A Associação Juízes para a Democracia – AJD vem a público externar seu repúdio e indignação em face das declarações do Delegado de Polícia Civil, Rhudson Barcelos, emitidas em entrevista coletiva, realizada no dia 14/12/2021, à imprensa local da cidade Guanambi. O Delegado, que até então estava à frente das investigações de crimes de homicídio praticados em face de Alcione Malheiros, 42 anos e de sua filha, Ana Julia Teixeira, de 16 anos, afirmou: “não houve premeditação. Ele não tinha a intenção de praticar o estupro específico contra as vítimas. Foi uma questão de coincidência, quando ele saiu do trabalho, (...) se deparou com as duas, com aquelas roupas de malhação, de caminhada, obviamente chamando atenção. Ele disse que daí começou a ter desejo sexual e as seguiu.”
Repúdio às declarações do Delegado Rhudson Barcelos
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Sem entrar no mérito dos fatos e da investigação propriamente dita, a AJD vem manifestar seu repúdio e indignação em face das declarações de um agente público, integrante do sistema de justiça que, mais uma vez, naturaliza a brutalização e a pior forma de violência, que tira a vida de um ser humano, atribuindo a responsabilidade desses atos às próprias vítimas.
Trata-se de prática arcaica e discriminatória, em que a violência é aceita como forma de normalização do comportamento das mulheres, com base em padrões morais preconceituosos e ultrapassados.
Ao afirmar que o comportamento do investigado teria sido “provocado” pelas vestimentas das vítimas, o Delegado incorpora no discurso oficial a ideia de que a violência uma resposta válida, aceita socialmente, contra corpos femininos que ousam mostrar-se no espaço público. Cuida-se de antiga e ultrapassada crença de que os corpos femininos não pertencem às próprias mulheres, mas que são propriedade pública e, portanto, podem sofrer todo tipo de abuso e violência quando não se enquadrem nos parâmetros comportamentais ditados pela sociedade patriarcal.
Ao tempo em que manifesta seu repúdio, a AJD conclama à reflexão por mais um ato de violência institucional de gênero, em que agentes públicos sentem-se confortáveis em emitir juízos de valor e fundamentar suas atuações com base em visões de mundo inconstitucionais e contrárias aos parâmetros internacionais de direitos humanos das mulheres.