"Comentei com os amigos que a Associação Juízes para a Democracia estava ali"

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Bom dia,

Eu gostaria de agradecê-la imensamente, não somente a senhora, bem como a todos os seus colegas que estiveram presentes na manifestação, neste sábado, dia 5 de fevereiro, para junto com todos presentes pedir justiça por Moïse Kabagambe.

Sabe, é difícil falar sobre esperança, diante do desamparo, do medo, diante de tantas injustiças impostas...

Eu que já fui a muitas manifestações e pela primeira vez levei o meu sobrinho, desta vez, diferente do que eu gostaria, não tinha uma esperança que me tornasse capaz de dar uma palavra de consolo a ele.

Um pouco antes de encontrar a senhora e seus colegas, ele tinha acabado de me dizer: Tia, eu estou com uma vontade de chorar, tá difícil de segurar.

Nunca ouvi o meu sobrinho falar isso. Ele tem 19 anos, eu disse a ele que não precisava segurar, que tudo bem que ele chorasse.

Eu falei isso é desabei.

Particularmente acho que a desesperança em crianças e jovens é uma grande achatadora de horizontes, o que é por si só demasiadamente ruidoso, posto que estão na fase de edificação destes mesmo horizontes.

A luta pela humanização dos povos originários e dos descendentes daqueles que foram sequestrados e trazidos da África até aqui é demasiadamente longa, e as transformações são lentas, o que acaba por tornar a luta ainda mais difícil. Há o medo de não estar aqui para ver transformações significativas. O medo constante dos meus sobrinhos serem alvo. O medo que mais um seja...

 

"Era próximo do meio-dia, quando os vi ali,

debaixo do mesmo sol que nós"

 

O sol estava bastante quente, o suor ardia os olhos, num momento que o clamor por justiça já não tinha voz que alcançasse.

Era próximo do meio-dia, quando os vi ali, debaixo do mesmo sol que nós.

A presença não em uma nota de repúdio, formal, distante...

As presenças foram físicas, reais, verdadeiras.

O poder simbólico da presença organizada, com uma faixa foi muito impactante.

Ver membros da Justiça, irmanados ao nosso clamor, caminhando discretamente, com igualdade foi emocionante.

Não poderia agradecer o suficiente, ou encontrar uma forma de retribuir por estarem ali, por se importarem. O que me emocionou ainda mais, só que dessa vez, com esperança.

Muito obrigada por renovarem as minhas esperanças.

 

"Saber que já existem juízes que nos olham

sem a presunção da culpa pela nossa cor

é um fio de esperança"

 

Comentei com amigos que a Associação Juízes pela Democracia estava ali. Todos ficaram tão surpresos e esperançosos.

Muito obrigada mesmo. Tenho certeza que muitos, assim como eu, ficaram mais esperançosos ao vê-los ali. 

Saber que já existem juízes que nos olham sem a presunção da culpa pela nossa cor é um fio de esperança.

Mudou o meu estado de humor desde então.

Benditos sejam todos vocês, é preciso muita valentia para dentro de sistemas que resistem por séculos, tomar a atitude da manutenção necessária das estruturas da nossa tão sonhada democracia.

Tenho esperança que sirvam de exemplo para que mais magistrados se unam aos senhores e que essa associação ganhe mais força.

Eu quero agradecer o abraço também. Às vezes um abraço é como unguento para a alma.

Obrigada por deixar o seu contato conosco, por se colocar à disposição, muito obrigada, muito obrigada, muito obrigada.

 

Kenia Ferreira em mensagem para Cristiana Cordeiro, presidenta da AJD, após encontrar a Associação no Ato Justiça para Moïse