A AJD - Associação Juízes para a Democracia, entidade de magistrados voltada à defesa dos direitos humanos e da democracia, apresenta NOTA PÚBLICA sobre os acontecimentos preocupantes envolvendo a desocupação de pessoas em séria condição de vulnerabilidade, no Estado de Rondônia.
O Acampamento Tiago Campin dos Santos, zona rural de Nova Mutum, Porto Velho, Rondônia, foi objeto de ação de reintegração de posse com pedido de liminar ajuizado pela Leme Empreendimentos e Participações Ltda, em face de cerca de oitocentas famílias que compõem o referido assentamento.
A reintegração executada pelas forças policiais tem se caracterizado pela violência extrema e em grave violação a ADPF n° 828, eis que não apresentadas alternativas de reassentamento digno das famílias removidas, conforme prevê a decisão do STF para as ocupações posteriores ao início da pandemia de Covid-19.
A reintegração de posse enseja um despejo forçado de milhares de pessoas, trabalhadoras e trabalhadores rurais de grupos sociais vulneráveis, gerando a destruição de moradias, êxodo rural forçado e culminando com a interrupção da mediação do Poder Público para alcance de uma solução definitiva.
Além do desrespeito à Medida Cautelar da ADPF, também não há observância dos requisitos legais do rito possessório, não há audiências de justificação prévia, não há planejamento ou preparação da reintegração.
As ameaças de reintegração se dão com potencial de graves violações de direitos humanos na quadra presente de crise sanitária mundial, em completa contrariedade ao decidido pelo Supremo Tribunal Federal, o que potencializa os seus efeitos nefastos e imprevisíveis.
Mesmo após a interrupção do comando de reintegração, a situação permanece tensa. A polícia permanece na área e segue retirando famílias. Cerca de 2 mil pessoas vulneráveis foram levadas para a uma vila próxima, sem qualquer assistência e lançadas dentro de uma pequena escola sem infraestrutura. Há centenas de crianças envolvidas, pessoas doentes com malária, num cenário grave e caótico.
O Estado de Rondônia, por sua segurança pública, não pode seguir o caminho da criminalizacao do movimento camponês e da luta pela terra, em atuação próxima e articulada com a pistolagem e latifundiários da região, fato este já denunciado pelo Ministério Público.
O Comando da Operação foi claro em dizer que não sairá do imóvel, que servirá como base para continuar a operação, estabelecendo limitações ao direito constitucional de ir e vir, realizando revistas e tirando foto dos documentos pessoais e de veículos. A barreira também tem o propósito de impedir que os já despejados retornem para o imóvel.
Importa garantir a segurança das famílias e o retorno delas à área que é terra pública e objeto de grilagem. O aparato policial deve deixar a a área e seu entorno – a Polícia estabeleceu bases de controle na região e, com exceção dos comandantes, seus integrantes atuam sem identificação - e cessar o ambiente de hostilidade contra os camponeses em justa luta pela terra e pela constitucional função social da propriedade.
Por todas essas razões, a AJD se solidariza com as famílias e a comunidade camponesa e roga às autoridades públicas que atuem decisivamente para a preservação dos direitos fundamentais, da incolumidade fisica, da dignidade e do direito ao trabalho dos cidadãs e cidadãos em Rondônia.