente a obrigação de reparação das perdas e danos experimentados pela vítima, sendo que a indenização resultante poderá, inclusive, ser fixada de ofício pelo juiz, conforme prevê expressamente o art. 404 do Código Civil, seguindo as diretrizes traçadas para o regramento da responsabilidade civil, nos moldes dos artigos 186, 187, 927 e 944 do Código Civil.

O dano, no caso, está pressuposto (não requerendo, pois, uma prova) pelo próprio fato de que os juros praticados (ainda mais quando aplicáveis apenas a partir da propositura da reclamação, momento em que, segundo o novo padrão fixado, deixa de se aplicar a correção monetária, pois, em concreto, a SELIC é uma taxa de juros) são incapazes de cobrir o prejuízo do trabalhador que somente depois de anos vai reaver o que é seu por direito, sendo esta exatamente a hipótese tratada no parágrafo único do art. 404 do Código Civil (que, ademais, se aplica mesmo quando os juros de mora tenham sido fixados, fazendo com que a sua incidência não esteja impedida pela aplicação do art. 406).

A aplicação do parágrafo único do art. 404 do Código Civil, ademais, é o que garante que efetivamente se caminhe, como determinado pelo STF, em direção a uma equiparação do crédito trabalhista ao crédito civil, até porque o art. 406 do Código Civil, adotado pelo STF para a supressão dos juros de mora fixados na Lei n. 8.177/91, diz, expressamente, que a SELIC, abrangendo os juros, só teria incidência quando o contrato não estipula a questão de modo diverso.

Ocorre que nos contratos cíveis o credor tem totais condições de "impor" cláusulas moratórias, gerando como efeito que previsão do art. 406 do Código Civil raramente tem aplicabilidade, instaurando-se debates jurídicos, isto sim, tão somente com relação aos denominados "juros abusivos". Já nas relações de trabalho, diante da desigualdade contratual das partes que lhe caracteriza, sempre favorável ao empregador (devedor no caso de uma condenação judicial), inexiste a hipótese de que sejam fixados nos contratos de trabalho juros moratórios, juros compensatórios e multa por inadimplemento em favor do trabalhador (credor).

Assim, para que se efetive uma concreta equiparação dos dois créditos - até como resultado do efeito vinculante da decisão do STD - a aplicação da regra estampada no parágrafo único do artigo 404 é uma consequência da qual não se pode fugir.Do contrário, o que se teria não seria uma equiparação e sim um autêntico rebaixamento do crédito trabalhista em relação ao crédito cível, até porque, considerados vários outros dispositivos legais aplicáveis à situação tais como, por exemplo, a Lei n. 12.529/11, que estrutura o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência e a Lei n. 8.078/90, Código de Defesa do Consumidor), não se pode conceber que o infrator da lei obtenha na própria ordem jurídica um fundamento para constituir e preservar, sobre a concorrência, uma vantagem econômica, obtida com o ato ilícito praticado.

Neste sentido, bem ao contrário do sugerido na decisão do STF, que vê nos juros de mora tratados na Lei n. 8.177/91, uma forma "de enriquecimento sem causa" do reclamante/trabalhador, a ausência de um gravame econômico pelo ilícito praticado representa, isto sim, um "enriquecimento ilícito" do devedor/empregador, um incentivo para a prática ilícita, a desconsideração dos interesses vitais da vítima e uma forma de punição dos demais empregadores que cumprem regularmente a legislação do trabalho, subvertendo toda a lógica do aparato jurídico.

O inegável é que não há remuneração adicional fixada nos contratos de trabalho para as perdas e danos presumidamente experimentados no curso da relação de emprego decorrentes do desrespeito das regras legais. Nas relações cíveis, o credor (aquele que, por exemplo, vende ou aluga uma mercadoria ou empresta dinheiro) guarda, consigo, garantias legais e contratuais.

Expressam-se, neste sentido, além do direito à correção monetária também os juros de mora, decorrentes do mero atraso do cumprimento da obrigação assumida, e os juros compensatórios/remuneratórios, que servem como indenização pré- fixada por danos, os quais, inclusive, são presumidos e, portanto, não dependem de prova. E, segundo estabelece a Súmula 102 do STJ, não há anatocismo quando o contrato estipula que os juros moratórios incidam igualmente sobre os juros compensatórios. Além disso, aos juros moratórios e aos juros compensatórios ainda se pode acumular a multa contratual (APL 0002608-60.2016.8.08.0050 - TJ(ES). No caso específico dos empréstimos financeiros é possível ainda fixar juros remuneratórios independentemente de qualquer inadimplemento, sendo considerados como o próprio preço do negócio.

A única restrição à aplicação dos preceitos referentes aos juros gira em torno da avaliação do caráter abusivo dos percentuais, os quais, em geral, são contratualmente impostos por empresas (que são também os empregadores/reclamados) a consumidores (que são, potencialmente, os  trabalhadores/reclamantes). No exame da abusividade foram fixados os entendimentos jurisprudenciais de que: - os juros moratórios - incidentes desde a data do inadimplemento (art. 397 do CC) e não da propositura da ação judicial, como se consagrou na realidade jurídica trabalhista - devem se limitar a 12% ao ano; - os juros compensatórios, para as lojas varejistas, se limitam a 12% ao ano (STJ, RE nº 1720656 - MG - 2018/0017605-0); - os juros compensatórios, para as instituições financeiras, não encontram limite (Súmula 382 do STJ), sendo avaliados em função da "média de mercado", conforme parâmetros definidos pelo Banco Central (https://www.bcb.gov. br/estatisticas/txjuros); - a multa contratual, também possível, não se entende abusiva nos percentuais de 10 a 20%.

O crédito do trabalhador decorre de direitos trabalhistas não respeitados e esses direitos, em geral, visam a remunerar o trabalho que já foi prestado pelo(a) trabalhador(a), durante certo período (uma semana, um mês ou doze meses). Na ausência do pagamento do direito que decorre do trabalho prestado o que se tem, por consequência, é trabalho não remunerado. E como o trabalho prestado gera valor (de forma direta ou indireta - não sendo pertinente aqui adentrar a discussão em torno dos conceitos de trabalho produtivo ou improdutivo), em benefício daquele que se utiliza desse trabalho para a satisfação de seu interesse econômico (manifestado direta, ou indiretamente), o trabalho não remunerado se apresenta, efetivamente, como apropriação (por meio de ardil, artifício ou qualquer outro meio fraudulento) de algo que lhe pertence, a mercadoria força de trabalho, levando consigo também as necessidades e os sonhos daqueles(as) dos quais a força de trabalho se extrai.

Esse valor subtraído do patrimônio do (a) trabalhador(a), além disso, é utilizado pelo devedor para nova investida econômica. No caso de casas comerciais, para o acesso a todos os bens necessários à circulação das mercadorias. No caso dos Bancos, o dinheiro retido é oferecido no mercado a juros remuneratórios/compensatórios na média de 100% ao ano. Além de tudo isso, a SELIC estimada pelo Banco Central do Brasil como instrumento de política monetária está, atualmente, fixada em 2% ao ano, enquanto a inflação acumulada no ano de 2020 alcançou 4,23%.

Todos esses aspectos considerados fazem com que seja altamente necessário (e com grandioso atraso) atrair para os créditos trabalhistas, como, aliás, determina a decisão do STF na ADC 58, ao menos a incidência dos juros compensatórios e isto, considerando a desigualmente material dos contratantes trabalhistas, só se dará por meio da aplicação (de ofício) do parágrafo único do art. 404 do Código Civil, cuja previsão abarca exatamente situações como as que se apresentam nas relações de emprego, quando o credor é a parte economicamente fraca da relação jurídica firmada.

Consideradas as compreensões de que a ilegalidade cometida é trabalho não remunerado, de que a não remuneração do trabalho é uma forma de subtração de uma mercadoria e de que o valor que indevidamente se retém com tal prática serve à obtenção de uma vantagem econômica - que, como dito acima, se perfaz em prejuízo de empregadores concorrentes - uma fórmula mínima de se compensar o  dano do(a) trabalhador(a) e reduzir a vantagem do infrator é estabelecer um percentual mensal, no nível da "média de mercado", sobre a representação econômica dos direitos não cumpridos.

Respeitados todos esses preceitos e tomando como parâmetro também o princípio da isonomia, integro à presente condenação trabalhista, em favor do reclamante, a título de reparação de danos pelos atos ilícitos reconhecidamente praticados pela reclamada, a indenização suplementar mínima regulada pelo parágrafo único do art. 404 do Código Civil (ao menos em patamar similar ao dos juros compensatórios/remuneratórios jurisprudencialmente autorizados) equivalente ao percentual de 12% ao ano ou, mais precisamente, 0,948% ao mês, incidente sobre os valores mensalmente suprimidos, contando-se da data das respectivas lesões de direitos até a data em que o crédito for integralmente satisfeito.

 

Relatório

Inconformado com a r. sentença de fls. 354/365 que julgou improcedente a reclamação trabalhista em face da segunda reclamada e parcialmente procedente em face da primeira reclamada, recorre o reclamante, petição de fls. 378/386, pleiteando a reforma da sentença.0010100

A primeira reclamada apresentou contrarrazões às fls. 389/395 e a segunda reclamada às fls. 396/402.

É o relatório.

Fundamentação

V O T O

Presentes os pressupostos recursais intrínsecos, conheço.

  • - RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DA 2ª RECLAMADA

Insiste o reclamante em pleitear a condenação subsidiária da segunda reclamada pelo pagamento dos créditos deferidos na presente reclamação trabalhista, alegando ser incontroverso que laborou em seu favor e que, ainda que se possa considerá-la como dona da obra, "a OJ 191 trata única e exclusivamente da EMPREITADA de CONSTRUÇÃO CIVIL, o que não é o caso"(fl. 379) verificado na situação em apreço.

A sentença de origem julgou improcedente a reclamação trabalhista em face da segunda reclamada com o fundamento abaixo tanscrito (fl. 356):

"De fato, não importa se as obras contratadas envolvem serviços de alvenaria, ou se se trata de reformas, montagens ou manutenção industriais ou instalação elétrica, de equipamentos ou de sistemas de automação. 

O certo é que, em todos esses casos, o dono da obra não recebe serviços relativos a suas atividades regulares e, por isso, não pode ser responsabilizado ao argumento de que as terceirizou, ainda que legitimamente, na forma da Súmula 331 do TST.

Ainda: à compreensão deste Juízo, o caso não comporta a relativização da OJ n. 191 da SDI-1 do TST. O que só se justifica quando a contratação de obras desvirtua-se em prestação continuada de serviços, assim tornados regulares - o que não se evidenciou ter sido o caso.

E, conforme ressalva expressa na parte final da OJ antes citada, o reconhecimento da responsabilidade do beneficiário dos trabalhos apenas se justifica quando a consecução das obras integra os fins do tomador.

Situação também estranha aos presentes autos.

Então, prontamente improcedem todas as pretensões em face de VIRALCOOL."

Pois bem. Em que pese o entendimento adotado pelo juízo de origem, entendo que a sentença merece reforma.

Com efeito, como salientado em outro trecho contido na sentença, o reclamante relatou ao perito por ocasião da vistoria técnica "que no período postulado trabalhou na obra da 2ª Reclamada em Castilho/SP"(fl. 325).

Contudo, o reclamante igualmente relatou ao perito "que efetuava a manutenção, montava o equipamento (TUDING-INOX), fazia a ligação até o instrumento de medição (temperatura, pressão, vazão e nível), passava os cabos e a ligação, também puxava cabo para os eletricistas (desenergizado), basicamente efetuava a montagem, passagem dos cabos, sendo os serviços de ligação feitos pelo do eletricista" (fl. 325) e, ainda, "que realizou trabalhos no setor de evaporação, caldeira e tratamento de caldo" (fl. 325), no período de entressafra e no início da safra.

Constou também no laudo pericial a ordem de serviço apresentada pela primeira reclamada acerca das tarefas cumpridas pelo reclamante, as quais consistiam em fazer "os tubos das linhas de processo, instala os instrumentos e ligação coloca equipamentos e instrumentos conforme projetos e elabora documentação técnica, dobras de tubos, faz roscas encaixam as peças conforme projetos, passam os cabos e faz ligação dos cabo"(fl. 325).

Como se vê, o relato do reclamante ao perito sobre as tarefas cumpridas na vigência do vínculo empregatício evidencia que exercia, de fato, serviços de manutenção nas instalações físicas da segunda reclamada e não que trabalhou em serviços de reforma ou de construção da referida instalação, o que afasta o fundamento adotada pela r.sentença.

Além disso, repare-se que na defesa apresentada às fls. 239/271 a segunda reclamada sequer arguiu que contratou a primeira reclamada para construir ou reformar suas instalações físicas.

Aliás, nem mesmo a primeira reclamada alegou em sua defesa a tese adotada pela sentença, tendo se limitado a afirmar que "como a relação empregatícia ocorreu entre o reclamante e a 1ª Reclamada, qual seja a empresa FERTRON AUTOMAÇÃO E ELÉTRICA LTDA, assim a 1ª reclamada requer a EXCLUSÃO da 2ª reclamada, VIRALCOOL - AÇÚCAR E ÁLCOOL LTDA., por ser parte estranha à relação contratual"(fl. 81).

Vale ressaltar que nenhuma das reclamadas juntaram aos autos o contrato de prestação de serviços para demonstrar sob quais termos teria sido ajustada a prestações de serviços entre as partes, de modo que, também sob esse aspecto, não há como afastar a responsabilidade patrimonial da segunda reclamada com o fundamento de tratar-se de dona da obra.

Sob esse enfoque, não há dúvidas que os fatos apurados nos autos revelaram a existência de uma terceirização, pois o reclamante foi admitido como empregado da primeira reclamada para prestar serviços para a segunda reclamada.

Nesse contexto, quando existe pluralidade de credores ou de devedores, o que o que se configura é o instituto da solidariedade.

No caso de pluralidade de devedores, a solidariedade, denominada passiva, ocorrerá quando cada um dos devedores for responsável pelo pagamento de toda a dívida.

Nos termos do art. 265 do Código Civil, a solidariedade não se presume e resulta da lei ou da vontade das partes. No entanto, no que se refere à solidariedade passiva, que nos interessa mais de perto, tem ganhado força entre os doutrinadores a noção que admite a presunção da solidariedade, para satisfação mais eficiente da obrigação, como se dá em outros países[1], muito embora tal noção ainda não tenha sido incorporada pelo nosso ordenamento.

Quando há pluralidade de devedores e o credor pode exigir de todos a totalidade da dívida, se está diante da hipótese de solidariedade, instituto jurídico que traduz tal situação. Quando a sentença reconhece a responsabilidade do tomador dos serviços, a sua responsabilidade, perante a Justiça do Trabalho, é por toda a dívida declarada e não por parte dela[2]. Há, portanto, uma hipótese de solidariedade, indiscutivelmente, pois o credor (reclamante) pode exigir de ambos (prestador e tomador) a totalidade da dívida.

O que poderia haver, na relação entre tomador e prestador, como ocorre no caso da fiança, seria o exercício daquilo que se denomina, benefício de ordem (art. 827 do CC), pelo qual o fiador tem direito a requerer que primeiro executem-se os bens do devedor principal. Mas o benefício de ordem depende de iniciativa do fiador - parte no processo - e deve ser requerido nos moldes do parágrafo único do art. 827 do Código Civil:

"Parágrafo único. O fiador que alegar o benefício de ordem, a que se refere este artigo, deve nomear bens do devedor, sitos no mesmo município, livres e desembargados, quantos bastem para solver o débito."

Mesmo assim, essa hipótese não se configura no caso da terceirização, pois não há previsão legal expressa neste sentido e, uma vez declarada a solidariedade, o benefício de ordem se exclui, como regra. Como ensina Caio Mário: "é da essência da solidariedade que o devedor possa ser demandado pela totalidade da dívida (totum et totaliter) e sem benefício de ordem"[3].

Assim, por imperativo jurídico, a responsabilidade do tomador dos serviços seria, necessariamente, uma responsabilidade solidária, sem benefício de ordem. Solidariedade esta que não seria presumida, mas declarada judicialmente, com base no postulado jurídico da culpa "in eligendo".

Aliás, mesmo o elemento "culpa" pode ser abstraído, atraindo-se a noção de responsabilidade objetiva, nos moldes artigo 927 do Código Civil e seu parágrafo único, que passaram a considerar o ato que antes era ato meramente culposo (vide o artigo 186, do novo Código) como ato ilícito.

Lembre-se que é do empregador a assunção dos riscos da atividade econômica (art. 2º da CLT), o que se estende a todos que, em conjunto com o empregador, se beneficiam dos serviços do trabalhador dentro de uma lógica produtiva.

E, para aqueles mais renitentes, que se apegam a um formalismo jurídico, extraído do teor do art. 896, do Código Civil, formalismo este que em concreto não existe, vale lembrar o disposto no artigo 455, da CLT, que pode ser aplicado analogicamente ao presente caso.

Dispõe tal artigo:

"Nos contratos de subempreiteira responderá o subempreiteiro pelas obrigações derivadas do contrato de trabalho que celebrar, cabendo, todavia, aos empregados, o direito de reclamação contra o empreiteiro principal pelo inadimplemento daquelas obrigações por parte do primeiro.

Parágrafo único. Ao empreiteiro principal fica ressalvada, nos termos da lei civil, ação regressiva contra o subempreiteiro e a retenção de importâncias a este devidas, para a garantia das obrigações previstas neste artigo."

Vê-se, portanto, que a lei trabalhista fixou a solidariedade nas relações de terceirização, na medida em que conferiu ao trabalhador o direito de ação em face do tomador dos serviços - empreiteiro - e sem benefício de ordem, pois o que se garantiu a este foi a ação regressiva contra o prestador - subempreiteiro.

Nesse sentido, a seguinte Ementa:

"Destituída a intermediadora de mão-de-obra de idoneidade econômica e financeira, tem-se a empresa tomadora do serviço como responsável solidária pelos ônus do contrato de trabalho, pelo princípio da culpa in eligendo, o mesmo que informa e fundamenta a regra do art. 455, do estatuto obreiro." (TRT - 8ª R - Ac. nº 4947/95 - Rel. Juiz Itair Sá da Silva - DJPA 23.01.96 - pág. 05)

Aliás, a solidariedade entre tomador e prestador de serviços está expressamente prevista em outros dispositivos legais, a saber: art. 15, parágrafo 1º. da Lei n. 8.036/90 e art. 2º., I, do Decreto n. 99.684/90, sobre FGTS; e Ordem de Serviço n. 87/83, sobre contribuições previdenciárias.

Frise-se ainda que eventual cláusula do contrato firmado entre as empresas, que negue qualquer tipo de solidariedade, é nula de pleno direito, pois sua aplicabilidade pode impedir o adimplemento de obrigações trabalhistas (art. 9º., da CLT). Neste sentido, aliás, merece destaque o disposto no artigo 187, do novo Código Civil: "Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes". Ora, realizar negócios jurídicos cujo propósito é afastar-se de responsabilidade pelo adimplemento de direitos de terceiros, evidentemente, não pode ser considerado como ato lícito, nos termos da atual visão social do próprio direito civil.

Neste aspecto da responsabilidade civil por ato ilícito, merece relevo o artigo também o artigo 934 do novo Código Civil, que estabelece o direito de ressarcimento para aquele que indenizar o dano provocado por ato de outrem, conduzindo à ideia de que não há benefício de ordem possível no que tange à busca de indenização quando na prática do ato ilícito concorrerem mais de uma pessoa.

Esta conclusão, aliás, é inevitável quando se verifica o teor do artigo 942, que assim dispõe:

Os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de outrem ficam sujeitos à reparação do dano causado; e, se a ofensa tiver mais de um autor, todos responderão solidariamente pela reparação. Parágrafo único. São solidariamente responsáveis com os autores os co-autores e as pessoas designadas no art. 932. 

Essas regras, obviamente, possuem pertinência total no fenômeno da terceirização. Assim, uma empresa que contrata outra para lhe prestar serviços, pondo trabalhadores à sua disposição, ainda que o faça dentro de um pretenso direito, terá, no mínimo, responsabilidade solidária pelos danos causados aos trabalhadores pelo risco a que expôs os direitos destes, tratando-se, pois, de uma responsabilidade objetiva (parágrafo único do art. 927).

Além disso, ainda que não se quisesse vislumbrar a existência de lei fixando a solidariedade para a hipótese posta em discussão, fazendo alusão à regra fixada no Código Civil de que "a solidariedade não se presume, resultando de lei ou da vontade das partes" (art. 896 do CC), o fato é que a solidariedade em questão é fixada por declaração judicial a partir do reconhecimento de uma responsabilidade civil, decorrente da prática de ato ilícito, no seu conceito social atual. Neste sentido, a solidariedade declarada, com base em tais parâmetros, decorre da própria lei (art. 924 e seu parágrafo, do CC).

Lembre-se, ademais, que já na Declaração dos Objetivos da Organização Internacional do Trabalho, de 1944, foi firmado o princípio, até hoje não superado no contexto jurídico internacional, de que o trabalho humano não é mercadoria de comércio.

Tal sentido pode ser encontrado, também, na Declaração da OIT, relativa aos princípios fundamentais do trabalho, ao dispor que "a justiça social é essencial para assegurar uma paz universal e durável" e que "o crescimento econômico é essencial mas não é suficiente para assegurar a equidade, o progresso social e a erradicação da pobreza, e que isto confirma a necessidade para a OIT de promover políticas sociais sólidas, a justiça e instituições democráticas".

Esses preceitos, aliás, constituíram o fundamento para que a OIT, em 1949, adotasse a Convenção n. 96, estabelecendo que as agências de colocação de mão-de-obra, com finalidade lucrativa, deveriam ser suprimidas da realidade social dos países membros de forma progressiva e definitiva. Em suma, por todos os ângulos que se examine a questão não há nenhuma razão social, econômica ou jurídica, para se chegar ao resultado preconizado pela Súmula 331 do TST, que fixa apenas uma responsabilidade subsidiária daquela que denomina de mera "empresa tomadora dos serviços".

É interessante perceber que a Súmula 331 gera uma insegurança jurídica ao trabalhador, diminuindo as garantias que o ordenamento jurídico normalmente oferece ao credor de uma obrigação inadimplida.

O ordenamento jurídico pertinente ao direito das obrigações busca conferir efetividade ao crédito. Genericamente, o ente protegido é o credor ou o seu interesse, estabelecendo-se exceções apenas para impedir a constituição de obrigações desproporcionais e para evitar que se reduza o devedor a uma condição subumana.

Como se estabeleceu, no Direito do Trabalho, pela Súmula n. 331, do TST, uma espécie de responsabilidade secundária do "tomador" dos serviços, sem que este para exercê-la sequer precise indicar bens livres e desembaraçados do devedor principal suficientes para a satisfação do crédito, acabou-se criando no Direito do Trabalho um ilógico sistema de proteção do devedor, que, vale lembrar, é um devedor de crédito trabalhista e que possui uma condição econômica pressupostamente superior a do credor e mesmo daquele a quem a Súmula conferiu a responsabilidade primária, o tal "prestador" de serviços.

Por todo o exposto, dou provimento ao apelo para declarar a responsabilidade subsidiária da segunda reclamada pelo pagamento dos créditos deferidos ao reclamante.

II       - INSALUBRIDADE - RADIAÇÃO NÃO IONIZANTE -

HONORÁRIOS PERICIAIS

Insiste o reclamante que permaneceu exposto à radiação não ionizante no exercício de suas funções e "sem o recebimento de qualquer EPI" (fl. 380), de forma que a conclusão pericial de "que tal exposição não seria habitual, apesar de ser uma atividade diária" (fl. 380) deve ser afastada, uma vez que "a apuração de exposição por RADIAÇÃO NÃO IONIZANTE se dá de forma QUALITATIVA e não QUANTITATIVA" (fl. 380).

Aduz que, considerando que lhe foram concedidos os benefícios da justiça gratuita, a determinação contida na sentença para pagamento dos honorários periciais "fere a RESOLUÇÃO Nº 66, DE 10 DE JUNHO DE 2010 do CSJT, a qual prevê que a União é responsável pelo pagamento de honorários periciais, acaso preenchidos os requisitos da justiça gratuita"(fl. 382), motivo pelo qual requer a reforma do julgado também sob esse aspecto.

Já o laudo pericial concluiu que o reclamante não esteve exposto a condições insalubres porque, ainda que nos "serviços de soldar poderia estar exposto aos fumos metálicos, porém, estas atividades eram eventuais. Salientando que neste tipo de soldagem não existem fumos metálicos de chumbo e cádmio, produtos elencados no Anexo 13 da NR.15"(fl. 326).

Pois bem. Com efeito, ante os esclarecimentos técnicos contidos no laudo, não merece acolhida a tese sustentada pelo reclamante de que fazia serviços de solda habitualmente.

Isso porque o reclamante não produziu nenhum elemento probatório apto a invalidar a constatação pericial apresentada nos esclarecimentos juntados às fls. 338/340 de que "o Reclamante não laborava como soldador, algumas vezes utilizava o equipamento de solda para efetuar pequenos serviços (pontear), desta forma, não estava de modo habitual e intermitente exposto à radiação não ionizante. Os epis necessários para a atividade de soldador são: luvas de raspa, avental de raspa, óculos de Celeron, toca de soldador, protetor auricular, e calçado de segurança"(fl. 339).

Logo, nada a reformar na r. sentença que indeferiu o pagamento da verba

em comento.

Sobre a condenação em relação aos honorários periciais, assiste razão ao reclamante em pleitear a isenção do pagamento da rubrica ante a concessão dos benefícios da justiça gratuita.

Assim, dou provimento ao apelo para isentar o reclamante ao pagamento dos honorários periciais, devendo o juízo de primeiro grau expedir a requisição a este Tribunal para pagamento dos honorários periciais, observados os valores vigentes à época da requisição, nos termos do convênio previsto no Provimento GP/CR 03/2012.

  • - HORAS IN ITINERE

Pretende o reclamante a reforma do julgado que indeferiu o pagamento de horas in itinere, alegando ser incontroverso que a segunda reclamada está situada em zona rural, não se podendo falar em local de fácil acesso nesse contexto, e que "em nenhum momento as reclamadas comprovaram que havia transporte público no trajeto, aliado ao fato de fornecimento de transporte particular para os funcionários" (fl. 381), motivo pelo qual pleiteia o pagamento de 1h diária a título de horas in itinere.

Com razão o reclamante.

De fato, as reclamadas não apresentaram qualquer prova documental para comprovar que o local de trabalho era servido por transporte público e de fácil acesso, de modo que a mera argumentação apresentada pela primeira reclamada de que "o trajeto era asfaltado, de fácil acesso, de rápido percurso e servido por transporte público regular"(fl. 392), como dito em suas contrarrazões,  é insuficiente para o fim colimado por ela.

Com relação ao argumento contido na defesa juntada pela primeira reclamada de que a Lei 13.467/17 alterou o artigo 58, § 2º, da CLT para desobrigar o empregador ao pagamento de eventuais horas de percurso, necessário se faz consignar a sua inaplicabilidade com relação aos pedidos objetos da presente reclamação, haja vista que a referida lei foi promulgada após o período do vínculo empregatício em análise.

O reclamante trabalhou na reclamada de 09/01/2017 a 28/06/2017, conforme TRCT de fls. 132/133.

Ainda que assim não fosse, deve-se atentar para o fato de que a Constituição Federal de 1988 trouxe a tendência de limitação e redução da jornada de trabalho (art. 7º, XIII e XIV, por exemplo), de forma que o trabalhador possa, no seu tempo livre, usufruir dos demais direitos sociais constitucionalmente previstos.

A Lei 13.467/17, por sua vez, vai de encontro ao avanço social até então conquistado, quando institui que a jornada de trabalho somente terá início com a "efetiva ocupação do posto de trabalho" (artigo 58, § 2º).

Desse modo, a integração do tempo de deslocamento na jornada é de suma importância, eis que constitui pressuposto para a fruição do extenso rol de direitos fundamentais a que faz jus todo trabalhador.

A propósito, segue trecho do texto "Da incompatibilidade da nova redação do artigo 58, § 2º, da CLT com o conceito de jornada de trabalho", dos autores Gabriela Lenz de Lacerda e Jonatas dos Santos Andrade, extraído do livro Resistência - aportes teóricos contra o retrocesso trabalhista" (Coordenado por mim e por Valdete Souto Severo. 1ª ed. São Paulo: Ed. Expressão Popular, 2017, p.290 e 293):

"A nova redação do artigo 58, § 2º, desconsidera que não são todos os trabalhadores brasileiros que prestam serviços em centros urbanos dentro de horário comercial. Ignora toda uma massa de empregados que, não raro, chegam a perder mais de um terço de suas jornadas no deslocamento. O empreendedor que desenvolve suas atividades em área de difícil acesso, remotas, retira do trabalhador substancial parcela do seu tempo livre, destinado à fruição pessoal, ao repouso, em virtude do longo deslocamento ao trabalho.

O princípio da proteção não pode interferir na decisão do empreendedor de se aventurar em áreas de difícil acesso, com os lucros que daí advém. Entretanto, este não pode se esquivar de assumir os riscos da empreitada. Este é o conceito básico sem o qual não pode se qualificar o empregador. O ressarcimento pecuniário, a onerosidade se impõem também como instrumento de inibição e de preservação da saúde do trabalhador, violada pela prorrogação da jornada provocada pelo longo deslocamento.

Nesses casos, é importante ressaltar que a concessão do transporte não é feita para o maior conforto e bem estar do trabalhador, muito menos como benefício. É a inexistência, a insuficiência, a irregularidade, a incompatibilidade ou a ilegalidade do transporte que levam as empresas a fornecer o transporte para seus trabalhadores, viabilizando economicamente o projeto. 

(...)

Não há como assegurar a fruição do direito ao não trabalho, como expressão da própria dignidade da pessoa humana, sem computar esse tempo na jornada. A modernização da legislação trabalhista, portanto, inegavelmente deve restringir o período de prestação de serviço de forma a considerar as peculiaridades da vida moderna, aumentando o tempo livre e permitindo a real eficácia dos direitos fundamentais previstos na Constituição Federal.

E, sendo justamente esta a finalidade da Reforma Trabalhista, como amplamente anunciado pelos seus defensores, não há como se admitir interpretação outra que não a integração do tempo de deslocamento, especialmente aquele ocorrido dentro do transporte fornecido pelo empregador, à jornada e trabalho, nos exatos moldes em que previsto no inciso XIII do artigo 7º da Constituição Federal de 1988. Não podem ser chanceladas interpretações normativas tendentes a rebaixar os patamares civilizatórios já atingidos pelo cidadão. Manifesta, pois, a inconstitucionalidade do artigo 58, § 2º, da CLT."

Assim sendo, por qualquer ângulo que se analise a questão, não há como se aplicar a Lei 13.467/17, como pretendido pela recorrente.

Não bastasse isso, com maior rigor interpretativo, limitado pelo estrito sentido literal da norma, pode-se dizer que o § 2o do art. 58 da CLT não tratou, propriamente de horas "in itinere". Talvez o legislador da "reforma" (atabalhoado, apressado e pouco técnico) tenha tentado fazer isso, mas lhe faltou tempo e inteligência jurídica para tanto. O efeito é que o texto legal apenas diz que "O tempo despendido pelo empregado desde a sua residência até a efetiva ocupação do posto de trabalho e para o seu retorno, caminhando ou por qualquer meio de transporte, inclusive o fornecido pelo empregador, não será computado na jornada de trabalho, por não ser tempo à disposição do empregador", nada falando, pois, sobre a hipótese fática tratada na Súmula 90 do TST, que dá fundamento ao direito à hora "in itinere", que é a situação do local de trabalho ser difícil acesso e não servido por transporte público.

Ou seja, o legislador apenas disse algo que é completamente assente tanto na doutrina quanto na jurisprudência trabalhista, qual seja, que o tempo de transporte até o local de trabalho não se integra à jornada de trabalho. O que a Súmula diz - e o texto legal não contesta - é que quando o local de trabalho for de difícil acesso e não servido por transporte público o tempo  de transporte fornecido pelo empregador, que será essencial à realização do serviço, deve ser computado na jornada de trabalho.

Então, concretamente, não houve qualquer alteração jurídica a respeito desse assunto, a não ser que os defensores da "reforma" admitam que se promovam interpretações extensivas e aleatórias do texto legal. O problema é que sequer teriam o apelo a preceitos hermenêuticos e principiológicos para chegarem à conclusão de que o texto legal cuidou de horas "in itinere", na forma em que sempre foi juridicamente tratada.

Nesse contexto, assiste razão ao reclamante quanto ao direito de receber as horas despendidas no trajeto casa/local de trabalho/casa.

Sobre o pleito para pagamento de uma hora diária, constou na defesa da primeira reclamada de que "o tempo de viagem até a segunda reclamada saindo do alojamento era de aproximada 30 minutos para o percurso cada trajeto"(fl. 90), o que torna incontroverso o tempo apontado pelo reclamante como despendido no trajeto casa/local de trabalho/casa.

Assim sendo, dou provimento ao apelo para deferir o pagamento de 1h diária a título de horas in itinere, com acréscimo de 50% (cinquenta por cento) e reflexos em aviso prévio, décimo terceiro salário, férias, FGTS e multa de 40% (quarenta por cento)

.- HORAS EXTRAS / INTERVALOS / SÚMULA 338 DO TST

 Impugna o reclamante os cartões de ponto juntados aos autos com a alegação de que os horários ali anotados "são britânicos na entrada e saída, bem como no intervalo intrajornada" (fl. 382), o que enseja a consideração dos "horários informados em sede inicial, inclusive os horários de intervalo intrajornada"

(fl. 382), visto que

"a reclamada não comprovou qualquer autorização de pré assinalação do horário de refeição" (fl. 382).

Assiste parcial razão ao reclamante.

Isso porque, com efeito, os cartões de ponto juntados aos autos referente ao período da data de admissão, 09/01/2017 a 30/04/2017 (fls. 116/119) apresentam registro de horário britânico, situação essa não verificada com relação aos meses de maio e junho de 2017, os quais apresentam horários variáveis, inclusive no tocante ao intervalo de uma hora para refeição e descanso.

Nesse sentido, cabia à reclamada comprovar que o horário apontado nos referidos cartões de ponto com relação ao período acima citado retratavam com fidelidade a jornada de trabalho cumprida pelo reclamante, ônus do qual não se desincumbiu, haja vista a ausência da produção de prova oral na audiência de instrução.

Assim, nos termos do disposto na Súmula 338, do TST presume-se válida a narrativa contida na petição inicial sobre a inveracidade dos horários registrados nos cartões de ponto.

Quanto à carga horária noticiada na petição inicial, considerando que o reclamante alegou que utilizava o transporte fornecido pela reclamada, a informação de que encerrava a jornada de trabalho às 21h/22h não se coaduna com a situação acima retratada.

Nesses termos, fixo a jornada de trabalho como sendo das 07h às 18h, de segunda a sexta-feira, além do labor em dois sábados e dois domingos por mês no período de 09/01/2017 a 30/04/2017.

Ainda sobre a questão da prestação de horas extras, no que tange ao intervalo intrajornada, a petição inicial não relata a supressão do referido intervalo, de modo que, considerando, ainda, a ausência da produção de prova oral durante a instrução probatória, como acima já dito, resta prejudicada a análise sobre a supressão do intervalo de uma hora para refeição e descanso, como arguido pelo reclamante em seu recurso.

Por todo o exposto, dou parcial provimento ao apelo para deferir o pagamento das horas extras laboradas acima da 8ª diária e 44ª semanal, com adicional de 50% (cinquenta por cento) e 100% (cem por cento) pelo labor aos domingos, com reflexos salariais em DSR, aviso prévio, décimo terceiro salário, férias acrescidas de 1/3, FGTS e multa de 40% (quarenta por cento).

V  - Juros e Correção Monetária

Pretende o reclamante a aplicação do índice de correção monetária do IPCA-E por todo o vínculo de emprego.

Pois bem.

1.  Histórico da decisão do STF nas ADCs 58 e 59

Apreciando o mérito das ADCs 58 e 59, o STF, em dezembro de 2020, definiu a nova forma de atualização dos créditos trabalhistas, partindo do pressuposto, não jurídico, de que seria necessário reduzir o impacto desses créditos na saúde econômica dos devedores (empregadores).

Não foi uma tarefa simples de ser cumprida, afinal, o STF já havia decidido que a TR não poderia ser fator de correção monetária, vez que insuficiente para acompanhar o processo inflacionário, e o que estava em julgamento nas referidas ADCs era a declaração da constitucionalidade ou inconstitucionalidade do dispositivo da Lei n. 13.467/17 que, alterando o § 7º do artigo 879 da CLT, estabeleceu que a TR seria o índice da correção monetária trabalhista.

Não havia, pois, como se pudesse declarar constitucional o dispositivo em questão, embora a posição pessoal do relator, Min. Gilmar Mendes, fosse neste sentido. Mas, declarando a inconstitucionalidade surgia o problema de deixar em aberto o índice a ser aplicável, sabendo-se que o TST já havia se posicionado no sentido da aplicação do IPCA-E.

Ocorre que a aplicação do IPCA-E não estaria em conformidade com o movimento de redução do custo trabalhista para os empregadores, já que, conforme destacado pelo relator, desde as duas liminares proferidas no mesmo processo, o IPCA-E gera um efeito econômico 25% superior ao da TR - e até por isso é que a TR foi fixada como índice de correção pelo texto da "reforma" trabalhista, cujo objetivo, como se sabe, foi satisfazer os desejos do poder econômico.

Cumpre observar, de todo modo, que esse dado percentual não representa um benefício injustificado ao credor, como tentou justificar o relator, pois a comparação entre os dois índices só tem sentido frente à variação da inflação em um determinado período. E o que o maior percentual de correção do IPCA-E significa é unicamente uma maior aproximação do índice inflacionário e não um enriquecimento sem causa.

Para eliminar esse "risco" e apoiando-se no argumento fugidio da realidade de que a aplicação do IPCA-E representaria um benefício injustificável aos trabalhadores ou que oneraria excessivamente os empregadores, o voto condutor não se ateve ao limite objetivo da ação e passou a "preencher a lacuna" deixada pela declaração de inconstitucionalidade do atual §7º do artigo 879 da CLT, embora, concretamente, não houvesse lacuna a ser preenchida no âmbito da ação em questão, um vez que o texto declarado inconstitucional só veio a existir em novembro de 2017, com a entrada em vigor da Lei n. 13.467/17, e antes disso nunca se cogitou de um problema jurídico nesta seara.

Lembre-se que a aplicação do IPCA-E na Justiça do Trabalho já tinha sido consolidada, em agosto de 2015, no julgamento da ArgInc-479-60.2011.5.04.0231, como efeito da posição firmada pelo próprio STF, em 25 de março de 2015, na apreciação das ADIs 4357 e 4425.

Segundo o relator, no julgamento das ADCs 58 e 59, embora o STF já tivesse fixado a aplicação do IPCA-E isso teria se dado apenas com relação aos créditos fazendários e, por consequência, a posição do TST teria sido lastreada em uma "indevida equiparação da natureza do crédito trabalhista com o crédito assumido em face da Fazenda Pública".

Fez-se, assim, vistas grossas do artigo 889 da CLT que deixa claro que à execução dos títulos trabalhistas são aplicáveis "os preceitos que regem o processo dos executivos fiscais para a cobrança judicial da dívida ativa da Fazenda Pública Federal".

O critério utilizado para se chegar a um índice de correção que não fosse o IPCA-E foi juridicamente ainda mais equivocado: a equiparação do crédito trabalhista a um crédito cível. Conforme expresso no voto do relator, "a proposta que trago à colação é a de que, uma vez afastada a validade da TR, seja utilizado, na Justiça Trabalhista, o mesmo critério de juros e correção monetária utilizado nas condenações cíveis em geral".

Neste ponto, a decisão proferida pelo STF superou décadas de uma tradição jurídica fincada no reconhecimento de que o crédito trabalhista é privilegiado, sobrepondo-se, inclusive, ao crédito tributário, conforme, aliás, prevê, expressamente, o art. 83 da Lei n. 11.101/05 (Lei de Recuperação Judicial) - também solenemente ignorado.

Aliás, o STF ignorou o seu próprio precedente, fixado na ADI 3934, no qual, declarando-se expressamente a constitucionalidade do art. 83 da Lei n. 11.101/05, foi reconhecido expressamente que o crédito trabalhista é privilegiado com relação a todos os outros, embora, naquela oportunidade, se tenha estabelecido um limite (de 150 salários-mínimos) por credor para este privilégio - o que foi mantido, inclusive, na recém-aprovada Lei n. 14.112, de 24 de dezembro de 2020.

Na ADI 3934, o STF aplicou a Convenção 173 da OIT que consagra, internacionalmente, a posição privilegiada do crédito trabalhista. Na ocasião a invocação da referida Convenção se deu para justificar a limitação ao privilégio imposta pelo art. 83 da Lei n. 11.101/06, nos seguintes termos:

"É importante destacar, ademais, que a própria legislação internacional de proteção ao trabalhador contempla a possibilidade do estabelecimento de limites legais aos créditos de natureza trabalhista, desde que preservado o mínimo essencial à sobrevivência do empregado.

Esse entendimento encontra expressão no art. 7.1 da Convenção 173 da Organização Internacional do Trabalho - OIT (Convenção sobre a Proteção dos Créditos Trabalhistas em Caso de Insolvência do Empregador), segundo o qual a 'legislação nacional poderá limitar o alcance do privilégio dos créditos trabalhistas a um montante estabelecido, que não deverá ser inferior a um mínimo socialmente aceitável'."

E para chegar a esse resultado o Supremo integrou ao ordenamento nacional, de forma explícita, as normativas da OIT, notadamente no que se refere à proteção dos créditos trabalhistas, independente até mesmo do processo de ratificação.

Como estabelecido na decisão em questão:

"Embora essa Convenção não tenha sido ainda ratificada pelo Brasil, é possível afirmar que os limites adotados para a garantia dos créditos trabalhistas, no caso de falência ou recuperação judicial de empresas, encontram respaldo nas normas adotadas no âmbito da OIT, entidade integrante da Organização das Nações Unidas, que tem por escopo fazer com que os países que a integram adotem padrões mínimos de proteção aos trabalhadores.

Nesse aspecto, as disposições da Lei 11.101/2005 abrigam uma preocupação de caráter distributivo, estabelecendo um critério o mais possível equitativo no que concerne ao concurso de credores. Em outras palavras, ao fixar um limite máximo - bastante razoável, diga-se - para que os créditos trabalhistas tenham um tratamento preferencial, a Lei 11.101/2005 busca assegurar que essa proteção alcance o maior número de trabalhadores, ou seja, justamente aqueles que auferem os menores salários."

Foge de todos os parâmetros jurídicos, portanto, a "escolha", completamente aleatória e fruto de uma vontade pessoal do julgador, de equiparação do crédito trabalhista ao crédito cível, valendo lembrar que a relação de emprego é regulada pelo Direito do Trabalho e não pelo Direito Civil exatamente por ter sido historicamente reconhecida a diversidade das relações jurídicas civis e trabalhistas: a primeira, marcada pela igualdade, e a segunda, pela desigualdade e a dependência econômica.

A equiparação proposta pelo STF é contrária à realidade dos fatos e uma afronta a todos os preceitos jurídicos concebidos a respeito das relações de emprego como fator, inclusive, de desenvolvimento da sociedade capitalista, o que foi, inclusive, reconhecido, expressamente, na Constituição Federal em diversos dispositivos: "art. 1º, incisos III e IV; art. 4º, inciso II; art. 5º, inciso XXIII; art. 7º; art. 170 e incisos III e VIII; e art. 186, inciso III.

O pior é que o argumento de equiparação dos créditos trabalhistas aos créditos de natureza civil não foi utilizado apenas para afastar a aplicação do IPCA-E.

Extrapolando todos os limites da ação, o voto seguiu adiante e aproveitou o ensejo, mesmo sem qualquer provocação dos sujeitos constitucionalmente legitimados neste sentido, para propor a rejeição, sem declaração formal de inconstitucionalidade, da aplicação do § 1º do art. 39 da Lei n. 8.177/91, que fixa juros de mora nas relações trabalhistas na ordem de 1% ao mês, desde o ajuizamento da reclamação trabalhista.

Com isso o STF simplesmente desconsiderou e deixou de lado a Lei n. 8.177, que regula a atualização dos créditos trabalhistas desde 1991, para colocar em seu lugar o artigo 406 do Código Civil, gerando como efeito a aplicação da taxa SELIC.

Em suma, apreciando a constitucionalidade do §7º do artigo 897 da CLT, com redação dada pela Lei n. 13.467/17, o STF, atuando como legislador, criou uma nova forma de atualização dos créditos trabalhistas pela qual afastou a aplicação da TR, substituindo-a pelo índice do IPCA-E, afastou, também, os juros de mora fixados na Lei n. 8.177/91, limitou a aplicação do IPCA-E até a data da citação (notificação do reclamado) e determinou a aplicação, desta data em diante, da taxa SELIC, conforme previsto no art. 406 do Código Civil, fixando o pressuposto da equiparação dos créditos trabalhistas aos créditos civis. Cabe consignar que a taxa da SELIC foi de 4,5% ao ano, em 2019, e a projeção é que fique em 2%, em 2020.

2.  Modulação

Ainda seguindo os termos da referida decisão, restou definido que:

  • são reputados válidos e não ensejarão qualquer rediscussão (na ação em curso ou em nova demanda, incluindo ação rescisória) todos os pagamentos realizados utilizando a TR (IPCA-E ou qualquer outro índice), no tempo e modo oportunos (de forma extrajudicial ou judicial, inclusive depósitos judiciais) e os juros de mora de 1% ao mês;
  • serão mantidas e executadas as sentenças transitadas em julgado que expressamente adotaram, na sua fundamentação ou no dispositivo, a TR (ou o IPCA-E) e os juros de mora de 1% ao mês;
  • serão atingidos, igualmente, mesmo os feitos já transitados em julgado desde que sem qualquer manifestação expressa quanto aos índices de correção monetária e taxa de juros (omissão expressa ou simples consideração de seguir os critérios legais);

3.  O conteúdo da decisão do STF (aplicado no presente caso)

Considerados todos os fundamentos supra, por imperativo da decisão do STF, expresso também na referida Resolução 672/20, o critério básico de atualização dos créditos trabalhistas deferidos nestes autos é o seguinte:

  • incidência do IPCA-E na fase pré-judicial;
  • a partir da citação, a incidência da taxa SELIC (art. 406 do Código Civil), abrangendo correção monetária e juros moratórios;
  • são reputados válidos e não ensejarão qualquer rediscussão (na ação em curso ou em nova demanda, incluindo ação rescisória) todos os pagamentos realizados utilizando a TR (IPCA-E ou qualquer outro índice), no tempo e modo oportunos (de forma extrajudicial ou judicial, inclusive depósitos judiciais) e os juros de mora de 1% ao mês;
  • devem ser mantidas e executadas as sentenças transitadas em julgado que expressamente adotaram, na sua fundamentação ou no dispositivo, a TR (ou o IPCA-E) e os juros de mora de 1% ao mês;
  • os processos em curso que estejam sobrestados na fase de conhecimento (independentemente de estarem com ou sem sentença, inclusive na fase recursal) devem ter aplicação, de forma retroativa, da taxa SELIC (juros e correção monetária), sob pena de futura alegação de colisão com o posicionamento do STF (art. 525, §§ 12 e 14, ou art. 535, §§ 5º e 7º, do CPC).

4.  Limitação temporal

A aplicação de todos esses parâmetros, no entanto, só tem vigor a partir da vigência da Lei n. 13.467/17 (11/11/17), vez que as ações em questão se destinavam, precisamente, a questionar a constitucionalidade do § 7º do artigo 897 da CLT, introduzido pela lei em questão.

Para o período anterior, revendo posicionamento a respeito, prevalecem os fundamentos expressos, em 05/12/17, pela 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal, na Reclamação RCL 22.012, utilizados para julgar improcedente a ação ajuizada pela FENABAN sobre a atualização de débitos trabalhistas.

Na oportunidade se estabeleceu o entendimento de que a decisão do E. TST, proferida em sessão plenária, realizada no dia 5 de agosto de 2015, examinando arguição de inconstitucionalidade suscitada pela 7ª Turma do TST (processo AIRR 479-60.2011.5.04.0231), que pronunciou a inconstitucionalidade por arrastamento do artigo 39 da Lei 8.177/91 e, adotando a mesma racionalidade fixada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento das ADIs 4.357, 4.372, 4.400 e 4.425, e fixou o entendimento de que os créditos trabalhistas fossem corrigidos pelo IPCA-E, não configurou desrespeito ao julgamento do STF nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI) 4357 e 4425, que analisaram a Emenda Constitucional sobre precatórios.

Sobre a data a partir da qual o IPCA-E teria incidência, inicialmente, o TST, no julgamento em questão, compreendeu que a aplicação do IPCA-E se daria a partir de 30 de junho de 2009 (data em que entrou em vigor o dispositivo declarado inconstitucional pelo STF nas ADIs referidas - artigo 1º-F da Lei 9.494/1997, introduzido pela Lei 11.960/2009).

Depois, em 20/03/17, analisando e atribuindo efeitos modificativos aos Embargos Declaratórios interpostos nos mesmos autos, o TST estabeleceu que o marco da aplicação do IPCA-E seria o dia 25 de março de 2015 (data em a modulação acerca da inconstitucionalidade da aplicação do índice da poupança para as dívidas de precatórios, apresentada como uma questão de ordem na ADI 4357, foi julgada).

Ocorre que, em nova decisão proferida pelo plenário do STF, em 30/03/19, nos autos do RE 870.947, afastou-se a modulação dos efeitos na aplicação do IPCA fixada pelo TST (a partir de 20/03/15).

Por consequência, o plenário do Supremo Tribunal Federal, em sessão realizada no dia 3 de outubro de 2019, concluiu que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E) para a atualização de débitos judiciais das Fazendas Públicas (precatórios) se aplica de junho de 2009 em diante.

Sendo assim, o índice de correção monetária trabalhista, inclusive para devedores entes públicos, será o IPCA-E, a partir de 30/06/2009, acompanhado dos juros fixados na Lei n. 8.177/91.

5.  Reparação de danos e indenização suplementar

Durante décadas se recusou apontar a prática de desrespeito a direitos trabalhistas como ato ilícito, tratando-a pelo eufemismo de inadimplemento contratual. A correção da situação tida por "mera irregularidade" não era carregada de efeito punitivo, não se pondo, pois, como um resgate da autoridade da ordem jurídica e sim como uma falaciosa e enganosa "pacificação do conflito". As farras de alguns empregadores que até o momento habitavam o cotidiano das relações de trabalho e das Varas do Trabalho e às quais se atribuía o status de um "nada jurídico", tais como: contratação sem registro; pagamento de salário "por fora"; ausência de cartões de ponto que reflitam a efetiva jornada trabalhada; falta de pagamento de verbas rescisórias; não recolhimento de FGTS etc.,adentram no campo do ilícito. Esse pressuposto teórico reforça o caráter punitivo que se deve atribuir a tais práticas, não sendo, pois, suficientes as condenações para o pagamento apenas do valor correspondente ao que seria devido se o ilícito não tivesse sido cometido.

Era como se o empregador tivesse "o direito" de descumprir as leis.

Toda carga punitiva dos "inadimplementos" trabalhistas - como se costuma dizer - era depositada nos juros de mora de 1% ao mês a partir da propositura da reclamação trabalhista, acompanhados da correção monetária.

A noção de perdas e danos pela submissão a uma situação ilegal era solenemente afastada na maior parte dos julgamentos, sob o fundamento de que a reparação já estava dada pelos institutos em questão, esquecendo-se que o ato ilícito requer, por si, efeito específico, já que quem comete um ilícito em uma relação contratual impõe ao outro uma situação de vida inesperada, repleta de consequências nefastas e, consequentemente, danos materiais e morais. Por exemplo, um empregador que não anota a carteira de trabalho de seu empregado deixa este trabalhador em uma situação de total insegurança e afastado das condições ideais de trabalho fixadas exatamente nos aparatos da legislação trabalhista. Há perdas e danos evidentemente pressupostos - que não requerem sequer prova - nesta situação, como se verifica, igualmente, na perda do emprego sem o recebimento das verbas rescisórias (de incontestável natureza salarial).

Pois bem, diante da retirada de toda a carga punitiva do descumprimento da lei trabalhista que se atribuía aos juros e à correção monetária, conforme estabelecido pela decisão do STF acima referida, abriu-se, necessariamente, a porta para a visualização da reparação das perdas e danos experimentados pela vítima do ato ilícito trabalhista, que é do que efetivamente se cuida quando se declara que um direito legalmente enunciado não foi respeitado.

Importante também lembrar que o intenso debate público que se desenvolveu no Brasil em torno da legislação trabalhista teve como ponto de partida o movimento do clamor pela moralização das instituições e pela ética nas relações sociais, fazendo com que, ao menos, se tivesse que reconhecer que o desrespeito aos direitos trabalhistas constitui um ato ilícito, que deve ser punido para a devida preservação da autoridade da ordem jurídica, não se podendo compreender como válidos negócios jurídicos que simplesmente pela forma tentam aniquilar direitos.

O fato é que, também de forma vinculante, adecisão do STF, de forma vinculante, equiparou o crédito trabalhista ao crédito civil e é a partir dessa equiparação que se deverá, enfim, conceber o desrespeito ao direito trabalhista como um ato ilícito, o que impõe a superação da restrição indevidamente imposta de onerar o desrespeito à lei, que se integra aos contratos de trabalho na forma de conteúdo obrigacional, apenas com os efeitos da incidência de juros mortuários judiciais (desde a propositura da reclamação) e correção monetária, atraindo, por consequência, a possibilidade de se imputar ao empregador que agiu ilicitamente a obrigação de reparação das perdas e danos experimentados pela vítima, sendo que a indenização resultante poderá, inclusive, ser fixada de ofício pelo juiz, conforme prevê expressamente o art. 404 do Código Civil, seguindo as diretrizes traçadas para o regramento da responsabilidade civil, nos moldes dos artigos 186, 187, 927 e 944 do Código Civil.

O dano, no caso, está pressuposto (não requerendo, pois, uma prova) pelo próprio fato de que os juros praticados (ainda mais quando aplicáveis apenas a partir da propositura da reclamação, momento em que, segundo o novo padrão fixado, deixa de se aplicar a correção monetária, pois, em concreto, a SELIC é uma taxa de juros) são incapazes de cobrir o prejuízo do trabalhador que somente depois de anos vai reaver o que é seu por direito, sendo esta exatamente a hipótese tratada no parágrafo único do art. 404 do Código Civil (que, ademais, se aplica mesmo quando os juros de mora tenham sido fixados, fazendo com que a sua incidência não esteja impedida pela aplicação do art. 406).

A aplicação do parágrafo único do art. 404 do Código Civil, ademais, é o que garante que efetivamente se caminhe, como determinado pelo STF, em direção a uma equiparação do crédito trabalhista ao crédito civil, até porque o art. 406 do Código Civil, adotado pelo STF para a supressão dos juros de mora fixados na Lei n. 8.177/91, diz, expressamente, que a SELIC, abrangendo os juros, só teria incidência quando o contrato não estipula a questão de modo diverso.

Ocorre que nos contratos cíveis o credor tem totais condições de "impor" cláusulas moratórias, gerando como efeito que previsão do art. 406 do Código Civil raramente tem aplicabilidade, instaurando-se debates jurídicos, isto sim, tão somente com relação aos denominados "juros abusivos". Já nas relações de trabalho, diante da desigualdade contratual das partes que lhe caracteriza, sempre favorável ao empregador (devedor no caso de uma condenação judicial), inexiste a hipótese de que sejam fixados nos contratos de trabalho juros moratórios, juros compensatórios e multa por inadimplemento em favor do trabalhador (credor). Assim, para que se efetive uma concreta equiparação dos dois créditos - até como resultado do efeito vinculante da decisão do STD - a aplicação da regra estampada no parágrafo único do artigo 404 é uma consequência da qual não se pode fugir.

Do contrário, o que se teria não seria uma equiparação e sim um autêntico rebaixamento do crédito trabalhista em relação ao crédito cível.

E essa equiparação também possibilita - e, na verdade, até exige - que se vislumbre a aplicação de vários outros dispositivos punitivos das práticas ilícitas, com atração, sobretudo, das noções de reincidência e até mesmo de delinquência, como forma de proteger o sistema econômico.

Com efeito, dos termos da Lei n. 12.529/11, que estrutura o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência e dispõe sobre a prevenção e repressão às infrações contra a ordem econômica, resta clara a noção de que o desrespeito aos direitos trabalhistas representa, inclusive, uma infração à ordem econômica. Conforme previsto na referida lei, constituem infração da ordem econômica, independentemente de culpa, os atos sob qualquer forma manifestados, que tenham por objeto ou possam produzir os seguintes efeitos, ainda que não sejam alcançados: I - limitar, falsear ou de qualquer forma prejudicar a livre concorrência ou a livre iniciativa; ( ) III - aumentar arbitrariamente os lucros.

Assim, o ilícito trabalhista voltado à obtenção de vantagem sobre a concorrência ou para majorar lucros representa grave infração da ordem econômica, ainda mais quando se realiza de forma reincidente.

Por sua vez, a reincidência, costumeiramente negada na esfera trabalhistas, está expressamente prevista, por exemplo, no art. 59, da Lei n. 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor). No Direito Penal a reincidência constitui circunstância agravante da pena (art. 61, I, CP) e impede a concessão de fiança (art. 323, III, CPP).

Enfim, não se pode conceber que o infrator da lei obtenha na própria ordem jurídica um fundamento para constituir e preservar, sobre a concorrência, uma vantagem econômica, obtida com o ato ilícito praticado

Neste sentido, bem ao contrário do sugerido na decisão do STF, que vê nos juros de mora tratados na Lei n. 8.177/91, uma forma "de enriquecimento sem causa" do reclamante/trabalhador, a ausência de um gravame econômico pelo ilícito praticado representa, isto sim, um "enriquecimento ilícito" do devedor/empregador, um incentivo para a prática ilícita, a desconsideração dos interesses vitais da vítima e uma forma de punição dos demais empregadores que cumprem regularmente a legislação do trabalho, subvertendo toda a lógica do aparato jurídico.

Desse modo, na avaliação dos efeitos da ilicitude trabalhista faz-se necessário aplicar todos os demais dispositivos legais cuja vigência não foi afastada, o que, por certo, não representa nenhum tipo de afronta à decisão em questão, até porque, como já pontuado, referida decisão partiu do pressuposto da equiparação do crédito trabalhista ao crédito cível e com relação a este todos os dispositivos citados têm incidência.

O inegável é que não há remuneração adicional fixada nos contratos de trabalho para as perdas e danos presumidamente experimentados no curso da relação de emprego decorrentes do desrespeito das regras legais.

Nas relações cíveis, o credor (aquele que, por exemplo, vende ou aluga uma mercadoria ou empresta dinheiro) guarda, consigo, garantias legais e contratuais. Expressam-se, neste sentido, além do direito à correção monetária também os juros de mora, decorrentes do mero atraso do cumprimento da obrigação assumida, e os juros compensatórios/remuneratórios, que servem como indenização pré-fixada por danos, os quais, inclusive, são presumidos e, portanto, não dependem de prova. E, segundo estabelece a Súmula 102 do STJ, não há anatocismo quando o contrato estipula que os juros moratórios incidam igualmente sobre os juros compensatórios.

Além disso, aos juros moratórios e aos juros compensatórios ainda se pode acumular a multa contratual (APL 0002608-60.2016.8.08.0050 - TJ(ES).

No caso específico dos empréstimos financeiros é possível ainda fixar juros remuneratórios independentemente de qualquer inadimplemento, sendo considerados como o próprio preço do negócio.

A única restrição à aplicação dos preceitos referentes aos juros gira em torno da avaliação do caráter abusivo dos percentuais, os quais, em geral, são contratualmente impostos por empresas (que são também os empregadores/reclamados) a consumidores (que são, potencialmente, os trabalhadores/reclamantes).

No    exame     da    abusividade     foram    fixados     os    entendimentos jurisprudenciais de que:

  • os juros moratórios - incidentes desde a data do inadimplemento (art. 397 do CC) e não da propositura da ação judicial, como se consagrou na realidade jurídica trabalhista - devem se limitar a 12% ao ano;
  • os juros compensatórios, para as lojas varejistas, se limitam a 12% ao ano (STJ, RE nº 1720656 - MG - 2018/0017605-0);
  • os juros compensatórios, para as instituições financeiras, não encontram limite (Súmula 382 do STJ), sendo avaliados em função da "média de mercado", conforme parâmetros definidos pelo Banco Central (https://www.bcb.gov.br/estatisticas/txjuros);
  • a multa contratual, também possível, não se entende abusiva nos percentuais de 10 a 20%.

Desse modo, um(a) trabalhador(a) que não recebe o seu salário (ou perde o emprego e não recebe verbas rescisórias) e que, por conta disso, precisa se valer de um empréstimo bancário, ainda que seja pela fórmula do cheque especial, ou se socorre do carão de crédito e depois não consegue cumprir a obrigação na data do vencimento, se submete a pagar a dívida, atualizada pelo IPCA- E, acrescida com juros compensatórios (que, no caso dos Bancos pode chegar até a 9,6% ao mês e 200,54% ao ano - dentro de uma média que é superior a 8% ao mês e 100% ao ano), juros moratórios (de até 12% ao ano) e multa contratual (cujo percentual de 10 até 20%, em geral, não se tem por abusivo).

Mas pelo parâmetro fixado pelo STF, no julgamento da ADC 58, o devedor deste mesmo trabalhador deverá lhe pagar a dívida apenas com a atualização pelo IPCA-E (4,5% ao ano) - até a notificação, e a aplicação, dali para adiante, da taxa da SELIC (2,0% ao ano) - já englobando juros e correção monetária.

Imagine-se, então, a hipótese de que este trabalhador é detentor de um vultoso crédito trabalhista perante o Banco (atestado em uma ação judicial), mas, ao mesmo tempo, devedor deste mesmo Banco, em razão de um pequeno empréstimo. Adotados os parâmetros acima enunciados, basta o Banco retardar o andamento do processo da reclamação trabalhista para que de devedor se transforme em credor do reclamante.

Independe dessa coincidência hipotética (mas não tão imaginária assim, visto que os trabalhadores que não recebem seus direitos continuam tendo que arcar com vários compromissos contratualmente assumidos na condição de devedores: aluguel, compra e venda etc), o fato concreto é que simplesmente aplicar a regra do art. 406 do Código Civil aos créditos trabalhistas não se promove qualquer tipo de equiparação destes aos créditos cíveis e sim um claro e retumbante rebaixamento.

Por outro lado, como se está manifestando na presente decisão, o debate em torno da questão acaba sendo uma grande oportunidade para perceber que, de fato, o crédito trabalhista já detinha uma proteção jurídica bem inferior àquela que, em homenagem à segurança dos negócios, se conferia aos créditos oriundos das relações reguladas pelo Direito Civil, abrindo-se a oportunidade/necessidade de se operar alguma reformulação em torno da questão, ainda que pequeno.

Neste sentido, é importante acrescentar que o crédito do trabalhador decorre de direitos trabalhistas não respeitados e esses direitos, em geral, visam a remunerar o trabalho que já foi prestado pelo(a) trabalhador(a), durante certo período (uma semana, um mês ou doze meses). Na ausência do pagamento do direito que decorre do trabalho prestado o que se tem, por consequência, é trabalho não remunerado.

E como o trabalho prestado gera valor (de forma direta ou indireta - não sendo pertinente aqui adentrar a discussão em torno dos conceitos de trabalho produtivo ou improdutivo), em benefício daquele que se utiliza desse trabalho para a satisfação de seu interesse econômico (manifestado direta, ou indiretamente), o trabalho não remunerado se apresenta, efetivamente, como apropriação(por meio de ardil, artifício ou qualquer outro meio fraudulento) de algo que lhe pertence, a mercadoria força de trabalho, levando consigo também as necessidades e os sonhos daqueles(as) dos quais a força de trabalho se extrai.

Esse valor subtraído do patrimônio do(a) trabalhador(a), além disso, é utilizado pelo devedor para nova investida econômica. No caso de casas comerciais, para o acesso a todos os bens necessários à circulação das mercadorias. No caso dos Bancos, o dinheiro retido é oferecido no mercado a juros remuneratórios/compensatórios na média de 100% ao ano.

Além de tudo isso, como bem destacado pelo magistrado Marcus Menezes Barberino Mendes, Juiz Titular da Vara de São Roque, a SELIC estimada pelo Banco Central do Brasil como instrumento de política monetária está, atualmente, fixada em 2% ao ano, enquanto a inflação acumulada no ano de 2020 alcançou 4,23%, o que torna incontestável a perda patrimonial do(a) trabalhador(a) também por este aspecto (PROCESSO Nº 0011363-45.2019.5.15.0108).

Todos esses aspectos considerados fazem com que seja altamente necessário (e com grandioso atraso) atrair para os créditos trabalhistas, como, aliás, determina a decisão do STF na ADC 58, ao menos a incidência dos juros compensatórios e isto, considerando a desigualmente material dos contratantes trabalhistas, só se dará por meio da aplicação (de ofício) do parágrafo único do art. 404 do Código Civil, cuja previsão abarca exatamente situações como as que se apresentam nas relações de emprego, quando o credor é a parte economicamente fraca da relação jurídica firmada.

Consideradas as compreensões de que a ilegalidade cometida é trabalho não remunerado, de que a não remuneração do trabalho é uma forma de subtração de uma mercadoria e de que o valor que indevidamente se retém com tal prática serve à obtenção de uma vantagem econômica - que, como dito acima, se perfaz em prejuízo de empregadores concorrentes - uma fórmula mínima de se compensar o dano do(a) trabalhador(a) e reduzir a vantagem do infrator é estabelecer um percentual mensal, no nível da "média de mercado", sobre a representação econômica dos direitos não cumpridos.

Assim, respeitados todos esses preceitos e tomando como parâmetro também o princípio da isonomia, integro à presente condenação trabalhista, em favor do reclamante, a título de reparação de danos pelos atos ilícitos reconhecidamente praticados pela reclamada, a indenização suplementar mínima regulada pelo parágrafo único do art. 404 do Código Civil (ao menos em patamar similar ao dos juros compensatórios/remuneratórios jurisprudencialmente autorizados) equivalente ao percentual de 12% ao ano ou, mais precisamente, 0,948% ao mês, incidente sobre os valores mensalmente suprimidos, contando-se da data das respectivas lesões de direitos até a data em que o crédito for integralmente satisfeito.

PREQUESTIONAMENTO

Para todos os efeitos, considero devidamente prequestionadas as matérias e os dispositivos legais e constitucionais invocados.

Dispositivo

Pelo exposto, resolvo conhecer do recurso ordinário interposto pelo reclamante NELITO CORREIA DE ANDRADE e, no mérito, dar-lhe parcial provimento para declarar a  responsabilidade  subsidiária  da  segunda  reclamada pelo  pagamento  dos  créditos  deferidos  ao reclamante,  deferir  o  pagamento  de  1h  diária  a  título  de  horas  in  itinere,  com  acréscimo  de 50% (cinquenta por cento) e reflexos em aviso prévio, décimo terceiro salário, férias, FGTS e multa de 40% (quarenta por cento), deferir o pagamento das horas extras laboradas acima da 8ª diária e 44ª semanal, com adicional de 50% (cinquenta por cento) e 100% (cem por cento) pelo labor aos domingos, com reflexos salariais em DSR, aviso prévio, décimo terceiro salário, férias acrescidas de 1/3, FGTS e multa de 40% (quarenta por cento), tudo nos termos da fundamentação.

Por imperativo da decisão do STF, expresso também no julgamento das ADCs 58 e 59, assim como na Resolução 672/20(STF), o critério básico de atualização dos créditos trabalhistas deferidos nestes autos, a partir de 11/11/17, é o seguinte:

  • incidência do IPCA-E na fase pré-judicial;
  • a partir da citação, a incidência da taxa SELIC (art. 406 do Código Civil), abrangendo correção monetária e juros moratórios;
  • são reputados válidos e não ensejarão qualquer rediscussão (na ação em curso ou em nova demanda, incluindo ação rescisória) todos os pagamentos realizados utilizando a TR (IPCA-E ou qualquer outro índice), no tempo e modo oportunos (de forma extrajudicial ou judicial, inclusive depósitos judiciais) e os juros de mora de 1% ao mês;
  • devem ser mantidas e executadas as sentenças transitadas em julgado que expressamente adotaram, na sua fundamentação ou no dispositivo, a TR (ou o IPCA-E) e os juros de mora de 1% ao mês;
  • os processos em curso que estejam sobrestados na fase de conhecimento (independentemente de estarem com ou sem sentença, inclusive na fase recursal) devem ter aplicação, de forma retroativa, da taxa SELIC (juros e correção monetária), sob pena de futura alegação de colisão com o posicionamento do STF (art. 525, §§ 12 e 14, ou art. 535, §§ 5º e 7º, do CPC).

Considerado o reconhecimento dos atos ilícitos praticados pela reclamada e a ausência de cláusula contratual estipulando juros compensatórios (na forma de indenização por dano presumido) e tomando como parâmetro o princípio da isonomia e os entendimentos jurisprudenciais fixados na esfera cível a respeito do tema (STJ-RE nº 1720656 - MG - 2018/0017605-0 e Súmulas 102 e 382 do STJ), integro à presente condenação, em favor do reclamante, a indenização suplementar mínima regulada pelo parágrafo único do art. 404 equivalente ao percentual de 12% ao ano ou, mais precisamente, 0,948% ao mês, incidente sobre os valores mensalmente suprimidos, contando-se da data das respectivas lesões de direitos até a data em que o crédito for integralmente satisfeito.

Rearbitro o valor da condenação, para fins recursais, em R$20.000,00 (vinte mil reais) e custas processuais, a cargo da reclamada, no montante de R$400,00 (quatrocentos reais).

Sessão Extraordinária Telepresencial realizada em 02 de março de 2021, nos termos da Portaria Conjunta GP-VPA-VPJ-CR nº 004/2020, publicada no DEJT de 07 de abril de 2020, 6ª Câmara - Terceira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da Décima Quinta Região. Presidiu o Julgamento o Exmo.Sr. Desembargador do Trabalho FÁBIO ALLEGRETTI COOPER.

Tomaram parte no julgamento:

Relator Desembargador do Trabalho JORGE LUIZ SOUTO MAIOR Desembargador do Trabalho FÁBIO ALLEGRETTI COOPER

Juíza do Trabalho LUCIANA NASR

Convocada a Juíza do Trabalho Luciana Nasr para compor o "quorum", nos termos do art. 52, § 6º do Regimento Interno deste E. Tribunal.

Presente o DD. Representante do Ministério Público do Trabalho.

ACORDAM os Magistrados da 6ª Câmara - Terceira Turma do Tribunal do Trabalho da Décima Quinta Região, em julgar o processo nos termos do voto proposto pelo Exmo(a). Sr(a). Relator(a).

Votação unânime, com ressalva de entendimento da Juíza do Trabalho Luciana Nasr quanto à correção monetária.

 

JORGE LUIZ SOUTO MAIOR

DESEMBARGADOR RELATOR

 


 * Segue documento na íntegra: DECISÃO_-_Indenização_suplementar_Juros_compensatórios_-_SP.pdf