AJD participa de evento da UFSC que reúne especialistas para debater o direito de abortar

Durante os dias 12 e 13 de julho, a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), reuniu especialistas do Brasil, Argentina e Estados Unidos para discutir aspectos do aborto como direito sexual e reprodutivo das mulheres. A Associação Juízes para a Democracia (AJD) esteve presente ao evento, representada pela Conselheira Claudia Maria Dadico, que falou sobre a inconstitucionalidade e inconvencionalidade – que contraria Tratados de Direitos Humanos – dos dispositivos do Código Penal que criminalizam o aborto e suas repercussões sociais negativas, como por exemplo, os obstáculos ao exercício ao direito ao aborto nos casos em que a lei não o proíbe.

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O Estado de Santa Catarina tem sido palco de intensos debates sobre o aborto legal em razão da recente publicação, pelo The Intercept Brasil e Portal Catarinas, de uma audiência em que uma menina de 11 anos de idade, vítima de estupro, foi constrangida a não realizar o procedimento de aborto a que tinha direito.

No dia 28 de junho, a deputada estadual Ana Caroline Campagnolo (PL) – conhecida por dar cursos de como ser “antifeminista” e demonstrar paixão por armas em suas redes sociais –, após recolher 14 assinaturas de parlamentares favoráveis, apresentou na Assembleia Legislativa de Santa Catarina o pedido da chamada “CPI do Aborto”. Sua iniciativa teve objetivo de solicitar a investigação da conduta da equipe médica que realizou o procedimento, assim como perquirir a família da menina vítima da violência, a advogada da família e os jornalistas que relataram como uma juíza e promotora manteve uma criança de 11 anos longe da mãe para que ela não acessasse seu direito de abortar.

A deputada do partido de Bolsonaro (PL) também apresentou na plenária slides que demonstravam um passo a passo do caso, se referindo ao direito de abortar como “assassinato”, e afirmando que a vítima realizou “o parto de um cadáver”.

A justificativa da abertura da CPI se baseou na intenção de investigar o vazamento das informações sobre o caso, que seguia em segredo de justiça. No entanto, o material produzido pelo Portal Catarinas e The Intercept não identifica os envolvidos, garantindo o sigilo acerca da vítima e sua família. As organizações também lembraram que o sigilo existe para proteger os relacionados, e não “magistrados que agem com base em suas convicções ideológicas”. Tratando da CPI, não há crime a ser investigado pois a interrupção da gravidez em caso de estupro é um direito garantido há mais de 80 anos, e que, inclusive, deve ser oferecido pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

No dia 06 de julho, a promotora de Justiça Mirela Dutra Alberton, responsável por se opor ao aborto legal da criança, deu início a uma investigação para determinar a “causa que levou à morte do feto”, pedindo pela realização de uma “autópsia” após o procedimento realizado no dia 23 de junho. De acordo com a lei, não existe crime sondado, pois como a criança é menor de 14 anos, a situação se caracteriza como estupro de vulnerável.

A conduta da promotora já estava sendo apurada pelo Conselho Nacional do Ministério Público (MP), que instaurou procedimento para investigar a postura de Mirela Dutra em relação a menina vítima de estupro, que descobriu a gestação após 22 semanas de gravidez e foi coagida a “aguentar um pouquinho mais”.

Na quarta-feira, dia 13 de julho, a Comissão de Direitos da Mulher da Câmara dos Deputados deve votar requerimento de moção de aplauso e reconhecimento em homenagem à juíza Joana Ribeiro Zimmer e a promotora Mirela Dutra, ambas responsáveis por induzir a criança a desistir do aborto.  O requerimento é assinado pelos deputados Chris Tonietto (PL-RJ) e Diego Garcia (Republicanos-PR), que colocam as duas mulheres que tentaram limitar o acesso ao direito da vulnerável como “corajosas defensoras do direito à vida desde a concepção”.

A reação de setores conservadores da sociedade catarinense se insere num contexto de multiplicação de graves violações aos direitos da mulheres e seus corpos em escala nacional, tais como o flagrante do médico anestesista que praticava estupro em mulheres na sala de parto; o caso da Procuradora do Município de Registro que foi barbaramente espancada em seu local de trabalho por outro Procurador e a denúncias de assédio sexual imputadas ao Presidente da Caixa Econômica Federal contra funcionária da instituição.

A íntegra do evento realizado na Universidade Federal de Santa Catarina será disponibilizada em breve no canal do YouTube do IEG - Instituto de Estudos de Gênero da UFSC. Acesse as mesas de debate!

Aborto como direito sexual e reprodutivo - Direito: https://youtu.be/xmNXYBNLkcw
Aborto como direito sexual e reprodutivo: Saúde: https://youtu.be/SIkpt0k0-24