Processo no omissis
DECISÃO
Considerando ter ocorrido mero reconhecimento fotográfico do indiciado em sede policial, e levando em conta a ampla falibilidade de tal procedimento mormente quando inobservados os ditames do artigo 226 do Código de Processo Penal, considero-o insuficiente para vulnerar direito fundamental do cidadão, qual seja, o de liberdade – ainda que se mostre suficiente como indício a respaldar o recebimento da inicial acusatória sobretudo se e quando somado a outras peças de informação aptas a formar a justa causa.
Neste sentido cabe citar os seguintes arestos, oriundos do TJRJ, apreciando e mantendo decisões idênticas deste magistrado:
0280231-32.2017.8.19.0001 – Recurso em Sentido Estrito 7a Câmara Criminal Des(a). JOSÉ ROBERTO LAGRANHA TÁVORA Julgamento: 05/06/2018 Recorrido preso por outra ação penal. Denunciado pela suposta prática de roubo circunstanciado por emprego de arma de fogo. Indeferimento da prisão preventiva. Recurso Ministerial Impossibilidade de decretação da constrição. O magistrado corretamente não impôs a custódia baseado no reconhecimento fotográfico do indiciado em sede policial, considerando a sua ampla falibilidade. A simples identificação por imagem não se mostra subsídio robusto para a decretação da medida extremada cautelar sem a realização de maiores investigações. O ato só se deu após 13 dias da data do sucesso e, além disso, o paciente já responde preso por outro evento criminoso, encontrando-se segregado em unidade prisional. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
Recurso em Sentido Estrito 0003894-83.2017.8.19.0001 7a Câmara Criminal Relator: Desembargador Sidney Rosa da Silva Julgamento: 25/07/2017 RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. PROCESSUAL PENAL. ARTIGO 157, PARÁGRAFO 2o, INCISOS I E II, DO CÓDIGO PENAL. PRISÃO PREVENTIVA. INDEFERIMENTO. NÃO CONFORMAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL. RECONHECIMENTO DOS ACUSADOS PELA VÍTIMA QUE FOI FEITA POR MEIO DE FOTOGRAFIA E DEPOIS DE
*
ESTADO DO RIO DE JANEIRO PODER JUDICIÁRIO TRANSCORRIDO UM LAPSO TEMPORAL DE 120 DIAS DA OCORRÊNCIA DOS FATOS. PROVA VÁLIDA COMO SUPEDÂNEO À PERSECUÇÃO PENAL, MAS FRÁGIL PARA AUTORIZAR UM DECRETO CAUTELAR DE SEGREGAÇÃO. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA. ANTECEDENTES CRIMINAIS QUE NÃO REFLETEM A INTENSIDADE DOS INDÍCIOS SUFICIENTES DESSA AUTORIA CAPAZ DE ENSEJAR A PRISÃO CAUTELAR. FUMUS COMISSI DELICTI. AUSÊNCIA. RECURSO NÃO PROVIDO. DECISÃO CONFIRMADA.
Recurso em Sentido Estrito 0324655-96.2016.8.19.0001 5a Câmara Criminal Relator: Des. Luciano Silva Barreto Julgamento: 20/07/2017 RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. DIREITO PROCESSUAL PENAL. IMPUTAÇÃO DA CONDUTA MOLDADA NO ARTIGO 157, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL. DECISÃO QUE RECEBEU A DENÚNCIA E INDEFERIU A PRISÃO PREVENTIVA DO RÉU, SOB O FUNDAMENTO DE NÃO HAVER INDÍCIOS SUFICIENTES DE AUTORIA. RECONHECIMENTO POR FOTOGRAFIA. IRRESIGNAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. DESACOLHIMENTO. 1. Para a decretação da prisão preventiva a lei exige a prova da existência do crime e indícios suficientes de autoria, fulcrada em dados concretos dos autos, a necessidade da cautela, à luz do comando das artigos 312 e 313, caput e inciso I, do Código de Processo Penal. 2. Com o advento da Lei no 12.403/11, a prisão preventiva fora mantida em nosso ordenamento jurídico, mormente quando se mostrar necessária para a garantia das ordens pública e econômica, por conveniência instrução do processo e para a aplicação da lei penal, assim como nos casos expressamente previstos, para evitar a prática de infrações penais. 3. Portanto, ao exigir a presença de indícios suficientes de autoria, a lei deixou claro que não são meros indícios que justificam a medida extrema de contrição da liberdade, mas apenas aqueles fundados, que apontem a probabilidade da participação do acusado no fato descrito na denúncia. E nessa senda o reconhecimento fotográfico, malgrado afigure-se suficiente para o recebimento da peça acusatória, não se presta a sustentar a segregação processual. 4. A prisão preventiva é medida excepcional que somente pode ser adotada quando as outras cautelares diversas forem inadequadas e insuficientes, diante das circunstâncias do caso e da gravidade do delito.
*
ESTADO DO RIO DE JANEIRO PODER JUDICIÁRIO 5. Doutrina e jurisprudência dos Tribunais Superiores e desta Corte. RECURSO DESPROVIDO.
Gustavo Noronha de Ávila, profundo estudioso do tema, traz informação relevante que diminui ainda mais a credibilidade do reconhecimento in casu, ao enfatizar: “Um dos mais fortes padrões a ser destacado foi o efeito negativo do tempo na taxa de identificação do suspeito. Isto é, a taxa de identificação do suspeito para roubos, quando o procedimento de identificação foi menos que um dia depois do crime, foi de 71,43%. Em contraste, se o intervalo de retenção entre o crime e a identificação foi de 7 a 34 dias ou mais que 34 dias, a taxa de identificação caiu para 33.33% e 14.29% respectivamente” (ÁVILA, Gustavo Noronha de, Falsas Memórias e Sistema Penal: a Prova Testemunhal em Xeque, Editora Lumem Juris, 1a edição, 2013, pág. 130). Aqui, o reconhecimento se deu após transcorridos 137 dias desde a alegada prática delitiva.
Porém, acresço outro fundamento contrário à pretensão prisional: o fato teria ocorrido no dia omissis, portanto, há mais de três anos e meio atrás, carecendo, portanto, o pedido de prisão do requisito indispensável a qualquer cautelar: o perigo na demora consubstanciado, na esfera penal, no perigo na liberdade, tendo com conta que a Folha de Antecedentes Criminais acostada ao feito não aponta outros envolvimentos do denunciado com práticas delitivas desde então, menos ainda abrangendo sentenças condenatórias transitadas em julgado.
Ressalto, por fim, que este Juízo, ao instruir processos similares ao presente, vem se deparando rotineiramente com situações nas quais as vítimas, ouvidas judicialmente, não ratificam os reconhecimentos feitos em Delegacia quando apresentadas pessoalmente aos denunciados observados os ditames do artigo 226 do Código Penal, ensejando reiteradas absolvições, o que somente corrobora o entendimento aqui esposado e endossa a ampla temeridade que representaria decreto prisional como o aqui pretendido.
Pelo exposto, indefiro o pedido de decretação de prisão preventiva de omissis.
P. Vista ao Ministério Público.
Rio de Janeiro, 18 de abril de 2019.
MARCOS AUGUSTO RAMOS PEIXOTO
JUIZ DE DIREITO