POVO INDÍGENA XUKURU DO ORORUBÁ: CARTA DA XXIII ASSEMBLEIA – 2023
LIMOLAYGO TOYPE: MANDARU PREPARANDO MENTES PARA ESPALHAR SEMENTES
Inspirados e fortalecidos pelo Rei do Ororubá, nós, Povo Indígena Xukuru do Ororubá, realizamos a vigésima terceira (23ª) Assembleia Anual, no período de 17 a 20 de maio, com a proteção do Pai Tupã, da Mãe Tamain e da Força do Encantamento. Estando no Terreiro Sagrado da Pedra D’água, onde iniciamos a luta pela reconquista do Território, com os pés no chão e no ritmo do Jupago, iniciamos o Ritual Sagrado com a Pajelança de abertura na presença da Ancestralidade, junto aos Pajés, ao Cacique, ao Conselho de Lideranças e demais Instâncias de Organizações Sociopolíticas. Em defesa do Solo Sagrado, somos transmissores da Força Encantada uma vez que, os que fizeram a passagem de vida renasceram em nós e renascerão nos Opipes, quando os seus sangues voltam às nossas veias. Nossas vozes, ecoando nas matas do Mestre Rei do Ororubá, afirmam “Eu Sou Xikão!”, matas que têm Ciência e onde plantamos mudas, em preservação, onde repousa plantado nosso Mandaru, que nunca deixou os seus guerreiros, que seguem instigados pelo tema desta 23ª edição: “Limolaygo Toype: Mandaru Preparando Mentes Para Espalhar Sementes".
Estiveram presentes os Povos Indígenas Truká, Pankararu, Fulni-ô, Tapuia, Pataxó, Pataxó Hã-Hã-Hãe, Xukuru-Kariri, Guajajara, Xokó, Katukina, Kaingang, Potiguara, Guarani Kaiowá, Isú-Kariri, Kariri de Poço Dantas, Pankará, Kambiwá, Kapinawá e Kariri da Chapada do Araripe; as Instituições e Organizações IFPE Campus Pesqueira, Diocese de Pesqueira, Residentes de Medicina, Família e Comunidade, CIMI, Conselho Tutelar de Pesqueira, Câmara Municipal de Pesqueira “Casa Anísio Galvão”, UNICAMP, Licenciatura Intercultural da UFPE, Igreja Anglicana do Brasil, Afoxé Alafin Oyó, PSOL, Igreja Batista Coqueiral, Movimento Nós na Criação, Comunidade Bremen, Secretários do Município de Pesqueira, CONAFER, Associação Juízes para a Democracia, Residência de Saúde Coletiva com enfoque em Agroecologia da UPE Campus Garanhuns, Associação Jardim – Cannabis Medicina, UFPB, Bacural Ponto de Cultura, Santuário dos Jatobás – Pombos-PE, Nova Cartografia (Vânia Fialho), SIMPERE/Recife, UFRN, Povos e Comunidades Tradicionais do Rio Grande do Norte, UFCA, UFERSA, Coletivo Mandacaru Cia das Artes, IPJ, Associações Italianas “Popoli in Arte” e “Piccolo Mondo”, Coque (R)existe Coletivo, Centro de Capoeira Luz di Angola, Coquevídeo, FIOCRUZ-PE, Grupo de Pesquisa Diversidade e Saúde, Escola Nacional de Saúde Pública, Centro Acadêmico de Vitória – UFPE, Curso de Psicologia da Faculdade de Belo Jardim / AEB Autarquia de Ensino, Coletivo Elas Q Fazem (Olinda), Clube de Alegoria e Crítica: O Homem da Meia Noite, Pró-Reitoria de Extensão, Cultura e Cidadania da Universidade Rural (Pró-Reitor Moisés de Melo Santana), Teia dos Povos em Pernambuco, Programa de Pós-Graduação em Educação, Culturas e Identidade (UFPE/FUNDAJ), Sindicato dos Docentes das Universidades Federais do Estado do Ceará (ADUFC), Universidade Federal de Brejo Santo, Escola Joanita de Melo (Ouro Branco – MG), Escola Livre de Ancestralidades Kariris, Aldeias de Ponto de Cultura, Centro Regional de Formação, Educação e Cultura Popular – CREFEP (Itambé-PE), Movimento das Comunidades Populares – MCP, FOJUPE, Sindicato dos Trabalhadores Agricultores de Vitória de Santo Antão – PE, Núcleo Terapêutico Cromossomos – MG, EJA Campo (GRE SMI – Arcoverde), Deputada Estadual Rosa Amorim – MST, IPA e Coletivo Voz do Quilombo – Ceará Mirim RN.
Quando celebramos a memória dos 25 anos que o Cacique Xikão está plantado e que sua matéria repousa na Natureza Sagrada, onde seu sangue tendo voltado às nossas veias nos fortalece, Mandaru vem preparando as mentes dos guerreiros e das guerreiras no nosso Território Sagrado e para além das suas fronteiras demarcadas, para que sigamos espalhando sementes da luta, da justiça, do direito e da paz, sementes do conhecimento ancestral fincados nas raízes.
Em Assembleia, ao recebermos a Ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, a Deputada Federal, Célia Xakriabá, a Presidenta da FUNAI – Fundação Nacional dos Povos Indígenas, Joênia Wapixana, do Ministério de Estado da Cultura, Marina Braga e Naíne Terena, o Secretário Especial de Saúde Indígena do Ministério da Saúde, Weber Tapeba, discutimos o protagonismo indígena na organização política a partir da força do maracá, como símbolo de luta e fortalecimento trazendo o respeito à Ciência do povo, impedindo retrocessos como é o caso do PL 191 e do PL 490. Continuamos avançando em defesa do respeito, da demarcação e da relevância do papel indígena na preservação do planeta e, consequentemente, da sociedade, afirmando: “Nunca mais um Brasil sem Nós”, uma vez que decolonizar as mentes é preciso para assegurar a (re)existência dos povos originários pensando em políticas públicas que visem um projeto de vida com o jeito de ser indígena, discussões para além dos três dias de assembleia e que necessitam ser postas em prática no cotidiano. Tal efetivação parte do fortalecimento da juventude pela valorização da identidade e história Xukuru do Ororubá orientada sempre pelos ensinamentos dos nossos Toypes a partir daquilo que o Conselho de Lideranças e as Instâncias de Organizações Sociopolíticas trazem como legado na tradição alicerçada na Natureza Sagrada e nos Encantos de Luz, onde, em contato com e no manejo adequado da Mãe Terra, atuamos em sua preservação. Ainda, em lutas contra o preconceito de gêneros e em mediação de conflitos, seja da realidade LGBTQIAP+ indígena, seja da realidade das mulheres, defendemos o empoderamento destas enquanto mães e propagadoras da educação e da força espiritual, sendo todos lideranças protagonistas da luta valorizando e respeitando a Ancestralidade e a Cultura.
É preparando as mentes nos espaços de debates que planejamos o Bem Viver rompendo com a visão apontada pelo sistema capitalista refletindo sobre regeneração, cuidado e zelo com a Natureza Sagrada e seus elementos e seres, morada dos Encantos de Luz, para que tenhamos de forma coletiva um processo de convivência saudável e harmoniosa, tornando-nos “ser mentes”. Preocupamo-nos com as nascentes as quais são fontes de vida, sangue da terra, cujo consumo desenfreado e a poluição dos mananciais ferem a vida, e defendemos o seu uso coletivo e não individual, para que o solo continue fértil e acolha aos que virão e as famílias que serão constituídas, combatendo o desmatamento e os incêndios, manejando adequadamente e recuperando as áreas degradadas fazendo uma reeducação ambiental. Entendendo que a gestão territorial e a sua construção se dá por meio da coletividade, seguimos discutindo, construindo e avaliando para que o nosso Modelo de Organização transborde a Serra do Ororubá, e ressaltamos que a Terra é inalienável, não se compra e não se vende, é um bem comum que deve ser cuidado.
Discutindo a Gestão Territorial Xukuru do Ororubá e ouvindo de forma representativa e democrática, afirmamos que nossas Instâncias de Organizações Sociopolíticas são representatividades das vozes das aldeias, dando vida ao modelo de gestão, abraçando, confiando e executando as ações específicas às realidades locais para continuarmos melhorando a qualidade de vida do nosso povo, fortalecendo e vivenciando os saberes ancestrais, valorizando a cultura e a interculturalidade pelo autocuidado e pela corresponsabilidade, pensando as alternativas de intervenções e as estratégias que fomentem a autonomia à luz dos direitos e deveres numa comunicação amorosa.
Gerenciar o Território Xukuru do Ororubá é decolonizar as mentes ao tempo em que estamos preparando-as, espalhando sementes na construção e prática do nosso projeto de vida, indigenizando o planeta. Com o processo de invasão, mudaram o nosso modo de vida, colonizando, catequizando, dizimando e matando os Seres da Natureza Sagrada. Entendemos que as escolas têm o papel de ressignificação, de racionalização, de trazer a racionalidade e a dedecolonialidade do saber indígena, desconstruindo os elementos que descaracterizam a identidade indígena a partir de formações que atendam às especificidades. Ao tempo em que, na atualidade, a colonização segue velada através do garimpo e do desmatamento que continuam ferindo e matando toda forma de vida. É pela pedagogia que temos, que semeamos e reflorestamos as mentes, numa luta epistêmica, e que o processo decolonial Xukuru do Ororubá começa da Espiritualidade, unindo e ressignificando os saberes e assim produzindo os nossos próprios à luz do Encantamento, levando-os ao conhecimento do outro e ajudando-os a repensar suas práticas, seus jeitos de fazer em perspectivas.
Levantamos as nossas vozes e contamos as nossas histórias, nós não seremos vencidos. Seguimos no enfrentamento ao Marco Temporal, ao agronegócio, ao garimpo, ao desmatamento, junto com outros povos e lutas, construindo um Estado pluriétnico e multicultural. Nossas sementes foram lançadas e fecundadas, e é um processo contínuo da nossa missão. Os passarinhos seguem espalhando sementes da Serra do Ororubá e reflorestando mentes, porque o Brasil é Território Indígena e Nunca Mais um Brasil Sem Nós.
Aldeia Pedra D’água – TI Xukuru do Ororubá, 20 de maio de 2023.
– Diga ao Povo que Avance!
– Avançaremos!