Decisão - Arguição de Inconstitucionalidade, beneficiário da justiça gratuita - PA

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO

PROCESSO JUDICIAL ELETRÔNICO - PJE PLENO

Relator: GABRIEL NAPOLEAO VELLOSO FILHO

ArgIncCiv 0000944-91.2019.5.08.0000

ARGUINTE: SEGUNDA TURMA DO EGRÉGIO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 8ª REGIÃO

ARGUÍDO: EGREGIO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA OITAVA REGIAO

CERTIDÃO

 

Certifico, para os devidos fins, que até a presente data não houve apresentação recurso contra o

  • Acórdão de Id

BELÉM, 12 de março de 2020.

PAULO RODRIGO BARROSO DE MENDONÇA

Servidor

BELEM/PA, 12 de março de 2020.

PAULO RODRIGO BARROSO DE MENDONCA

Diretor de Secretaria

 

CERTIDÃO PJe-JT

 

CERTIFICO, para os devidos fins, que o presente processo foi julgado na sessão do dia 10/02

/2020, havendo participado de seu julgamento os Exmºs Srs. Desembargadores: PASTORA DO SOCORRO TEIXEIRA LEAL – Presidente, GRAZIELA LEITE COLARES, VICENTE JOSÉ MALHEIROS DA FONSECA, JOSÉ EDÍLSIMO ELIZIÁRIO BENTES, FRANCISCA OLIVEIRA FORMIGOSA, SUZY ELIZABETH CAVALCANTE KOURY, GABRIEL NAPOLEÃO VELLOSO FILHO, MÁRIO LEITE SOARES, LUIS JOSÉ DE JESUS RIBEIRO, MARIA VALQUÍRIA NORAT COELHO, MARIA ZUÍLA LIMA DUTRA e PAULO ISAN COIMBRA DA SILVA JÚNIOR.

E, como representante do Ministério Público do Trabalho, esteve presente na sessão a Exmª Srª. Drª. CINTIA NAZARÉ PANTOJA LEÃO, Procuradora do Trabalho.

CERTIFICO que o Acórdão de Id 16283c7 foi divulgado no Diário Eletrônico da Justiça do Trabalho - DEJT do dia 11/02/2020, considerando-se como data da publicação neste juízo o dia 12/02/2020 (quarta-feira), em consonância com o ATO CONJUNTO TST.CSJT Nº 26, de 18 de setembro de 2008.

O referido é verdade. Dou fé. BELEM/PA, 12 de fevereiro de 2020

PAULO RODRIGO BARROSO DE MENDONCA

Servidor(a)

BELEM/PA, 12 de fevereiro de 2020.

 

PODER JUDICIÁRIO

JUSTIÇA DO TRABALHO

TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 8ª REGIÃO

Gab. Des. Gabriel Velloso

PROCESSO nº 0000944-91.2019.5.08.0000 (ArgIncCiv)

ARGUINTE: EGRÉGIA 2ª TURMA DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA OITAVA REGIÃO

ARGUIDO : EGRÉGIO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA OITAVA REGIÃO CUSTOS LEGIS: MINISTERIO PUBLICO DA UNIAO

 

 

 

 

 

 

 

ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. PARÁGRAFO QUARTO DO ART. 791-A, DA CLT. Declara-se a

inconstitucionalidade do parágrafo quarto do art. 791-A da CLT, incluído pela Lei nº 13.467/17, por violação aos princípios e garantias fundamentais consagrados no artigo 1º, III (princípio da dignidade da pessoa humana), artigo 5º, caput (princípio da igualdade), artigo 5º, XXXV (princípio de amplo acesso à jurisdição) e artigo 5º, LXXIV (garantia fundamental da assistência jurídica integral e gratuita), da Constituição Federal em vigor.

 

 

 

 

 

  • RELATÓRIO

 

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade, em que são partes, como suscitante e suscitado, as acima indicadas.

Trata-se de Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade do §4º do art. 791-A, da CLT, com redação dada pela Lei n. 13.467/2017, suscitado por este Relator em sessão da E. Segunda Turma deste Egrégio Regional, de 13.11.2019, que, acolhido, ora é submetido à apreciação do TRIBUNAL PLENO, nos termos previstos no artigo 948 e seguintes do Código de Processo Civil e nos artigos 23, 103 e 180 do Regimento Interno deste Tribunal.

Após a autuação e a redistribuição regular do feito, este Relator determinou a intimação do Ministério Público do Trabalho (MPT), para emitir parecer, o qual consta sob o Id c89a69d, opinando pelo conhecimento e provimento parcial do Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade, para declarar inconstitucional trecho do art. 791-A, §4º da CLT, qual seja: "desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa", por violar a Constituição Federal em seus arts. 1º, III e 5º, caput, XXXV e LXXIV.

É o relatório.

  • FUNDAMENTOS

 

  • Admissibilidade

 

Consoante relatado, em sessão de julgamento realizada no dia 13.11.2019, a EGRÉGIA SEGUNDA TURMA DESTE TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA OITAVA

REGIÃO, acolhendo proposta suscitada por este Relator, deliberou, por maioria de votos, pela instauração do presente INCIDENTE DE ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE do §4º do art. 791-A da CLT, incluído pela Lei nº 13.467/2017, com fundamento no artigo 948 e seguintes do Código de Processo Civil e nos artigos 23, 103 e 180 do Regimento Interno deste Egrégio Tribunal do Trabalho, nos autos do PROCESSO nº 0000269-41.2019.5.08.0126 (RO), em que são partes: RECORRENTE: SANADREA DOS SANTOS SOARES E RECORRIDA: HIPERMERCADO SENNA DIST. EXP. E IMPORT. LTDA.

Desse modo, presentes os requisitos de admissibilidade, uma vez superado o impeditivo a que se refere o inciso I do art. 949 do CPC, resta admitido o presente incidente de inconstitucionalidade.

2.3. Mérito

 

DA INCONSTITUCIONALIDADE DO §4º DO ARTIGO 791-A DA

CLT

 

Objetiva o presente incidente a declaração de inconstitucionalidade do §4º do artigo 791-A da CLT, introduzido pela Lei nº 13.467/2017, no que diz respeito à condenação em honorários de sucumbência, quando o vencido for beneficiário da Justiça gratuita.

Entendo que o dispositivo é inconstitucional, por quatro razões: a) viola o artigo 5º, LXXIV, da Constituição: "o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos"; b) viola a dignidade da pessoa humana, erigida a princípio constitucional no inciso III do art. 1º; c) viola o princípio da igualdade, consagrado no artigo 5º, caput da Constituição, na medida em que nega ao trabalhador garantias que são concedidas no processo civil (§1º do art. 98 do CPC); d) bem como viola o princípio de amplo acesso à jurisdição consagrado no artigo 5º, XXXV, da Carta Magna em vigor, uma vez que se choca com os direitos à inafastabilidade da jurisdição.

Desta maneira, pretende-se por este incidente seja declarada a

inconstitucionalidade:

  • - in totum do §4º do art. 791-A da CLT e/ou;
  • - da expressão "desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa" contida no §4º do art. 791-A da

Transcreve-se o teor do dispositivo celetista ora em debate:

Art. 791-A. Ao advogado, ainda que atue em causa própria, serão devidos honorários de sucumbência, fixados entre o mínimo de 5% (cinco por cento) e o máximo de 15% (quinze por cento) sobre o valor que resultar da liquidação da sentença, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa.

(...)

  • 4º Vencido o beneficiário da justiça gratuita, desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário.

De fato, à luz do citado comando legal, mesmo que beneficiário da justiça gratuita, o trabalhador vencido deverá pagar honorários quando tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar este pagamento.

Por evidente que referida previsão celetista, que confere o mesmo tratamento às partes processuais que se encontram em posições desiguais, malferindo os princípios basilares do direito do trabalho, em especial o princípio da proteção, viola as garantias constitucionais do acesso à jurisdição e do mínimo material necessário à proteção da dignidade humana (CR, arts. 1º, III, e 5º, LXXIV).

A Constituição de 1988 consagra a garantia de amplo acesso à jurisdição em seu art. 5º, nos incisos XXXV e LXXIV, que tratam, respectivamente, dos direitos à inafastabilidade da jurisdição e à assistência judiciária integral aos necessitados, in verbis:

"XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito; [...]

LXXIV - o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos.

Todavia, em posicionamento contrário aos movimentos democráticos que consolidaram essas garantias de amplo e igualitário acesso à justiça, a norma em evidência inviabiliza tal acesso ao trabalhador economicamente desfavorecido, imputando-lhe o pagamento de custas e despesas processuais de sucumbência com uso de créditos trabalhistas auferidos na Reclamação Trabalhista, de natureza alimentar, em prejuízo do próprio sustento e de sua família.

Neste sentido, manifesta-se o insigne doutrinador Maurício Godinho Delgado em sua obra in "A reforma trabalhista no Brasil com os comentários à Lei n. 13.467/2017" - São Paulo: LTr, 2017, página 329:

(..)A alteração inserida pela Lei n. 1 3.467/2017 no tocante ao regime de concessão dos honorários advocatícios de sucumbência - da maneira como regulado esse regime - corresponde a um, entre vários, dos aspectos mais impactantes da reforma, considerado o plano processual trabalhista.

 

É que o conjunto normativo constante do art. 791-A, caput e §§ 1º até 5º, da CLT - se lido em sua literalidade -, pode inviabilizar o direito e a garantia constitucionais fundamentais constitucionais da justiça gratuita (art. 5º, XXXV, CF) e o direito, garantia e princípio constitucionais fundamentais do amplo acesso à justiça (art. 5º, XXXV, CF) relativamente à grande maioria das pessoas físicas dos trabalhadores do País. Isso em decorrência dos elevados riscos econômico-financeiros que passam a envolver o processo judicial trabalhista, particularmente para as pessoas destituídas de significativas (ou nenhuma) renda e riqueza". (...).

 

Acerca do tema em questão, também posiciona-se Mauro Schiavi em sua obra "A reforma trabalhista e o processo do trabalho : aspectos processuais da Lei n. 13.467/17 / Mauro Schiavi. - 1. ed. - São Paulo : LTr Editora, 2017, páginas. 83/86:

"A previsão da sucumbência recíproca configura a alteração mais significativa da novel legislação, pois altera, em muito, o protecionismo processual que é um dos pilares de sustentação do processo trabalhista e, pode em muitos casos inviabilizar ou ser um fator inibitório do acesso à justiça da parte economicamente fraca.

Como bem adverte José Afonso Dallegrave Neto(79):

"Imagine-se, por exemplo, um trabalhador que ingressa na Justiça do Trabalho por ter adquirido doença que lhe causou perda laboral total. Segundo ele e a opinião de seu médico particular a incapacidade tinha nexo com a execução do seu trabalho. Após intenso debate, produção de prova documental, testemunhal e pericial o juiz acolhe o pedido e defere indenização por dano moral de R$ 30.000,00, mais pensionamento equivalente a R$ 170.000,00, e honorários advocatícios de 10%. Além disso, o Reclamante também ganha R$ 10.000,00 referente a diferenças salariais de equiparação salarial. O Reclamado recorre e, por maioria de votos, a Turma reforma a decisão. Julga improcedente o pedido acidentário e mantém o da equiparação. Ora, neste caso, mesmo com o êxito no pedido de diferenças salariais, o trabalhador terá um saldo negativo em seu processo. Apesar de ganhar R$ 11.000,00 (R$ 10.000,00 + 10% de honorários), terá que pagar R$ 20.000,00 ao Reclamado relativo aos honorários de sucumbência do pleito reformado (10% sobre: R$170.000,00 + R$ 30.000,00). Moral da história, o trabalhador ganhou equiparação e mesmo assim sairá devendo R$ 9.000,00 para a empresa".

De nossa parte, a sucumbência recíproca deverá ser vista com muita sensibilidade pelo Judiciário Trabalhista de modo a não obstar a missão histórica da Justiça Trabalhista que é facilitar o acesso à Justiça ao trabalhador.

No mesmo diapasão advertem Jorge Luiz Souto Maior e Valdete Severo(80):

"Aqui talvez se esteja diante de uma das mais nefastas previsões da Lei n. 13.467/17, pois a sucumbência recíproca é a antítese da razão de existência mesma de um processo do trabalho, ao menos nos moldes propostos, isto é, sem o reconhecimento da gratuidade como princípio do acesso à justiça e sem a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, ou seja, impondo custos a quem não tem como pagar. A Justiça do Trabalho tem por pressuposto a facilitação do acesso à justiça, o que inclui a noção de jus postulandi e de assistência gratuita. Essa última, como se viu, abrange todas as despesas do processo. E se assim não for, para que a norma seja aplicada em consonância com a proteção que inspira a existência do processo do trabalho e com a própria linha argumentativa dos defensores da "reforma", que insistem em dizer que não houve retirada de direitos, outras duas questões devem ser necessariamente observadas. Primeiro, que os honorários deferidos ao patrono do reclamante precisarão ser compensados com aqueles fixados em contrato, caso não se compreenda pela própria impossibilidade de cumulação. E, ainda, que os honorários fixados para o advogado da empresa deverão ser de 5%, enquanto aquele a ser reconhecido ao patrono do trabalhador deverá observar o patamar máximo de 15%, em razão da objetiva diferença na capacidade econômica das partes. Além disso, há de se reconhecer que sucumbência recíproca não existe no aspecto específico da quantificação do pedido. Isto é, se, por exemplo, o pedido de dano moral, com valor pretendido de R$ 50.000,00, for julgado procedente mas no patamar fixado pelo juiz de R$ 5.000,00, não se terá a hipótese de "procedência parcial", da qual advém a hipótese de sucumbência recíproca, porque, afinal o pedido foi julgado procedente e a própria lei autoriza fixar as indenizações em outro patamar, que não é de um valor exato. E, se assim não se entendesse, os honorários advocatícios conferidos ao empregador poderiam até ser superiores à indenização deferida ao reclamante. Destaque-se que mesmo na dinâmica do processo civil, a compreensão doutrinária, já refletida em jurisprudência e em lei, é a de que os honorários advocatícios não servem para conferir um proveito econômico à parte que não tem razão; ou, dito de outro modo, não constituem instrumento para penalizar a parte economicamente desprovida e que vai à Justiça pleitear os seus direitos. Vide, neste sentido, a Súmula n. 326 do STJ: "Na ação de indenização por dano moral, a condenação em montante inferior ao postulado na inicial não implica sucumbência recíproca." E, também, o teor do parágrafo único do art. 86: "Se um litigante sucumbir em parte mínima do pedido, o outro responderá, por inteiro, pelas despesas e pelos honorários."

Por oportuno trago à baila a seguinte lição doutrinária de Antônio Umberto de Souza Júnior, Fabiano Coelho de Souza, Ney Maranhão e Platon Teixeira de Azevedo Neto In "Reforma Trabalhista - Análise Comparativa e Crítica da Lei nº 13.467/2017"- Editora Rideel; São Paulo; 2017; pág.385/387. (grifos existentes no original):

"Honorários e assistência judiciária gratuita.

 

" O §4° do art. 791-A da CLT trata dos honorários advocatícios devidos pelo beneficiário da justiça gratuita. A mesma fórmula inicial foi adotada pelo legislador reformista no novo §4º do art. 790-B, já examinado.

A norma em tela cogita de duas hipóteses a envolver o beneficiário da justiça gratuita:

  • ele não possui "créditos capazes de suportar as despesas": neste caso ficará suspensa por dois anos a exigibilidade dos honorários advocatícios a que foi condenado, sendo

 

totalmente desobrigado de tal pagamento se, em tal interregno, não houver mudança significativa em sua condição pessoal;

  • ele possui, "ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa": o valor dos honorários advocatícios será pago pelo beneficiário mediante retenção direta nos créditos a que tenha direito

Ao que se vê, a variável fundamental é a constatação de que a existência de "créditos capazes de suportar a despesa". Qual sentido desta expressão?

Numa interpretação gramatical alheia a qualquer outra dimensão, é possível inferir que o legislador tenha imaginado uma operação aritmética simples: se o beneficiário da justiça gratuita tiver crédito em montante igual ou superior ao valor dos honorários destinados ao advogado da parte vencedora, será retirada do próprio beneficiário a importância necessária para a quitação da verba honorária.

Contudo, tal leitura simplória tem sobrevida curta quando seja conectado com a garantia constitucional de gratuidade. O texto constitucional é bem objetivo e incisivo ao assegurar a todos os necessitados a pretensão de assistência jurídica integral e gratuita.

 

O binômio não esconde nenhum mistério hermenêutico: nada pagará quem buscar socorro no judiciário sem ter condições para arcar com as despesas próprias de quem litiga. Daí a lista extensa de despesas abarcadas pela justiça gratuita constante do art. 98,

  • 1º, do CPC, bem maior do que aquela que figurava no atualmente revogado art. 3º da Lei nº1.060/1950: custas, selos postais, publicações na imprensa oficial, indenizações a testemunhas, exames de DNA, honorários advocatícios (de advogado, de perito, de intérprete e de tradutor), confecção de planilhas de cálculos, depósitos recursais e emolumentos.

A lei não contém palavras inúteis. O legislador ordinário que criou o novo CPC levou a sério a ideia clara de integralidade da gratuidade judiciária.

Porém, tal qual já indicava o art. 12 da Lei nº 1.060/1950, atualmente também revogado pelo novo CPC, este não isenta o beneficiário das despesas enumeradas, mas apenas determina que tais obrigações sucumbenciais fiquem sob condição suspensiva de exigibilidade pelo prazo de 5 anos (prazo reduzido, na CLT, para 2 anos). Se dentro do lapso temporal estabelecido pela lei, sobrevier alteração relevante nas condições financeiras do beneficiário, deverá ele quitar o débito com o judiciário; não havendo modificação na sua situação pessoal em tal quinquênio (ou biênio, no caso dos processos trabalhistas), ficará definitivamente exonerado de tais pagamentos.

Não é possível transigir interpretativamente nessa matéria porque a assistência jurídica integral e gratuita é instrumento fundamental de viabilização do efetivo acesso à justiça. Não se pode permitir que, em pleno século XXI, seja juridicamente tolerável a reconstrução de muralhas financeiras para tornar difícil ou impossível bater às portas dos portas dos tribunais para o indivíduo ter o seu day of court, tornando novamente atuais os densos estudos de Cappelletti e Garth sobre as ondas de acesso à justiça que começaram justamente pela superação dos obstáculos econômicos.

A jurisprudência do STF é muito clara na direção da amplitude e da incompensabilidade de créditos com encargos sucumbenciais de responsabilidade de beneficiário da justiça gratuita. À guisa da ilustração, veja-se o seguinte aresto:

Direito constitucional e processual civil. FGTS. Atualização: correção monetária. Recurso extraordinário. Agravo. Alegações de perda de eficácia de medidas provisórias e de sucumbência mínima dos agravantes. Prequestionamento. (...) 2. No mais, como ressaltado pela decisão agravada: "em face da sucumbência recíproca, será proporcionalizada a responsabilidade por custas e honorários advocatícios, fazendo- se as devidas compensações, ressalvado o benefício da assistência judiciária gratuita". 3. Sendo assim, na liquidação se verificará o quantum da sucumbência de cada uma das partes e, nessa proporção, se repartirá a responsabilidade por custas e honorários, ficando, é claro, sempre ressalvada, quando for o caso, a situação dos beneficiários da assistência judiciária gratuita, que só responderão por tais verbas, quando tiverem condições para isso, nos termos do art. 12 da Lei nº 1.060, de 5-2- 1950. 4. Agravo improvido (STF, 1ª T., AgRg-Agln nº 304693, Sydney Sanches, j. 9-10- 2001, DJU 1º-2-2002)

 

Portanto, para salvar a norma de leituras constitucionalmente desastrosas, a expressão "créditos capazes de suportar a despesa" somente pode merecer um sentido: ressalva a lei que, sendo a condição financeira do beneficiário da justiça gratuita transformada pelo grande vulto da soma a ele destinada por força da decisão judicial na qual tenha sido responsabilizado pelos honorários de advogado- ou em outro processo qualquer- deverá ele arcar com esta verba sucumbencial , aliviando os cofres públicos federais.

Ou seja, o beneficiário da justiça gratuita só suportará tais despesas caso aufira créditos cujo montante promova contundente e indiscutível alteração de sua própria condição socioeconômica.

 

Destacamos que na CLT o prazo de espera para quitação das verbas sucumbenciais é menor do que aquele de cinco anos instituído, sucessivamente, no art. 12 da Lei nº 1.060

/1950 (revogada) e no atual CPC: será de dois anos. Assim, sobrevindo mudança significativa na situação financeira de beneficiário da justiça gratuita condenado em honorários advocatícios, imediatamente com o resultado de alguma ação judicial ou por qualquer outro evento verificado nos dois anos subsequentes ao deferimento da gratuidade, deverá ele pagar a verba honorária."

Frise-se que o Código de Processo Civil prevê a aplicação da norma mais branda ao desfavorecido economicamente, consoante previsão contida no artigo 98, §1º, inciso VI, o qual dispõe que as custas e honorários do advogado são abrangidos pela justiça gratuita, in verbis:

Art. 98. A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei.

  • 1º A gratuidade da justiça compreende:

VI - os honorários do advogado e do perito e a remuneração do intérprete ou do tradutor nomeado para apresentação de versão em português de documento redigido em língua estrangeira;

Registre-se, que a inconstitucionalidade do referido dispositivo legal já foi arguida, em controle concentrado, pela Procuradoria-Geral da República na ADI nº 5766, que tem por objeto diversos dispositivos trazidos com a chamada "Reforma Trabalhista" (Lei. 13.467/2017), dentre os quais, o §4º do art. 791-A da CLT, em cuja ação externou que a redação do referido dispositivo colide com o art. 5º, LXXIV, da Constituição, "ao impor a beneficiários de justiça gratuita pagamento de despesas processuais de sucumbência, até com empenho de créditos auferidos no mesmo ou em outro processo trabalhista, sem que esteja afastada a condição de pobreza que justificou o benefício".

 

Peço

venia

para transcrever trecho dos fundamentos externados pela

 

Procuradoria-Geral da República na ADI nº 5766:

"2.2 RESTRIÇÕES INCONSTITUCIONAIS DE ACESSO À JUSTIÇA DO TRABALHO

2.2.1 Inconstitucionalidade de Honorários Periciais e Advocatícios contra Beneficiário de Justiça Gratuita

Dispõem os arts. 790-B, caput e § 4o e 791-A, § 4o , da CLT, na redação conferida pela nova legislação, ora impugnada (sem destaque no original): Art. 790-B. A responsabilidade pelo pagamento dos honorários periciais é da parte sucumbente na pretensão objeto da perícia, ainda que beneficiária da justiça gratuita.

 

[...]

  • 4º Somente no caso em que o beneficiário da justiça gratuita não tenha obtido em juízo créditos capazes de suportar a despesa referida no caput, ainda que em outro processo, a União responderá pelo encargo.

Art. 791-A. Ao advogado, ainda que atue em causa própria, serão devidos honorários de sucumbência, fixados entre o mínimo de 5% ([...]) e o máximo de 15% ([...]) sobre o valor que resultar da liquidação da sentença, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa.

[...]

  • 4 o Vencido o beneficiário da justiça gratuita, desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário.

A assistência judiciária gratuita na Justiça do Trabalho é disciplinada pelo art. 14, caput, da Lei 5.584, de 26 de junho de 1970, em vigor, segundo o qual, no processo do trabalho, "a assistência judiciária a que se refere a Lei no 1.060, de 5 de fevereiro de 1950, será prestada pelo sindicato da categoria profissional a que pertencer o trabalhador".

O benefício da gratuidade judiciária encontra-se disciplinado pelo § 3º do art. 790 da CLT.

Antes da reforma, ele vigorava na redação dada pela Lei 10.537, de 27 de agosto de 2002, que destinava o benefício da gratuidade àqueles que (a) percebessem salário igual ou inferior ao dobro do mínimo legal, ou que (b) declarassem, sob as penas da lei, não estar em condição de pagar as custas do processo sem prejuízo do sustento próprio ou de sua família. "Art 14. Na Justiça do Trabalho, a assistência judiciária a que se refere a Lei no 1.060, de 5 de fevereiro de 1950, será prestada pelo Sindicato da categoria profissional a que pertencer o trabalhador".

Conforme FREDIE DIDIER JÚNIOR e RAFAEL OLIVEIRA, "justiça gratuita, ou benefício da gratuidade, ou ainda gratuidade judiciária, consiste na dispensa da parte do adiantamento de todas as despesas, judiciais ou não, diretamente vinculadas ao processo, bem assim na dispensa do pagamento dos honorários do advogado. Assistência judiciária é o patrocínio gratuito da causa por advogado público ou particular". DIDIER, Fredie; OLIVEIRA, Rafael. Benefício da Justiça Gratuita. Aspectos Processuais da Lei de Assistência Judiciária (Lei Federal no 1060/50). 2. ed. Salvador: JusPodivm, 2005, p. 6-7.

"§ 3o É facultado aos juízes, órgãos julgadores e presidentes dos tribunais do trabalho de qualquer instância conceder, a requerimento ou de ofício, o benefício da justiça gratuita, inclusive quanto a traslados e instrumentos, àqueles que perceberem salário igual ou inferior ao dobro do mínimo legal.

A Lei 13.467/2017 alterou esse § 3o e substituiu o critério configurador de insuficiência de recursos. Facultou ao juízo conceder gratuidade judiciária "àqueles que perceberem salário igual ou inferior a 40% ([...]) do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social" (RGPS).

O novo § 4o do dispositivo, também inserido pela reforma, assegura gratuidade à parte que comprovar insuficiência de recursos para pagar as custas do processo.

A respeito da "faculdade" de que trata o § 3o, em linha textual idêntica à do enunciado revogado, GABRIEL SAAD, JOSÉ EDUARDO SAAD e ANA MARIA CASTELO

BRANCO defendem tratar-se de dever estatal fundado no art. 5º , LXXIV, da CR, sempre que configurada carência de recursos para atender às despesas processuais:

 

O teor do inciso LXXIV do art. 5o da Lei Fundamental ("o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos") não se trata de uma faculdade do magistrado, mas um dever, se comprovada a condição de necessitado do autor ou do réu.

É, portanto, dever do Estado prestar tal assistência a quem provar não possuir recursos para suportar as despesas processuais. A Lei 1.060/50 regula essa norma constitucional.

[...]

O legislador, no tocante ao benefício da justiça gratuita, insiste no erro de considerar faculdade do juiz deferi-lo ou não. Entendemos que, provado ser a parte um necessitado, deve o juiz outorgar-lhe o benefício da justiça gratuita. À semelhança do que estabeleceu a Constituição, no precitado inciso LXXIV do art. 5o , com referência ao dever do Estado de prestar assistência judiciária aos necessitados, caberia à lei ordinária dizer, às expressas, que o juiz é obrigado a conceder o benefício da gratuidade a quem não tiver recursos para atender às despesas processuais.19 Em idêntico sentido, tranquila jurisprudência trabalhista garante gratuidade de custas e despesas processuais à parte que comprovar insuficiência de recursos, nos termos do art. 790, § 3 o , da CLT, combinado com dispositivos da Lei 1.060/1950.20 Esses dispositivos da Lei 1.060/1950 foram em parte derrogados e substituídos pelos arts. 98 a 102 da Lei 13.105, de 16 de março de 2015 (novo Código de Processo Civil). O art. 98, caput, não deixa dúvida de que a gratuidade judiciária abrange custas, despesas processuais e honorários advocatícios.

Acerca do direito a justiça gratuita à parte que comprovar insuficiência de recursos e de sua abrangência na Justiça do Trabalho, a legislação reformista não alterou substancialmente o cenário normativo. Inseriu mera substituição do patamar salarial para aferir o direito à gratuidade, antes fixado em múltiplos de salários mínimos (dois salários) e agora em percentual (40%) do teto de benefícios do RGPS. Honorários periciais no processo do trabalho já eram devidos pela parte sucumbente na pretensão objeto de perícia, "salvo se beneficiária da justiça gratuita", conforme texto anterior do art. 790-B, caput, da CLT, inserido pela Lei 10.537/2002. A redação da legislação impugnada passou a exigir pagamento de honorários periciais de sucumbência também dos beneficiários de justiça gratuita (caput). Nesse aspecto reside inconstitucionalidade, que se espraia sobre o § 4 o do dispositivo, por atribuir ao beneficiário de justiça gratuita o pagamento de honorários periciais de sucumbência sempre que obtiver "créditos capazes de suportar a despesa referida no caput, ainda que em outro processo". A norma desconsidera a condição de insuficiência de recursos que justificou o benefício. O mesmo ocorre com o § 4 o do novo art. 791-A da CLT, inserido pela lei impugnada, relativamente aos honorários advocatícios de sucumbência. Por muito tempo a jurisprudência trabalhista entendeu-os indevidos, em face da capacidade postulatória das partes (CLT, art. 791), salvo na hipótese de assistência judiciária gratuita prestada por sindicato da categoria profissional.

Nesse caso, a jurisprudência reconhecia devidos honorários em favor do sindicato, por força do art. 16 da Lei 5.584/1970,23 em percentual não superior a 15%, por aplicação do art. 11, § 1 o , da Lei 1.060, de 5 de fevereiro de 1950.24 Firmou-se nesse sentido a súmula 219 do Tribunal Superior do Trabalho (Resolução 14/1985 do TST). 25 Influenciado pela Emenda Constitucional (EC) 45, de 30 de dezembro de 2004, que ampliou a competência da Justiça do Trabalho para causas não estritamente trabalhistas, e pelo novo Código de Processo Civil (CPC), que passou a disciplinar a gratuidade judiciária (arts. 98 a 102), recentemente o TST alterou a súmula 219 e passou a admitir pagamento de honorários advocatícios de sucumbência também na hipótese em que o sindicato atue como substituto processual, em ação rescisória e em causas não derivadas de relação de emprego (Resolução 204/2016, do TST).

O novo art. 791-A da CLT ampliou a incidência de honorários advocatícios de sucumbência para todas as causas trabalhistas (caput), até em sucumbência recíproca, em caso de procedência parcial (§ 3º).

O § 4o do dispositivo impugnado, nos moldes do § 4 o do art. 790-B (quanto aos honorários periciais), considera devidos honorários advocatícios de sucumbência por beneficiário de justiça gratuita, sempre que "tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa". Também aqui a norma ignora a condição de insuficiência de recursos que deu causa ao benefício. Nessas disposições

 

reside a colisão com o art. 5o , LXXIV, da Constituição, ao impor a beneficiários de justiça gratuita pagamento de despesas processuais de sucumbência, até com empenho de créditos auferidos no mesmo ou em outro processo trabalhista, sem que esteja afastada a condição de pobreza que justificou o benefício.

A noção de insuficiência de recursos, para os fins da norma de direito fundamental, encontra-se tradicionalmente conformada, no processo do trabalho, pelo art. 14, § 1 o , da Lei 5.584/1970, o qual trata da assistência judiciária gratuita. Segundo essa norma, assistência judiciária gratuita é devida ao trabalhador cuja "situação econômica não lhe permite demandar, sem prejuízo do sustento próprio ou da família", ainda que perceba salário superior ao patamar indicado, de dois salários mínimos (sem destaque no original): § 1 o A assistência é devida a todo aquêle que perceber salário igual ou inferior ao dôbro do mínimo legal, ficando assegurado igual benefício ao trabalhador de maior salário, uma vez provado que sua situação econômica não lhe permite demandar, sem prejuízo do sustento próprio ou da família. 28 Articulada com a nova redação do art. 790 da CLT, essa disposição garante direito a gratuidade judiciária na Justiça do Trabalho àquele que se enquadrar em patamar salarial de até 40% do teto de benefícios da Previdência Social (CLT, art. 790, § 3 o ) e àquele que, mesmo percebendo salário superior, demonstrar situação econômica que não lhe permita demandar sem prejuízo próprio e da família (Lei 5.584/1970, art. 14, § 1 o ). Definido encontra-se, portanto, o direito a gratuidade judiciária na Justiça do Trabalho. As normas impugnadas confrontam e anulam essas condições conformadoras da insuficiência de recursos, pois permitem empenho de créditos trabalhistas para custear despesas processuais, sem condicioná-los a perda da condição de insuficiência econômica. Contrapondo as normas ordinárias delineadoras do direito fundamental (CR, art. 5o , LXXIV), os dispositivos impugnados esvaziam seu conteúdo e inviabilizam ao demandante pobre a assunção dos riscos da demanda. Padecem, por isso, de inconstitucionalidade material.

Relativamente a honorários periciais, dispõe o novo art. 790-B, § 4 o , da CLT que a União somente responderá pela despesa caso o beneficiário de justiça gratuita não tenha obtido em juízo créditos capazes de suportar a despesa, ainda que em outro processo. Concessão de justiça gratuita implica reconhecimento de que o beneficiário não dispõe de recursos para pagar custas e despesas processuais sem prejuízo de seu sustento e de sua família, na linha do art. 14, § 1 o , da Lei 5.584/1970. Essa premissa se ancora nas garantias constitucionais de acesso à jurisdição e do mínimo material necessário à proteção da dignidade humana (CR, arts. 1 o , III, e 5o , LXXIV). Por conseguinte, créditos trabalhistas auferidos por quem ostente tal condição não se sujeitam a pagamento de custas e despesas processuais, salvo se comprovada perda da condição.

Relativamente aos honorários advocatícios de sucumbência, o novo art. 791-A da CLT, inserido pela legislação reformista, prevê suspensão de exigibilidade de seu pagamento, em favor do beneficiário de justiça gratuita, pelo prazo de dois anos, sob condição de cobrança se o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a gratuidade. Nessa suspensão de exigibilidade não reside inconstitucionalidade. Disposição idêntica encontra-se no art. 98, § 3 o , do CPC de 2015, que disciplina a justiça gratuita relativamente à cobrança de despesas processuais decorrentes da sucumbência (sem destaque no original):

  • 3º Vencido o beneficiário, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos 5 ([...]) anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário. Na hipótese, a obrigação somente se torna exigível se no prazo da suspensão obrigacional o credor demonstrar perda da situação de insuficiência de recursos, o que se alinha ao art. 5o , LXXIV, da Constituição. Nesse sentido pronunciou- se o Supremo Tribunal Federal no julgamento do recurso extraordinário 249.003/RS. Reputou compatível com o art. 5o , LXXIV, da CR, o art. 12 da Lei 6.050/195029 e, por equivalência, o art. 98, § 3 o , do CPC, que o derroga e substitui com idêntica disposição.

O problema aqui reside em que o art. 791-A, § 4 o , da CLT condiciona a própria suspensão de exigibilidade dos honorários advocatícios de sucumbência a inexistência de crédito trabalhista capaz de suportar a despesa. Contraditoriamente mais restritiva à concessão de gratuidade judiciária do que a norma processual civil, dispõe a norma reformista que a obrigação de custear honorários advocatícios de sucumbência ficará sob condição suspensiva de exigibilidade, "desde que [o beneficiário de justiça gratuita] não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa". A norma desconsidera a condição econômica que determinou concessão da justiça gratuita e subtrai do beneficiário, para pagar despesas processuais, recursos econômicos indispensáveis à sua subsistência e à de sua família, em violação à garantia fundamental de gratuidade judiciária (CR, art. 5o , LXXIV)".

Ressalta-se que os Tribunais Regionais do Trabalho, em decisão Plenária, têm declarado a inconstitucionalidade do parágrafo 4º do artigo 791-A - incluído na CLT pela 13.467

/2017, consoante ementas das decisões a seguir transcritas:

TRT da 4ª REGIÃO

 

"DECLARAÇÃO INCIDENTAL DE INCONSTITUCIONALIDADE. CONFRONTO DO ART. 791-A DA CLT COM REDAÇÃO DA LEI 13.467/2017 COM PRECEITOS CONSTITUCIONAIS QUE GARANTEM A ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA

GRATUITA INTEGRAL E O ACESSO À JUSTIÇA. É inconstitucional parte da norma inserida no § 4º art. 791-A da CLT, por força da Lei 13.467 de 13.07.2017, na medida em que impõe ao trabalhador beneficiário do instituto da assistência judiciária gratuita limitação ao exercício do amplo direito de ação e aos efeitos da concessão da justiça gratuita de forma integral, como garantem os preceitos constitucionais expressos nos incisos XXXV e LXXIV do art 5º da CF/88, in verbis: "o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos." e " a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito." (TRT da 4ª Região, Tribunal Pleno, 0020024-05.2018.5.04.0124 Pet, em 13/12/2018, Relatora Desembargadora Beatriz Renck) [...]

TRT 14ª REGIÃO

 

ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. § 4º DO ART. 791-A, DA CLT. REDAÇÃO CONFERIDA PELA LEI 13.467/2017. INCIDENTE ACOLHIDO EM

PARTE. É inconstitucional a expressão contida no § 4º do art. 791-A, da CLT, com redação dada pela Lei n. 13.467/2017: "desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa", por violar a previsão contida no art. 5º, incisos XXXV e LXXIV do 7º, inciso XVI, da Constituição Federal. (TRT da 14.ª Região; Processo: 0000147-84.2018.5.14.0000; Data de Julgamento: 30/10/2018; Órgão Julgador: TRIBUNAL PLENO; Relator: CARLOS AUGUSTO GOMES LOBO)

TRT DA 19ª REGIÃO

 

ARGINC. BENEFICIÁRIO DA JUSTIÇA GRATUITA. POSSIBILIDADE DE CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS. ART. 791-A, § 4º, CLT.

INCONSTITUCIONALIDADE . Se o art. 791-A da CLT, incluído pela Lei nº 13.467

/17, impõe restrições às garantias fundamentais de assistência jurídica integral e gratuita (art. 5º, LXXIV) e do acesso à Justiça (art. 5º, XXXV), afrontando também o princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III), além de dar, equivocadamente, o mesmo tratamento a quem se encontra materialmente em situações desiguais, numa clara violação ao princípio constitucional da igualdade (art. 5º, caput), resta ao Poder Judiciário declarar a sua inconstitucionalidade. (TRT da 19ª Região - Processo: Processo Nº ArgInc-0000206-34.2018.5.19.0000 - Data de Julgamento: 07/11/2018; Órgão Julgador: TRIBUNAL PLENO; Relator: JOÃO LEITE DE ARRUDA ALENCAR)

O D. Ministério Público do Trabalho, em parecer circunstanciado

 

apresentado sob o Id c89a69d, manifesta-se pelo

provimento parcial

do Incidente de Arguição de

 

Inconstitucionalidade, para declarar inconstitucional trecho do art. 791-A, §4º da CLT, qual seja: "desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa", por violar a Constituição Federal em seus arts. 1º, III e 5º, Caput e LXXIV", consoante se transcreve:

  • - DA ANÁLISE DA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Nº 5766 E DOS PRECEDENTES PERSUASIVOS

 

Preliminarmente, cabe dizer que a inconstitucionalidade do referido dispositivo legal já foi arguida, em controle concentrado, pela Procuradoria-Geral da República na ADI nº 5766 - estando esta ação pendente de julgamento - que tem por objeto diversos dispositivos trazidos com a chamada "Reforma Trabalhista", dentre os quais o §4º do art. 791-A da CLT.

Este dispositivo, no entanto, tem seu debate quanto a inconstitucionalidade restrita à parte do disposto no referido parágrafo, conforme se pode ver de trechos da fundamentação da Procuradoria-Geral da República, assim devidamente juntados na exordial do presente incidente:

[...]

Desta forma, cabe dizer de início que os fundamentos da ADI nº 5766, no que diz respeito ao art. 791-A, §4º da CLT, estão restritos ao trecho "desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa".

Além disso, analisando os precedentes juntados quanto ao reconhecimento da inconstitucionalidade do dispositivo em questão por outros Tribunais Regionais do Trabalho em decisão Plenária, tais quais os TRTs da 4ª, 14ª e 19ª região, observa-se que duas das três decisões juntadas declaram inconstitucionalidade somente do trecho supramencionado, e não do parágrafo em sua totalidade.

  • - DA ALEGADA VIOLAÇÃO AO 5º, LXXIV DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL

Assim dispõe o art. 5º, LXXIV da CF: Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

LXXIV - o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos;

Analiso.

É notório o dever do Estado de prestação de assistência integral e gratuita quanto aos que comprovarem insuficiência de recursos, estando tal disposição consagrada no diploma constitucional em seu art. 5º, LXXIV.

Todavia, ao analisar o dispositivo ora atacado, primeiramente excluindo-se o trecho "desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa" - pois este será objeto de análise especifica - é possível notar a incidência de dois requisitos que, cumulados, ensejarão na cessação da condição suspensiva de exigibilidade das obrigações decorrentes da sucumbência do beneficiário da justiça gratuita, sendo eles:

  • que o beneficiário da justiça gratuita tenha sido vencido;
  • que seja demonstrada a cessação da situação de insuficiência de recursos do beneficiário a qual justificou a concessão da gratuidade, devendo isto ser feito no prazo de dois anos a contar do trânsito em

Assim percebe-se da análise dos requisitos e de seu efeito - qual seja a execução das obrigações decorrentes da sucumbência -, que não há afronta à norma constitucional mencionada.

Isto porque, da mesma forma que é requisito para a prestação de assistência jurídica integral e gratuita por parte do Estado, que seja comprovada a insuficiência de recursos por quem pede - conforme a norma constitucional - é também requisito essencial para que haja a possibilidade de execução das obrigações decorrentes da sucumbência do beneficiário de justiça gratuita, que a condição de insuficiência de recursos, a qual levou este a ser beneficiário da justiça gratuita, cesse - conforme o dispositivo legal.

Em outras palavras, sendo previsto no próprio art. 791-A, §4º da CLT, que somente cessará a condição suspensiva de exigibilidade das obrigações decorrentes da sucumbência do beneficiário da justiça gratuita quando este, no prazo de dois anos do trânsito em julgado, obtiver condição financeira suficiente para suportar as custas de sua sucumbência, o que faz o dispositivo de lei não é onerar a pessoa com insuficiência de recursos - visto que esta não mais terá tal insuficiência -, mas, em verdade, condenar ao pagamento de custas quem tem de fato condições de pagar sem prejuízo do próprio sustento, ainda que não tivesse no tempo do processo.

Nesta conformidade, não há de se falar em inconstitucionalidade total do dispositivo.

Todavia, no que pese não se deva considerar que há violação total do artigo quanto à norma constitucional citada, observa-se flagrante inconstitucionalidade quanto ao acesso à justiça no seguinte trecho: "desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa"

Isto pois o fragmento mencionado, prevendo a possibilidade de pagamento imediato de custas de um processo quando o beneficiário da justiça gratuita tiver obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar tais custas, não estabelece qualquer limite no tocante ao quantum que poderá ser utilizado para fins de tais pagamentos. Ora, não estabelece que é requisito para que haja o adimplemento de tais pagamentos, que o beneficiário vencido tenha antes saído de sua situação de pobreza, o qual deu causa à gratuidade em primeiro lugar.

Em outras palavras, tal trecho estabelece a possibilidade do pagamento de custas em razão de assistência judicial estatal, mesmo que ainda haja situação de insuficiência de recursos por parte do beneficiário de justiça gratuita. Assim, violando frontalmente o disposto no art.5º, LXXIV da Constituição Federal.

Deve-se, portanto, ser declarado parte do dispositivo como violador do art.5º, LXXIV da Constituição Federal.

  • - DA ALEGADA VIOLAÇÃO AO 1º, III, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL Assim dispõe o art. 1º, III, da CF:

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

I - a soberania; II - a cidadania;

  • - a dignidade da pessoa humana;
  • - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; (Vide Lei nº 13.874, de 2019)
  • - o pluralismo político.

Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.

Analiso.

É de conhecimento comum entre os profissionais do Direito a essencialidade do princípio da Dignidade da Pessoa Humana para a formação do Estado Democrático de Direito brasileiro e para os Direitos Humanos em geral.

No que pese tal princípio tenha grande amplitude e seja de difícil conceituação, existem certas características que estão sujeitas a pouco debate quanto ao que efetiva a dignidade humana, tal qual no tocante à doutrina do mínimo existencial, conceito que diz respeito às condições mínimas de vivência em dignidade, não devendo jamais ser confundido como sendo o mínimo para a mera subsistência - conceito o qual atende pelo nome de mínimo vital.

 

Ora, esta especializada trata tipicamente de processos cujos objetos são verbas de natureza alimentar, sendo estas verbas essenciais para a manutenção da vida digna do trabalhador, ora concretizando o mínimo existencial e consequentemente a dignidade de quem tem o direito.

Há de se falar, no entanto, que ainda que a justiça do trabalho trate tipicamente de verbas de natureza alimentar advindas de um vínculo empregatício, são igualmente verbas alimentares, e portanto essenciais para a manutenção da vida digna, os honorários advocatícios, de forma que, ainda que estas sejam verbas advindas do processo, estas ostentam grande carga de Direito Material em relação aos patronos processuais, de maneira que a sua mitigação irregular tem a capacidade de gerar efeitos tão danosos aos advogados quanto para qualquer outro trabalhador.

Sobre esta igualdade, cita-se ainda o art. 85, §14º do CPC:

Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor. [...]

  • 14. Os honorários constituem direito do advogado e têm natureza alimentar, com os mesmos privilégios dos créditos oriundos da legislação do trabalho, sendo vedada a compensação em caso de sucumbência parcial.

[...]

Analisando o art. 791-A, §4º da CLT, observa-se que este dispositivo, em sua generalidade, tem o condão de, em verdade, concretizar o direito alimentar do advogado, qual seja, os honorários advocatícios sucumbenciais.

Para isso, o artigo estabelece a possibilidade de que, caso o beneficiário da justiça gratuita - que, vale lembrar, ao final do processo foi reconhecido como não tendo direito ao seu pleito - venha passar a ter condições de adimplir custas devidas em até dois anos do trânsito em julgado, o patrono processual do qual as verbas são devidas, poderá efetivar o seu direito de honorários - adquiridos em razão de seu trabalho e desgasto argumentativo, o qual é comum a todos os processos - ao executar quem o deve.

Ora, após essa análise, percebe-se que não há qualquer violação à característica de efetivação da dignidade humana, qual seja o mínimo existencial, tendo em vista ainda que, como já explicado em tópico anterior, é um dos requisitos para a utilização do dispositivo que o beneficiário, antes, tenha saído de sua situação de pobreza e possa adimplir o pagamento sem prejuízo de seu sustento.

Sendo assim, observa-se que seria mais plausível dizer que haveria violação no que diz respeito ao mínimo existencial na hipótese de se declarar o dispositivo como inconstitucional em sua totalidade, isto pois, como já observado, este é essencialmente um dispositivo legal que tem a intenção de efetivar um devido crédito alimentar, qual seja os honorários do advogado, e consequentemente a manutenção de sua vida digna por assegurar o mínimo existencial do patrono.

Desta forma, em sua generalidade, o referido dispositivo não deve ser declarado inconstitucional.

Isto, no entanto, não é verdade no que diz respeito ao trecho: "desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa".

Neste fragmento do artigo há de se falar em flagrante inconstitucionalidade. Isto porque, como já anteriormente esclarecido, não é estabelecido como critério para a execução das verbas ganhas em juízo, que o beneficiário da justiça gratuita tenha saído de sua situação de pobreza nos termos da lei.

Sendo assim, o trecho considera que é válido o pagamento de custas ainda que, para isto, haja a manutenção da miserabilidade do beneficiado da justiça gratuita.

Ora, evidentemente violando a dignidade humana por rejeitar o mínimo existencial devido ao trabalhador.

 

Portanto, devendo haver a declaração de inconstitucionalidade da mencionada parte do dispositivo pela violação do princípio da dignidade da pessoa humana, presente no art. 1º, III, da Constituição Federal.

  • - DA ALEGADA VIOLAÇÃO AO ART. 5º, CAPUT, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL

Assim dispõe o art. 5º, caput, da CF:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

Vejamos.

Em clara redação, o art. 5º da Constituição Federal inaugura seu extensivo rol de garantias ao estabelecer preliminarmente a igualdade de todos perante a lei.

Neste sentido, não há de se falar em inconstitucionalidade quanto ao art. 791-A, §4º da CLT em sua totalidade ao alegar que não há disposição similar no processo civil, visto que sua intenção quanto a resguardar o direito do advogado aos seus honorários também encontra previsão no Código de Processo Civil, em seu art. 98, §3º, in verbis:

Art. 98. A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei.

[...]

  • 3º Vencido o beneficiário, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos 5 (cinco) anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário.

[...] (grifo nosso)

Assim, percebe-se duas diferenças: (1) o prazo para a execução das obrigações decorrentes da sucumbência é de 5 anos no processo civil e (2) não há trecho com sentido equivalente ao disposto no dispositivo celetista, qual seja: "desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa"

A primeira diferença observada, cabe dizer, deve ser considerada como devida, uma vez que reforça uma igualdade material, tendo em vista os pleitos tipicamente alimentares da justiça do trabalho e a condição de hipossuficiência de quem é, no geral, beneficiário da justiça gratuita.

A segunda diferença, no entanto, é onde reside violação à norma constitucional.

Isto por dois fundamentos: (1) incoerência quanto ao que seria materialmente adequado ao comparar os pleitos típicos do processo civil e os do processo do trabalho e (2) pela implicitude de que um direito é superior ao outro.

É possível observar que há incoerência na adição de tal trecho ao dispositivo celetista quando não há disposição que estabeleça ônus similar no processo civil.

Isto porque, como já afirmado anteriormente, os pleitos da justiça do trabalho têm tipicamente natureza alimentar, o que por sua vez, tem característica de serem essenciais para a manutenção de uma vida digna, assim como nesta especializada parte-se do pressuposto de hipossuficiência de uma das partes - qual seja o trabalhador, que também é a parte que tipicamente é beneficiária da justiça gratuita - o que não é verdade se tratando dos casos típicos e dos pressupostos do processo civil - o qual se considera a paridade e igualdade das partes como principal pressuposto.

 

Ora, estabelecer, para a justiça do trabalho, uma situação em que se revela possível que haja a execução imediata de obrigações sucumbenciais quando obtidas em outro processo, mesmo que o estado de pobreza do beneficiado não cesse, quando não há qualquer disposição impondo tal ônus ao beneficiado da justiça gratuita no âmbito do processo civil, é, em verdade, uma igualdade às avessas, uma vez que dá ao hipossuficiente, ainda mais hipossuficiência no âmbito do processo, ao tornar mais restritiva a gratuidade nesta especializada quanto comparado ao processo civil.

Desta forma, tal desigualdade da lei é absolutamente injustificada e arbitrária, sendo consequentemente inconstitucional.

Além disso, observa-se o tratamento desigual e injustificado da lei no que diz respeito aos créditos em questão.

Isto pois, como já anteriormente observado, têm natureza trabalhista tanto as verbas adquiridas em juízo pelo trabalhador beneficiado da justiça gratuita, quanto os honorários advocatícios devidos ao patrono processual por sucumbência da parte contrária.

Sobre esta igualdade, cita-se novamente o art. 85, §14º do CPC:

Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor. [...]

  • 14. Os honorários constituem direito do advogado e têm natureza alimentar, com os mesmos privilégios dos créditos oriundos da legislação do trabalho, sendo vedada a compensação em caso de sucumbência parcial.

[...]

No entanto, ao adicionar o trecho citado ao art. 791-A, §4º da CLT, e permitir a hipótese de execução contra o beneficiário da justiça gratuita mesmo quando adquiridos em juízo, ainda que em outro processo, e não tendo cessado sua condição de pobreza, é implicitamente posto em lei que honorários são mais devidos ao advogado do que créditos trabalhistas à parte beneficiária de gratuidade, vez que estabelece que aqueles créditos têm preferência aos obtidos no processo ainda que a parte beneficiária da gratuidade esteja em estado de miserabilidade, impondo, desta forma, uma hierarquia injustificável de pagamento de créditos. Desta forma, observada a violação ao art. 5º, caput da Constituição Federal, o trecho do dispositivo deve ser declarado inconstitucional.

  • - DA ALEGADA VIOLAÇÃO AO 5º, XXXV, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL

Assim dispõe o art. 5º, XXXV da CF:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito; Sem razão.

Nos termos do dispositivo constitucional mencionado, consagra a Constituição Federal a garantia de Amplo Acesso à Justiça, chamado também de Inafastabilidade da Jurisdição, ou de Princípio do Direito da Ação.

Em perspectiva tradicional, há a efetivação desta garantia constitucional de forma abstrata, pela possibilidade de ajuizar ação judicial, e desta ser apreciada, não podendo o juiz se escusar de julgá-la.

Consideram muitos autores modernos, no entanto, que esta garantia não se limita no peticionamento da exordial com o pedido de julgamento de mérito. O direito de ação, na

 

verdade, possui vários corolários, tal como o direito de participar adequadamente do processo, mediante a apresentação de alegações e de produção de provas em prazo razoável, e de influir sobre o convencimento do juiz, de forma que a ação somente é exercida através de procedimento adequado.

Ao analisar o art. 791-A, §4º da CLT, contudo, percebe-se - ao estabelecer que o dispositivo somente será aplicado ao beneficiado vencido após o trânsito em julgado - que este pressupõe a prévia apreciação do poder judiciário quanto a causa, mediante devido processo legal e consequente devido exercício do direito de ação, de forma que não há de se falar em inconstitucionalidade da lei quanto a este fundamento.

Sob o fundamento da inafastabilidade da jurisdição não há de se falar em inconstitucionalidade nem mesmo quanto ao trecho: "desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa", pois mesmo este pressupõe um processo em que houve apreciação e reconhecimento de valores devidos ao beneficiário da justiça gratuita.

Assim, não há de se falar de violação ao art. 5º, XXXV da Constituição federal pelo dispositivo legal.

IV - CONCLUSÃO

Nesta conformidade, opina o Ministério Público do Trabalho pelo conhecimento e provimento parcial do Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade, para declarar inconstitucional trecho do art. 791-A, §4º da CLT, qual seja: "desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa", por violar a Constituição Federal em seus arts. 1º, III e 5º, Caput e LXXIV.

É o Parecer.

Belém, 18 de dezembro de 2019. RITA MOITTA PINTO DA COSTA

Procuradora Regional do Trabalho

Destarte, enquanto o Supremo Tribunal Federal não julga em definitivo a ADIN que tem por objeto, dentre outros, a declaração de inconstitucionalidade do §4º, art. 791-A da CLT, inafastável a necessidade de submissão da questão ao Plenário desta Corte, nos termos previstos nos artigos 23, 103 e 180 do Regimento Interno, uma vez que aquela Suprema Corte Constitucional, em sede de Reclamações Constitucionais, tem cassado os efeitos das decisões proferidas por órgãos fracionários que afastam a incidência da norma celetista, por violação a Súmula Vinculante nº 10 (cláusula de reserva de plenário), como ocorreu nos autos da Reclamação 34.997/PARÁ.

Com estes fundamentos, voto pela inconstitucionalidade do parágrafo quarto do art. 791-A da CLT, incluído pela Lei nº 13.467/17, por violação aos princípios e garantias fundamentais consagrados no artigo 1º, III (princípio da dignidade da pessoa humana), artigo 5º, caput (princípio da igualdade), artigo 5º, XXXV (princípio de amplo acesso à jurisdição) e artigo 5º, LXXIV (garantia fundamental da assistência jurídica integral e gratuita) da Constituição Federal em vigor. Tudo conforme os fundamentos.

  • CONCLUSÃO ISTO POSTO,

ACORDAM OS MAGISTRADOS DO PLENO DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA OITAVA REGIÃO, À UNANIMIDADE, ADMITIR O INCIDENTE DE ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE; NO MÉRITO, SEM DIVERGÊNCIA, ACOLHÊ-LO PARA DECLARAR A INCONSTITUCIONALIDADE DO PARÁGRAFO QUARTO DO ART. 791-A DA CLT, INCLUÍDO PELA LEI Nº 13.467/17, POR VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS CONSAGRADOS NO ARTIGO 1º, III (PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA), ARTIGO 5º, CAPUT (PRINCÍPIO DA IGUALDADE), ARTIGO 5º, XXXV (PRINCÍPIO DE AMPLO ACESSO À JURISDIÇÃO) E ARTIGO 5º, LXXIV (GARANTIA FUNDAMENTAL DA ASSISTÊNCIA JURÍDICA INTEGRAL E GRATUITA) DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL EM VIGOR. TUDO CONFORME OS FUNDAMENTOS.

 

SALA DE SESSÕES DO PLENO DO EGRÉGIO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA OITAVA REGIÃO. BELÉM/PA, 10 DE FEVEREIRO DE 2020.

GABRIEL NAPOLEÃO VELLOSO FILHO

Desembargador do Trabalho Relator