Relatório sobre Mulheres Encarceradas

Centro pela Justiça e pelo Direito Internacional, CEJIL.
Associação Juízes para a Democracia, AJD.
Instituto Terra, Trabalho e Cidadania, ITCC.
Pastoral Carcerária Nacional.
Instituto de Defesa do Direito de Defesa, IDDD.
Centro Dandara de Promotoras Legais Popular.
Associação Brasileira de Defesa da Mulher, da Infância e da Juventude. ASBRAD.
Comissão Teotônio Vilela, CTV.
Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, IBCCRIM.

Apoio
Comitê Latino- Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher CLADEM.
Programa para a América Latina da International Women’s Health Coalition.



Apresentação

O presente Relatório é resultado de uma iniciativa impulsionada pelo Centro Pela Justiça e pelo Direito Internacional (CEJIL) e pelas entidades que constituem o Grupo de Estudos e Trabalho Mulheres Encarceradas, quais sejam, Associação Juízes para a Democracia (AJD), Instituto Terra, Trabalho e Cidadania (ITTC), Pastoral Carcerária Nacional, Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD), Centro Dandara de Promotoras Legais Populares, Associação Brasileira de Defesa da Mulher, da Infância e da Juventude (ASBRAD), Comissão Teotônio Vilela e Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM).
Entre os objetivos que o presente relatório pretende alcançar destacamos a apresentação para a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da situação nacional das mulheres encarceradas no Brasil, que inclui contribuição de sugestões para a Declaração de Princípios sobre a Proteção das Pessoas Privadas de Liberdade a partir das violações encontradas.
Para sua finalização recebeu apoio técnico do Comitê Latino- Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher (CLADEM) e apoio financeiro , do Programa para a América Latina da International Women’s Health Coalition, para facilitar o comparecimento de representante do Grupo de Estudos das Mulheres Encarceradas à Audiência Temática do 127º Período ordinário de Sessões da Comissão Interamericana de Direitos Humanos.
A elaboração deste relatório não só contou com a contribuição das organizações acima citadas como também de pessoas que individualmente, foram determinantes para que o relatório tenha se efetivado. Entre estas pessoas queremos agradecer e mencionar especialmente a Fernanda Matsuda e o trabalho realizado por Fernanda Ferreira Pradal e Letícia da Costa Paes, estagiárias voluntárias do escritório do CEJIL/Brasil – cujo esforço e qualificação permitiram concretizar este relatório. Finalmente queremos agradecer o apoio de Rita de Cássia Nunes.






Metodologia

Foram utilizados dados de acesso público e foram tecidas considerações sobre as diferentes realidades no sistema carcerário nas diversas regiões do país. São raras as informações com relação à situação das mulheres encarceradas de todos os estados brasileiros. A Pastoral Carcerária, por meio de um questionário enviado a várias unidades prisionais dos estados, buscou colher informações acerca das temáticas relacionadas às condições de habitabilidade das unidades prisionais femininas (mistas – quando o espaço é compartilhado com os homens – ou não), ao atendimento à saúde (equipe médica, medicamento, atendimentos especializados, fornecimento de produtos de higiene etc.), à amamentação e ao tempo de permanência da criança recém-nascida com a mãe, bem como à existência ou não de espaços adequados para as crianças como berçários, e, ainda, quanto à permissão de visita íntima e, em caso positivo, quais são os critérios, e quanto ao acesso das presas ao telefone público e às atividades escolares e de trabalho.
Dos 27 estados da federação, apenas 19 apresentaram algum retorno, com resposta aos questionários e fornecimento de dados específicos da mulher encarcerada a partir de uma ou mais unidades prisionais. Esses dados possibilitam uma visualização das condições carcerárias em que se encontram as mulheres presas.



Introdução

Os graves problemas que caracterizam o sistema penitenciário brasileiro – e que têm se intensificado, ao longo das últimas décadas, em função da escalada nas taxas de encarceramento – encontram sua gênese nas inúmeras carências e deficiências estruturais que acompanham a história do país. Referem-se, assim, à precariedade das condições físicas oferecidas nas cadeias e presídios, ao déficit de vagas, à absoluta insalubridade nas unidades de aprisionamento, comumente caracterizadas como “depósitos de seres humanos” , ao lado da prevalência de uma cultura de intensa violência institucional que, para além de utilizar amplamente práticas como a tortura, está fortemente representada em trágicos episódios, os quais consistem em verdadeiras práticas de extermínio da população encarcerada, consistindo o Massacre do Carandiru em caso exemplar de desrespeito. Mais recentemente, o sistema penitenciário brasileiro tem se visto imerso numa crise mais acentuada de legitimidade em razão da formação e atuação das organizações criminosas dentro dos presídios, o que tem levado a um acirramento ainda maior das políticas de contenção por parte do aparelho repressivo, sobretudo dentro das prisões, agravando a violência institucional, e à supressão de direitos e garantias dos indivíduos presos.
No caso do encarceramento feminino, há uma histórica omissão dos poderes públicos, manifesta na completa ausência de quaisquer políticas públicas que considerem a mulher encarcerada como sujeito de direitos inerentes à sua condição de pessoa humana e, muito particularmente, às suas especificidades advindas das questões de gênero. Isso porque, como se verá no curso deste relatório, há toda uma ordem de direitos das mulheres presas que são violados de modo acentuado pelo Estado brasileiro, que vão desde a desatenção a direitos essenciais como à saúde e, em última análise, à vida, até aqueles implicados numa política de reintegração social, como a educação, o trabalho e a preservação de vínculos e relações familiares.
É certo, no entanto, que as circunstâncias de confinamento das mulheres presas e a responsabilidade do Estado pela sua custódia direta demandam do poder público uma ação ainda mais pró-ativa e um tratamento de fato especializado, com o fim de garantir às mulheres encarceradas o acesso e gozo dos direitos que lhe são assegurados pela normativa nacional e internacional.
A propósito, nesse sentido, a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher – Convenção de Belém do Pará (1994, OEA) – já reconheceu expressamente a condição específica de vulnerabilidade a que estão submetidas as mulheres privadas de liberdade e determinou a conseqüente especial atenção e consideração que os Estados devem dar a essa situação, o que infelizmente, como veremos, não está sendo observado pelo Estado brasileiro .
As mulheres encarceradas apenas deveriam sofrer limitações ao seu direito de ir e vir, mas o descaso, a negligência e omissão do Estado no cumprimento de seus deveres dissemina violações de todos os demais direitos das presas que não deveriam ser afetados. O Estado, que deveria nesse universo específico construir espaços produtivos, saudáveis, de recuperação e resgate de auto-estima e de cidadania para as mulheres, só tem feito ecoar a discriminação e a violência de gênero presentes na sociedade para dentro dos presídios femininos.
A condição de encarceramento para as mulheres, como restará demonstrado nesse relatório, tem implicações diferenciadas daquela vivida pelos homens, e para além da falta do Estado em atender às condições gerais comuns a toda a população carcerária, é de extrema preocupação a situação que se arrasta devido à falta de uma política pública de gênero para as mulheres encarceradas.
Representando menos de 5% da população presa, a mulher encarcerada no Brasil é submetida a uma condição de invisibilidade, condição essa que, ao mesmo tempo em que é sintomática, “legitima” e intensifica as marcas da desigualdade de gênero à qual as mulheres em geral são submetidas na sociedade brasileira, sobretudo aquelas que, por seu perfil socioeconômico, se encontram na base da pirâmide social, como é o caso das encarceradas . Quando se toma como análise o campo da formulação das políticas penitenciárias propriamente ditas, é certo que, não obstante sua precariedade – se voltam apenas a propostas de expansão física do sistema – contemplam unicamente os homens, não alcançando a medida mais primária que se refere à dotação de vagas e à construção de estabelecimentos carcerários femininos. As violações contra os mais diversos direitos das mulheres encarceradas, que são cotidianamente promovidas pelo Estado brasileiro, afrontam não apenas as recomendações, tratados e convenções internacionais (como as Regras Mínimas para o Tratamento de Reclusos), mas a própria normativa nacional que, a partir de estatutos legais e da própria Constituição Federal, reconheceu um extenso rol de direitos e garantias às pessoas privadas de liberdade no país.
Desse modo, diferentemente de outras nações da América Latina, no Brasil há um conjunto de leis – das quais a mais destacada é a Lei de Execução Penal (Lei nº 7.210 de 1984), a primeira a consolidar a matéria no país –, de conteúdo amplamente garantista e responsável pela consagração de um extenso rol de direitos e consoantes com as principais recomendações internacionais na área.
Referido estatuto legal, promulgado num período de restabelecimento democrático no país, assim como o texto da Constituição Federal da República, que seria promulgada quatro anos depois, são taxativos na atribuição de direitos aos presos, não se restringindo a uma mera previsão regulamentadora acerca da dinâmica prisional, uma vez que trazem o cumprimento da pena para os marcos do devido processo legal, atribuindo ao preso uma condição emancipatória de sujeito postulante ou sujeito de direito dentro do cárcere, sobretudo pela idéia de jurisdicionalidade.
A Lei de Execuções Penais, ao dispor sobre os direitos – saúde, educação, assistência social, exercício do trabalho e de atividades intelectuais, no caso das mulheres em gestação, reclusão em estabelecimento compatível, direito à amamentação , entre outros (arts. 41, 83 e 89 da LEP) – dispôs também sobre a obrigação do Estado em oferecer condições materiais à execução desses direitos. Mas foi ao estabelecer o direito à jurisdição ao preso, inserindo a atuação do sistema de justiça em toda a dinâmica prisional, que a legislação nacional estendeu com mais nitidez os princípios democráticos ao cárcere, posição essa que ainda hoje é assumida por poucas nações no mundo.
Não obstante, as violações não foram erradicadas ou sequer mitigadas com a edição dessa normativa, que já completa vinte e dois anos e celebra sua contínua inaplicabilidade e ineficácia. Para que se compreendam as razões desse permanente descumprimento das disposições legais por parte, em especial, das instituições responsáveis justamente por sua aplicação, deve-se ter em conta a cultura predominante no país de desrespeito à estrutura legal vigente, sobretudo quando ela se refere à atribuição de direitos a segmentos populacionais menos favorecidos. Esse fato não deixa de representar uma contundente negativa do Estado brasileiro em reconhecer os direitos civis dessas populações, num fenômeno característico da organização social e política brasileira a que a antropóloga Teresa Caldeira denomina democracia disjuntiva.
Se no âmbito da estrutura legal vigente encontram-se as principais disposições garantidoras de direitos dos presos e atinentes às obrigações do Estado e, ainda assim, as permanentes violações ocorrem na esteira dessa tradição de desrespeito aos estatutos legais pelas instituições públicas, pretende-se, com essa exposição, além de denunciar a dramática situação a que as mulheres encarceradas são submetidas no Brasil, instar o Estado brasileiro a criar as condições de aplicabilidade do ordenamento vigente e responsabilizá-lo por sua ineficácia e pelas violações por ele promovidas.

I. DADOS DAS UNIDADES PRISIONAIS FEMININAS NO BRASIL (Cadeias Públicas ou Delegacias e Penitenciárias)

A condução de políticas públicas de qualidade exige o conhecimento da situação enfrentada pelo público-alvo da ação governamental. Contudo, tradicionalmente não há um constante acompanhamento da situação da população encarcerada no Brasil, o que impossibilita, muitas vezes, o diagnóstico dos problemas a serem combatidos e, ainda, quais são as estratégias de intervenção mais adequadas. Os resultados do último Censo Penitenciário Nacional datam de 1997, ou seja, as informações detalhadas sobre o perfil da população prisional, que são essenciais para nortear a construção de políticas públicas na área, estão bastante defasadas. Dados mais recentes foram produzidos por iniciativas isoladas, como é o caso do estado de São Paulo, que não bastam para desvendar a magnitude e a complexidade da questão prisional.
Se em relação aos homens presos, que correspondem à imensa maioria da população encarcerada no Brasil, há uma deficiência significativa na produção de dados – que se têm restringido ao número de presos –, no que tange à situação das mulheres, a invisibilidade a que estão relegadas parece contribuir para que o Estado atue de maneira ainda mais acintosa. Em meio à população marginalizada que lota as prisões brasileiras, as mulheres são praticamente desprezadas pelas ações do Estado, que até a presente data sequer tem se preocupado com o levantamento de dados sobre elas, tarefa que muitas vezes fica a cargo de pesquisas acadêmicas e de trabalhos de associações da sociedade civil.
Segundo o Terceiro Relatório Nacional de Direitos Humanos , de 2002 para 2005, a taxa de encarceramento no país aumentou de 178,3 presos por 100 mil habitantes para 198,3 (um aumento de 9,2%), sendo registrados aumentos de 33,9% na região Norte, de 29,8% no Centro-Oeste, de 24,8% no Sul e de 23,1% no Nordeste. No Sudeste, no mesmo período, houve uma redução de 5,4% da taxa de encarceramento, apesar de aumentos de 21,7% no Espírito Santo e de 22,0% no Rio de Janeiro. São Paulo e Minas Gerais registram reduções na taxa de presos por 100 mil habitantes, de 3,3% e 60,3% respectivamente – mas Minas Gerais deixou de informar o número de presos sob custódia da polícia em 2005.

Abaixo, tem-se a evolução de mulheres no sistema prisional.







PERCENTUAL DE MULHERES ENCARCERADAS NO SISTEMA PRISIONAL
BRASIL – 2000 A 2006

ANO Mulheres Total população %
2000 5601 174980 3,20
2001 5687 171366 3,32
2002 5897 181019 3,26
2003 9863 240203 4,11
2004 16473 262710 6,27
2005 12469 289046 4,31
2006 14058 308786 4,55

A partir dos dados do DEPEN de 2000 e 2006, foi possível calcular a taxa do aumento da população carcerária total, homens e mulheres, em todo o país. Percebe-se que a taxa do aumento de encarceramento de mulheres de 2000 a 2006 foi de 135,37%, bem maior do que as dos homens, que foi de 53,36%.

AUMENTO DA POPULAÇÃO PRISIONAL
BRASIL 2000 E 2006

População Sistema Prisional População Total Taxas presos/100.000 hab. Aumento (%)
2000 2006 2000 2006 2000 2006
Mulheres 5601 14058 86.223.155 91.946.392 6,50 15,29 135,37
Homens 169379 294728 83.576.015 94.824.221 202,66 310,82 53,36
Total 174980 308786 169.799.170 186.770.613 103,05 165,33 60,43


Com relação às vagas no sistema prisional para homens e para as mulheres, os dados do DEPEN acerca dos anos de 2003 e 2004 não trazem o número de vagas existentes no sistema prisional para homens e para as mulheres, inviabilizando a realização do cálculo.

VAGAS NO SISTEMA PRISIONAL

Sistema Prisional - Brasil
2000 a 2006
ANO Homens V Vagas Deficit Mulheres Vagas Deficit Total população Total
Vagas Total
Deficit
2000 169379 130365 39014 5601 5345 256 174980 135710 39270
2001 165679 135734 29945 5687 5563 124 171366 141297 30069
2002 175122 151370 23752 5897 5062 835 181019 156432 24587
2005 276577 198723 77854 12469 7836 4633 289046 206559 82487
2006 294728 180969 113759 14058 9825 4233 308786 190794 117992


Percebe-se que é muito baixa a oferta de vagas para as mulheres no sistema prisional em todo o país, entre os anos de 2000 e 2006.

PORCENTAGEM DE VAGAS NO SISTEMA PRISIONAL PARA AS MULHERES

NO Vagas Total Vagas (%) vagas para as mulheres
2000 5345 135710 3,94
2001 5563 141297 3,94
2002 5062 156432 3,24
2005 7836 206559 3,79
2006 9825 190794 5,15


Com relação às mulheres que se encontram presas no sistema policial, tem-se um aumento significativo de 2000 para 2006, já que em 2000 as mulheres representavam 7,81% de presos no sistema policial, e em 2006 elas representaram 11,05% da população encarcerada nesse sistema.

PORCENTAGEM DE MULHERES PRESAS NO SISTEMA POLICIAL
2000 E 2006

ANO MULHER TOTAL %

2000 4511 57775 7,81
2006 6434 58215 11,05


De 2000 a 2006, houve um aumento de 33,75% do número de mulheres presas no sistema de polícia em todo o país, conforme os dados da tabela abaixo, a partir dos dados do Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN) de 2000 e 2006.
Apesar de representarem um percentual bastante pequeno da população carcerária do Brasil – e, portanto, com maior viabilidade de gozarem de condições adequadas –, 29% das mulheres estão cumprindo pena em local inapropriado, enquanto 14% dos homens estão nessa mesma condição , denotando a desigualdade de tratamento entre homens e mulheres.













Mulheres no Sistema Penitenciário e no Sistema Policial – Brasil – 2005 e 2006
Regiões/Estados

2005

2006
Sistema Penitenciário Policia Sistema Penitenciário Policia
Região Norte 909 6 922 16
Acre 110 92
Amapá 66 54
Amazonas 230 211
Pará 54 240
Rondônia 333 6 207 16
Roraima 70 70
Tocantins 46 48
Região Nordeste 2048 223 2149 261
Alagoas 111 13 68 23
Bahia 346 280
Ceará 390 431
Maranhão 83 96 96 96
Paraíba 227 290
Pernambuco 641 657
Piauí 56 67
Rio Grande do Norte 108 114 176 142
Sergipe 86 84
Região Centro-Oeste 2003 132 2139 135
Distrito Federal 340 373
Goiás 256 132 276 135
Mato Grosso 460 405
Mato Grosso do Sul 947 1085
Região Sudeste 5683 5830 7023 5228
Espírito Santo 411 37 460 50
Minas Gerais 271 779 1105 497
Rio de Janeiro 1098 109 1099 89
São Paulo 3903 4905 4359 4592
Região Sul 2148 2148 3599 625
Paraná 568 601 1905 602
Rio Grande do Sul 944 0 1046
Santa Catarina 636 23 648 23
Total 12791 13299 15833 6330
Fonte: MJ/SNJ/Departamento Penitenciário Nacional (dados dezembro 2005 e novembro 2006).


Conforme a tabela acima, na maioria dos estados ocorreu um aumento significativo do número de mulheres encarceradas, tanto no sistema penitenciário quanto no sistema policial. Entretanto, é importante mais uma vez ressaltar a fragilidade dos dados, visto que nem todos os estados apresentaram os dados reais acerca do número de mulheres presas no sistema de segurança pública, delegacias de polícia e cadeias públicas. Outro dado complementar que qualifica esses dados que, embora não seja possível verificá-lo visualmente nessa tabela, há que ser levado em conta para conhecer essa realidade, se refere à quantidade de mulheres encarceradas em cadeias públicas e delegacias. Esse dado não é informado pelo DEPEN. A região Norte apresentou, em 2005, cerca de 909 presas no sistema penitenciário e esse número foi elevado para 922 mulheres presas em 2006. O estado do Pará foi o que apresentou um grande aumento da população feminina nesse sistema, de 54 presas em 2005 para 240 em 2006. Em relação ao número de presas no sistema policial, a região Norte apresentou apenas os números do estado de Rondônia, que registrou em 2005 cerca de 54 presas e em 2006 cerca de 16.
A região Nordeste apresentou, em 2005, cerca de 2.048 presas no sistema penitenciário e esse número foi elevado para 2.149 mulheres presas em 2006. O estado do Ceará foi o que apresentou um grande aumento da população feminina nesse sistema, de 390 presas em 2005 para 431 em 2006. Em relação ao número de presas no sistema policial, a região Nordeste apresentou apenas os números dos estados de Alagoas, que registrou em 2005 cerca de 13 presas e em 2006 cerca de 23; Maranhão, que registrou em 2005 cerca de 96 presas e em 2006 o mesmo número foi registrado; e Rio Grande do Norte, que registrou em 2005 cerca de 114 presas e em 2006 cerca de 142.
A região Centro-oeste apresentou, em 2005, cerca de 2003 presas no sistema penitenciário e esse número foi elevado para 2.139 mulheres presas em 2006. O Distrito Federal foi o que apresentou um grande aumento da população feminina nesse sistema, de 340 presas em 2005 para 373 em 2006. Em relação ao número de presas no sistema policial, a região Centro-oeste apresentou apenas os números do estado de Goiás, que registrou em 2005 cerca de 132 presas e em 2006 cerca de 135.
A região Sudeste apresentou, em 2005, cerca de 5.683 presas no sistema penitenciário e esse número foi elevado para 7.023 mulheres presas em 2006. Os estados de Minas Gerais e São Paulo apresentaram, de 2005 para 2006, um aumento da população feminina nesse sistema. Em 2005, Minas Gerais tinha 271 presas e São Paulo, 3.903. Em 2006, esse número aumentou para 1.105 e 4.359, respectivamente. Em relação ao número de presas no sistema policial, a região Sudeste apresentou cerca de 5.830 em 2005 e 5.228 em 2006. A região Sudeste é a que apresenta o maior número de mulheres presas em todo o Brasil, tanto no sistema penitenciário quanto no sistema policial.
A região Sul apresentou, em 2005, cerca de 2.148 presas no sistema penitenciário e esse número foi elevado para 3.599 mulheres presas em 2006. O estado do Paraná foi o que apresentou um grande aumento da população feminina nesse sistema, de 568 presas em 2005 para 1.905 em 2006. Em relação ao número de presas no sistema policial, a região Sul apresentou apenas os números dos estados de Paraná, que registrou em 2005 cerca de 601 presas e em 2006, cerca de 602; e Santa Catarina, que registrou em 2005 cerca de 23 presas e em 2006, o mesmo número.


II. PERFIL DA MULHER PRESA

A mulher presa no Brasil hoje é jovem, mãe solteira, afrodescendente e na maioria dos casos, condenada por envolvimento com tráfico de drogas (ou entorpecentes). Ela apresenta um vínculo tão forte com a família que prefere permanecer em uma cadeia pública, insalubre, superlotada e inabitável, mas com chance de receber a visita de sua família e filhos, a ir para uma penitenciária distante, onde poderia eventualmente ter acesso à remição da pena por trabalho ou estudo, e a cursos de profissionalização, além de encontrar melhores condições de habitabilidade.
Observa-se a ausência quase total de dados oficiais nacionais sobre a mulher presa. Há estudos desenvolvidos por jornalistas, pesquisadores, estudantes e algumas poucas publicações produzidas por membros da sociedade civil.
Entretanto, o Estado Brasileiro não dispõe de informação sobre as pessoas encarceradas ou as condições e contexto a que estão submetidas, ainda menos sob uma ótica de gênero.
Alguns estudos realizados em São Paulo (SP) e no Rio de Janeiro (RJ) tornam possível visualizar a situação das mulheres encarceradas nesses estados. Em São Paulo, foi realizado, no ano de 2002, um Censo Penitenciário, e no Rio de Janeiro, um estudo de cinco anos desenvolvido pela Superintendência de Saúde e pela Secretaria de Estado de Administração Penitenciária, levantamentos que nos permitem dizer que as detentas de São Paulo e o Rio de Janeiro compõem 46% do total de presas no país. Nesse sentido, podemos identificar um perfil da mulher presa adaptando dados do DEPEN a esses dois estudos. Segundo o Ministério da Justiça, em 2006 eram 10.139 presas em São Paulo e no Rio de Janeiro, de um total de 22.273 mulheres presas.
O perfil da mulher presa é significativamente diferente daquele do homem preso. De acordo com o Censo Penitenciário de São Paulo, 54% das mulheres presas se declararam solteiras e 12%, separadas, divorciadas ou desquitadas, enquanto 56% dos homens se declararam casados ou com companheira . O estudo da Superintendência de Saúde e da Secretaria de Estado de Administração Penitenciária do Rio de Janeiro demonstrou que a grande maioria dos presos (87,8% entre as mulheres e 86,4% entre os homens) se declarou solteira. No RJ, consta que 84% das mulheres são mães, enquanto somente 66% dos homens são pais. Para os homens, 88,64% dos filhos está com a mãe, porém, a mulher presa não apenas fica longe dos filhos, mas, também, preocupa-se com sua situação econômica. Somente 16,3% dos filhos ficam com o pai. A mulher presa apresenta uma grande preocupação em relação aos parentes, vizinhas ou instituições que estão criando seus filhos. A perda do vínculo com a família é uma constante preocupação da mulher presa. Cerca de 47% delas não recebem visitas ou as recebem menos de uma vez por mês.
Cerca de 40% das mulheres foram condenadas por tráfico de entorpecente, delito considerado hediondo , conforme rol que consta da L.8072/90, que proíbe a progressividade no sistema de cumprimento de penas e a fixação de prazos maiores para a obtenção do livramento condicional . Observa-se, entretanto, que o percentual é bastante variável entre os estados da federação.



Delitos/ Nacional
Crime % homens % mulheres
Tráfico (Lei 6368, Art. 12 e 18) 13% 40%
Roubo (simples e qualificado) 30% 21%
Furto (simples e qualificado) 12,6% 7,4%
Homicídio (simples e qualificado) 11% 6%

Total de homens: 306.240
Total de mulheres: 13.703
Fonte dos dados: DEPEN, novembro de 2006.

Segundo o DEPEN, a maioria das mulheres é primária (72%), enquanto 44% dos homens declararam ser reincidentes. Elas são jovens, mas nem tanto quanto os homens (tabela 1), e a maioria (54%) se declara negra ou parda (afro-descendentes), indicando que há uma sobrerrepresentação das mulheres afrodescendentes encarceradas no Brasil, uma vez que a porcentagem das mulheres negras e pardas na sociedade brasileira em geral é de 42% . Entre as mulheres presas, 65% ou são analfabetas ou não possuem o ensino fundamental completo, em contrariedade ao que assegura o artigo 18 da LEP, que estabelece a obrigatoriedade até esse nível de escolaridade, como assistência devida às pessoas detidas.

• faixa etária:
Mulheres Homens
18 a 24 anos 26% 34%
25 a 29 anos 23% 27%
30 a 34 anos 19% 17%
35 a 45 anos 22% 16%
46 a 60 anos 08% 06%
Mais de 60 anos > 1% 01%
Tabela 1. Total de mulheres: 10.649
Total de homens: 214.951
Fonte dos dados: DEPEN, novembro de 2006

Devido ao fato de a pena mínima por tráfico ser de três anos, 38% das mulheres presas cumprem penas de até 4 anos, enquanto os homens declararam que somente 22% cumprem pena de até 4 anos. Já em relação às penas mais elevadas 25% dos homens têm condenação a penas superiores a 15 anos, enquanto somente 10% das mulheres receberam mais de quinze anos de pena.

 Estrangeiras

A situação da mulher presa fora de seu país merece especial atenção. Em São Paulo, em 2000, havia 40 mulheres estrangeiras condenadas ou em prisão provisória e, em seis anos, esse número ultrapassa 300. Aos obstáculos enfrentados pelas mulheres presas somam-se, no caso das estrangeiras, a distância em relação a familiares, sobretudo os filhos, e as barreiras para a formação de vínculos, seja pela dificuldade imposta pela língua, seja, em termos mais abrangentes, pelas diferenças culturais, expressas em comportamentos, na alimentação, na religião. Além disso, a ausência da preocupação com a tradução, quer na fase de conhecimento – muitas vezes só há tradutor no interrogatório –, quer no curso da execução da pena, impõe um desconhecimento da presa estrangeira em relação à sua situação perante o sistema de justiça criminal. Não obstante, o atendimento médico a mulheres estrangeiras é bastante difícil, na medida em que ora não sabem relatar suas queixas ao médico, ora o próprio diagnóstico fornecido pelo médico não é compreendido .
Além disso, o fato de muitas mulheres estrangeiras não poderem fornecer endereço fixo, acarreta em sua permanência sob custódia, sendo recorrente a negação da liberdade provisória durante a instrução criminal e, também, do livramento condicional. Apesar de haver um esforço para a realização de acordos bilaterais para a transferência de presas, eles ainda são pouco numerosos. Em seis anos de trabalho com presas estrangeiras, o Instituto Terra, Trabalho e Cidadania acompanhou apenas duas transferências, uma para o Canadá e outra para a Argentina.

 Indígenas
O Estatuto do Índio prevê, no artigo 56, que, quando possível, o indígena deve ficar preso em regime especial de semiliberdade no local de funcionamento do órgão federal de assistência aos índios mais próximo da residência do condenado, regra que raramente é aplicada. Embora sejam inexistentes levantamentos que contemplem a questão do indígena, até mesmo porque há um equívoco, por ocasião da descrição do indivíduo, que atribui ao indígena a classificação “pardo” , é preciso dedicar alguma atenção a essa situação.

III. CONDIÇÕES CARCERÁRIAS

O Estado brasileiro não tem garantido, em detrimento do que dispõe seu ordenamento jurídico, condições adequadas para o cumprimento de pena de privação de liberdade nas instituições fechadas no país.
Essa realidade se agrava acentuadamente quando os estabelecimentos são destinados às mulheres. Como já demonstrado na introdução do presente relatório, há um descaso reforçado nas estruturas arquitetônicas e equipamentos internos das instituições fechadas destinadas à população feminina. A evidência desse quadro se dá pela inexistência de unidades prisionais construídas para a população feminina e, pela escancarada e ampla utilização de cadeias públicas e delegacias de polícia que, embora destinadas e apropriadas para detenções de curto período e em caráter provisório, são recorrentemente utilizadas para cumprimento de penas longas pelas mulheres no Brasil.
A discriminação pautada na diferença de gênero, que resta por ocasionar as violações do Estado brasileiro, ocorrem quando é priorizada a construção de unidades prisionais para a população masculina e ao se manter parte significativa da população encarcerada feminina do país em delegacias e cadeias públicas.
A histórica e sistemática priorização no atendimento aos homens encarcerados, somada à diferenciação discriminatória de políticas públicas que não têm apresentado a garantia de isonomia de tratamento entre a população carcerária, acentua as condições de degradação e fomentam o contexto de outras novas e graves violações sofridas pelas mulheres presas.

Ainda entre as violações de direitos humanos comuns aos presos e presas sob a tutela do Estado brasileiro, destacam-se subprodutos dessas violações que se agravam no universo feminino dos cárceres. São violações de gênero que ocorrem no cenário de graves violações, as quais são intensificadas no caso das mulheres, colocando-as, de forma diferenciada e específica, em risco e violando a integridade física, psíquica e emocional das mulheres que cumprem penas ou aguardam julgamento nas instituições oferecidas pelo Estado.
Abaixo estão destacadas essas violações e suas especificidades de gênero, demonstrando uma realidade de maus tratos, agressões e desrespeito nas instituições fechadas destinadas às mulheres.


A. Condições Degradantes

Não se verifica na prática a construção de unidades prisionais específicas para mulheres, nas quais se possam vislumbrar o respeito às especificidades femininas e aos direitos humanos. Como já citado, quase todas as penitenciárias femininas existentes estão localizadas em prédios “reformados”: ou eram penitenciárias masculinas, ou cadeias públicas, ou, ainda, prédios públicos em condições de desativação. Essa realidade determina também que as condições de habitabilidade e salubridade das prisões, sejam penitenciárias ou cadeias públicas, estejam bastante comprometidas. No estado do Espírito Santo, em relação às condições de habitabilidade, a estrutura arquitetônica da Penitenciária Feminina (Tucum) mantém as instalações do manicômio judiciário adaptado, em março de 1996, para receber as mulheres presas. Há duas alas nessa unidade prisional, uma para as presas condenadas e outra para as presas provisórias. Em relação ao fornecimento de artigos de higiene, as presas recebem um kit de produtos de higiene por mês.
A pesquisa realizada pela Pastoral Carcerária verificou que no estado do Pará a penitenciária feminina é um antigo Centro de Reeducação de Menores, que ainda mantém as mesmas instalações e estruturas arquitetônicas da época de sua construção. No Distrito Federal, a Penitenciária Feminina também consiste num antigo Centro de Menores Infratores que, porém, passou por uma adaptação em 1997 para abrigar mulheres, contando hoje com duas alas, uma para as presas sentenciadas e outra para as presas provisórias.
Algumas das poucas instalações originalmente construídas para serem unidades prisionais femininas localizam-se nos estados do Rio Grande do Sul, Penitenciária Feminina Madre Pelletier, onde o encarceramento de sentenciadas e não sentenciadas é feito separadamente; da Bahia, especificamente o Conjunto Penal Feminino, no qual não há divisão entre condenadas e presas provisórias; no Amapá, Penitenciária Feminina, a qual foi construída em setembro de 2005 e apresenta o encarceramento de sentenciadas e presas provisórias de forma distinta.
No Rio de Janeiro, na Penitenciária Talavera Bruce, que apresenta uma população de 331 presas e é informalmente considerada a unidade de melhores condições do estado , foram encontradas alas com superpopulação de até 20 presas em uma única cela e outras em que as celas encontram-se com apenas uma presa. Ao analisar o questionário pertinente a essa unidade constata-se a elevada precariedade: a penitenciária tem apenas um banheiro para cada 20 presas e faltam camas nas celas. Segundo as presas informaram, elas próprias têm que comprar os colchões. Além disso, ainda há grandes vazamentos de um andar para outro que causam, sistematicamente, sérios alagamentos nas alas onde localizam-se as celas . Em termos similares, também no Rio de Janeiro, o Presídio Nelson Hungria, que apresenta capacidade para receber 500 presas e abriga uma população de 474 mulheres, é uma antiga casa de detenção provisória sem qualquer adaptação. As instalações não são adequadas e há superlotação nas celas, existindo aquelas em que o número de presas chega a 50 mulheres, além de haver objetos amontoados devido à escassez de espaço. Não há separação adequada das presas condenadas e daquelas em prisão provisória e o saneamento básico é extremamente deficiente, visto que o prédio apresenta muitas moscas, baratas e rãs. A alimentação demonstra-se, da mesma forma, inadequada, dado que relatos indicam que a comida oferecida às presas, na maioria das vezes, está azeda. O banho de sol tampouco é permitido a contento, ocorrendo apenas duas vezes por semana.
No Estado de São Paulo, Estado da federação no qual estão 41% da população feminina encarcerada no Brasil, a antiga Penitenciária do Estado, inicialmente projetada para abrigar presos homens, construída em 1929, foi desativada e “reformada” e, em dezembro de 2005, foi formalmente inaugurada como Penitenciária Feminina de Sant’Ana. A reforma, no entanto, não contemplou as especificidades femininas nem tampouco a função social de ressocialização e reeducação atribuída à pena de privação de liberdade. Ao analisar a reforma a que o prédio foi submetido, exemplos inequívocos de desrespeito às especificidades femininas transparecem. Mesmo após denúncia formalmente efetivada , na época, pelo grupo de entidades que atuam na defesa das mulheres encarceradas, responsável pela elaboração do presente relatório, às autoridades responsáveis, solicitando que o presídio não fosse inaugurado com as características violatórias relacionadas a seguir, nada foi modificado ou adequado em atenção às detentas. No local do vaso sanitário e do “chuveiro” há uma parede que teria a função de propiciar certa privacidade no banho ou no uso do toalete, mas que tem altura suficiente apenas para cobrir a visão até a cintura. Essa mureta é cortada no meio por uma porta, cujo centro é vazado, e sua frente dá justamente para o vaso sanitário, inviabilizando por conseguinte qualquer privacidade quando necessária.A mesma parede, que pretende conferir certa privacidade, foi construída na época em que a Penitenciária abrigava apenas homens e não tem altura suficiente para esconder os seios, por exemplo, não restando dúvida de que o prédio foi reformado sem observar qualquer especificidade feminina.
No que se refere à estrutura arquitetônica da Penitenciária Feminina de Sant’Ana, a qual tem capacidade é de 2.400 mulheres, esta é composta por três pavilhões, sendo que originalmente era destinada a população masculina, porém com indicação de capacidade para 1.200.
Os únicos espaços destinados a banho de sol e convivência (e nenhum lazer) são os pátios que existem entre cada um dos pavilhões: trata-se de espaço sem cobertura, confinado entre dois pavilhões, de chão de cimento batido, sem sombra, sem quadra, sem banco – sem absolutamente nada além do sol forte. Atualmente, já se encontram encarceradas 2700 mulheres nessa unidade prisional.
Nota-se que, na contramão do raciocínio construtivo, cujo objetivo é garantir o bom resultado do período de reclusão (fim último do princípio do encarceramento), que pressupõe tratamento adequado e o mais individualizado possível, com o objetivo de concretizar o papel ressocializador e reeducador, o complexo tem capacidade para comportar um número extremamente elevado de mulheres, cerca de um quarto da população carcerária feminina presa do Estado de São Paulo – trata-se do maior presídio feminino da América Latina.Embora sua capacidade de lotação seja extremamente exacerbada, as atividades inerentes ao processo de ressocialização são impossibilitadas, uma vez que não há na mesma proporção do número de vagas equipamento necessário para o desenvolvimento de aulas regulares, cursos de profissionalização, atividades culturais, desenvolvimento de trabalho etc. Portanto, na Penitenciária de Sant’Ana não há atividades de lazer e cultura , biblioteca, acesso à educação e visita íntima. Há apenas entre 400 e 500 mulheres trabalhando, restringindo o direito à remição de pena. Não há, também, espaço destinado para amamentação. Por fim, a estrutura arquitetônica não respeita a legislação relativa às adequações necessárias ao acesso de deficientes .
As cadeias públicas apresentam condições muito piores do que as penitenciárias. As condições de saneamento nessas cadeias se caracterizam por falta de água, água contaminada, tubulações quebradas e enferrujadas, que resultam no vazamento de água e de excrementos, que freqüentemente invadem as celas onde as presas se encontram.
Ao lado da inadequação dos alojamentos das presas, as condições insalubres dessas cadeias se repetem em todos os estados. Há cadeias superlotadas onde as detentas têm de dormir no pátio a céu aberto e celas sem cama, nas quais todas as detentas dormem amontoadas no chão, inclusive presas doentes, idosas e grávidas . Algumas celas, quando vistas de fora, se assemelham a verdadeiros tapetes humanos.


B. Violência, Maus Tratos e Agressões

A violência institucional, praticada por agentes do Estado contra as mulheres encarceradas é freqüentemente relatada às organizações da sociedade civil a que elas têm acesso . No entanto, diferentemente da realidade vivenciada pelos homens, os eventos de espancamento coletivos são menos comuns. Torturas individuais são denunciadas, assim como um enfrentamento violento com os funcionários, para os quais o uso da força física é o instrumento de autoridade e poder , apesar das práticas de castigo e humilhação contra as mulheres encarceradas serem freqüentes. A tortura psicológica é amplamente utilizada, por meio da ameaça da violência ou constrangimento sexual, nas unidades prisionais onde os funcionários são homens ou as populações, mistas.
Nos estabelecimentos do sistema penitenciário também ocorrem graves violações contra a integridade física e emocional das presas. Em setembro de 2005, dois agentes prisionais que andam armados dentro do presídio, apontaram armas para uma presa dentro de uma cela, colocando a arma em sua cabeça, porque esta estava ameaçando se matar com cacos de vidro . Também há relatos de tortura nos Estados de Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Paraná, Goiás, São Paulo e Espírito Santo. Porém, é importante reconhecer que há muitas unidades prisionais onde não existem tortura, e diretores que não toleram qualquer tipo de abuso contra as detentas.


C. Violência sexual

As mulheres encarceradas também são submetidas à recorrente violência sexual praticada tanto por funcionários das próprias penitenciárias quanto por presos masculinos em cadeias mistas.
É importante destacar que ainda é uma realidade no Brasil a existência de presídios e cadeias públicas mistos, onde objetivamente homens e mulheres compartilham um mesmo espaço físico. Muitas vezes, formalmente esses espaços estariam separados por muros ou localizados em alas diferentes, supostamente sem acesso. No entanto, a realidade demonstrou que em alguns casos com maior facilidade, e em outros, com alguns obstáculos transponíveis, há contato direto entre os homens e mulheres que estão encarcerados.
Não há dado oficial disponível sobre quantos e quais são as unidades prisionais que ainda possibilitam essa convivência. A título de exemplo destacam-se as seguintes penitenciárias as quais foram visitadas pela Pastoral Carcerária e outras organizações não governamentais e puderam verificar in loco a ocorrência de fatos graves conseqüentes da convivência entre presos e presas.
Em algumas unidades prisionais as mulheres presas também têm que dividir suas celas com adolescentes e homossexuais masculinos.
Na Cadeia Pública de Mossoró, no estado do Rio Grande do Norte, homens homossexuais estão alocados com as mulheres, pois, por serem travestis, não são aceitos nas celas dos homens. As mulheres se queixam de falta total de privacidade na cela. Na Cadeia Pública de Paulo Afonso na Bahia, as presas dividem a cela com os adolescentes, porque eles não podem ficar na cela com os homens adultos. Duas presas ficaram grávidas e todas reclamam da falta de privacidade.
Também não há dados oficiais que informem quantas são as unidades e quantos são os funcionários do sexo masculino que trabalham diretamente com as mulheres presas. Sabe-se que muitas mulheres presas no Brasil encontram-se sob a tutela direta de funcionários homens que têm acesso irrestrito ao interior de suas celas: essa prática é, infelizmente, muito comum nas cadeias públicas do Brasil. A cadeia de Mesquita, no Estado do Rio de Janeiro, não conta com nenhuma carcereira do sexo feminino. A revista inicial realizada na chegada é efetivada por outra presa. A cadeia pública de Amambaí, no estado do Mato Grosso, é mista e as mulheres ocupam uma das celas. Há notícia de que um dos funcionários entrou na cela para ter relações sexuais com uma das detentas, na presença das outras dez companheiras de cela. Na Penitenciária Feminina de Recife, os carcereiros masculinos andam armados dentro do presídio.
Verifica-se, neste universo, além da absoluta falta de privacidade impelida a essas mulheres, que elas sofrem constante violência sexual e engravidam enquanto encontram-se privadas de liberdade nesse tipo misto de instituição fechada e sob a tutela de funcionários homens.Os funcionários, quando não são os responsáveis diretos e exclusivos dos abusos sexuais, compactuam com eles, possibilitando que aconteçam por meio da delegação de privilégios como a posse das chaves que abrem pátios e celas femininas . As mulheres que sofrem violência sexual ou trocam relações sexuais por benefícios ou privilégios não denunciam os agressores por medo, uma vez que vão seguir sob a tutela de seus algozes, ou, ainda por não entenderem que o sexo utilizado como moeda de troca é uma violação grave cometida por um agente público que usa o poder intrínseco à sua posição para coagi-las em uma relação de poder extremamente desfavorável a elas. Ainda que os casos não sejam denunciados, a Pastoral Carcerária e membros de outras entidades de defesa dos direitos humanos recebem notícias de presas sobre colegas que engravidaram de funcionários. Em alguns casos, os próprios funcionários contam sobre outros que teriam coagido detentas a manter relações sexuais. A legislação interna prevê que, em caso de estupro ou atentado violento ao pudor, somente a própria vítima pode iniciar a apresentação de denúncia.

D. Acesso a produtos de higiene

A maioria das mulheres encarceradas não recebe do Estado os produtos essenciais de higiene e asseio, como papel higiênico, pasta de dente, xampú, entre outros. O acesso fica restrito à capacidade da família em comprar e entregar esses produtos nos dias de visita. Acirrando o quadro de extremo desrespeito aos direitos da mulher, a maioria das cadeias públicas não disponibiliza absorventes íntimos para as presas. Há notícias de que aquelas que não têm família ou amigas que possam ceder o produto, passam todo o mês acumulando miolo de pão para improvisar absorventes durante o período menstrual . A pesquisa da Pastoral Carcerária verificou, quanto à distribuição de produtos de higiene, que somente no Estado do Rio Grande do Sul, especificamente na Penitenciária Feminina Madre Pelletier, os produtos de higiene são formalmente disponibilizados a todas; porém, de janeiro a outubro de 2003, não houve distribuição de absorventes íntimos. Na Bahia, por sua vez, os produtos de higiene são fornecidos apenas por doações da igreja.



NORMATIVA INTERNA

Depreende-se da Constituição Federal Brasileira um dever, imposto ao ente responsável pela manutenção da unidade carcerária, de conferir aos detentos e detentas condições mínimas de existência digna. As Regras Mínimas para o tratamento do preso no Brasil traz detalhadamente provisões referentes às condições carcerárias .
Há ainda que se destacar a Lei de Execução Penal do Brasil, que prevê expressamente no art. 10 que a assistência ao preso é dever do Estado, explicitando ainda, em seu artigo 11, que tal assistência alcançará o campo material. De acordo com o art. 88 da LEP, "O condenado será alojado em cela individual que conterá dormitório, aparelho sanitário e lavatório". Seu parágrafo único prevê ainda quais são os requisitos básicos da unidade celular.


IV. Saúde da Mulher no Sistema Prisional Brasileiro

A atenção médica no Sistema Prisional feminino no Brasil também apresenta situações de descaso e falência similares a situação vivenciada nas unidades prisionais masculinas. Contudo, apresenta também características peculiares às doenças físicas e emocionais que, no contexto do encarceramento, incidem com intensidade diferenciada se agravando por meio do não acesso a práticas de prevenção, tratamento e devido acompanhamento médico. Importante salientar que existe um quadro de desatenção a patologias que são intrínsecas a fisiologia da mulher. Outras enfermidades físicas e emocionais, cuja susceptibilidade não tem viés de gênero, no entanto atinge preferencialmente as mulheres encarceradas, como está demonstrado a seguir.
As condições das edificações das unidades prisionais, afetam diretamente a saúde física e mental das mulheres presas. Mais uma vez as más condições de habitabilidade, superpopulação e a insalubridade são fatores fomentadores de doenças infecto contagiosas, como tuberculose, micose, leptospirose, pediculose e sarna. O ambiente degradante contribui com o cenário de baixa estima alimentando doenças de âmbito emocional como a depressão, melancolia, angústia, e pânico.

A. Atenção Integral à Saúde da Mulher

 Equipamentos

Nas cadeias públicas do Brasil, a assistência à saúde é extremamente deficitária. Inexistem dependências destinadas aos cuidados relacionados à saúde. Não há previsão orçamentária para prover qualquer serviço de saúde, ou atendimento emergencial.
Em algumas cadeias públicas uma cela é convertida em enfermaria improvisada, com algum equipamento médico (maca, cadeira odontológica), mas sem profissionais qualificados para promover as consultas médicas. As detentas em cadeias públicas dependem de eventual generosidade do delegado de polícia ou do esforço de alguns carcereiros, sensíveis às suas condições. A Cadeia Pública de Mesquita, no estado Rio de janeiro, por exemplo, abriga 120 presas e é lugar de incidência de sarna, pediculose, micose, bronquite e asma, além das 10 detentas soropositivas. Entretanto, a unidade não apresenta nenhuma estrutura de atendimento médico.
Já nas penitenciárias com regularidade encontram-se lugares improvisados utilizados como enfermaria. Existem poucas celas para observação e poucas asseguram as condições sanitárias adequadas . Na recém reinaugurada Penitenciária de Sant’Ana o acesso à enfermaria está bastante dificultado para presas que estão alocadas no último pavilhão. Entre o último pavilhão e o Centro de Saúde as presas têm que percorrer quatro lances de escadas e passar por oito portões. No estado da Bahia, o Conjunto Penal Feminino, única penitenciária feminina do estado, apesar de abrigas 220 presas, não possui nenhum equipamento e utiliza a Central médica Penitenciária para fins de atendimento médico.




 Equipe médica

Não existe equipe de saúde nas cadeias públicas . O atendimento, quando necessário é realizado pelo serviço público da cidade onde está localizada a instituição. Alguns profissionais, médicos, enfermeiros, assistentes sociais, ginecologistas, se tornam voluntários para oferecer gratuitamente seus serviços.
Já nas penitenciárias apesar de existirem equipes médicas, estas geralmente estão incompletas ou os profissionais de saúde só atendem em tempo parcial . O Plano Nacional de Saúde no Sistema Penitenciário , criado a partir da Portaria Interministerial no. 1.777/2003, não inclui as cadeias públicas, portanto as mesmas não compartilham o orçamento do Governo Federal destinado às políticas de saúde para o Sistema Prisional . A Penitenciária Nelson Hungria, no estado do Rio de Janeiro, a qual abriga 474 detentas, não possui assistência médica adequada apesar de estar inscrita no referido Plano Nacional de Saúde do governo federal o qual prevê equipes de qualidade mínima de atendimento.

 Atendimento médico fora das unidades prisionais

O maior obstáculo ao atendimento médico nos hospitais e postos de saúde públicos é a falta de escolta policial. Situações de emergência, consultas agendadas ficam prejudicadas pela ausência ou atraso da escolta policial, que fica a cargo da polícia e alega a falta de pessoal, veículos e recursos para atender as solicitações da administração penitenciária. No cotidiano das unidades prisionais as solicitações de escolta para atendimento de saúde competem com as escoltas para o atendimento às requisições judiciais. Os diretores relatam que chegam a perder 7 de cada 10 consultas por falta de escolta. As mulheres presas não conseguem realizar tratamento médico com atendimento ambulatorial continuado porque a ausência da escolta impossibilita a freqüência necessária para garantir a vaga.

 Atendimento ginecológico

Não está disponível atendimento ginecológico nas Cadeias Públicas. Como todas as equipes médicas os profissionais especializados vinculados às unidades prisionais do sistema penitenciário, os ginecologistas também não estão disponíveis nas instituições femininas. Acirrando o quadro de violação dos direitos das mulheres o Estado brasileiro não assegura atenção médica integral à mulher encarcerada. A deficiência encontrada no atendimento nas unidades do sistema penitenciário destinado aos homens se multiplica quando se trata de especialistas nas necessidades femininas. Em decorrência dessa omissão, o controle e tratamento de doenças sexualmente transmissíveis também inexistem, assim como os exames de rotina de prevenção de câncer ginecológico.
O exame Papanicolau, que pesquisa a possibilidade de Câncer nos órgãos genitais e reprodutores também embora deva ser realizado uma vez ao ano, na grande maioria das unidades prisionais nunca foi disponibilizado tal exame para controle. O câncer da mama é a neoplasia maligna de maior incidência e maior causa de morte entre as mulheres; a detecção precoce tem ensejado altos índices de cura com menores seqüelas físicas e emocionais; a mamografia é o exame que possibilita a detecção precoce de lesões iniciais, diminuindo a mortalidade por esta neoplasia. A realidade é que a maior parte das mulheres presas nem sequer chega ao patamar de realização de consulta médica para verificação da necessidade do exame de mamografia. Dos 17 estados pesquisados somente três, Espírito Santo, Rio Grande do Sul e Amapá afirmaram haver a realização adequada dos exames referidos. O restante dos estados não forneceu informações, tendo alguns informado apenas sobre a falta de atendimento médico.
No Estado de São Paulo a Secretaria de Saúde do Estado realizou mutirão de exame de mamografia no ano de 2005 e não garantiu às mulheres encarceradas a possibilidade de efetivar seus exames. Ainda que as autoridades afirmem haver boa vontade para que as presas sejam também abrangidas pelas campanhas preventivas, o acesso a elas fica impossibilitado pela inexistência de uma estrutura que leve as presas aos locais de realização dos exames ou que leve para as unidades prisionais os equipamentos necessários.
A solicitação de exame de HIV e outros exames preventivos não são prontamente realizados, e quando são efetivados, há casos em que os resultados não são compartilhados com as interessadas ou comunicados a um médico por meses. E quando detectadas tais doenças, que exigem um cuidado especial, o tratamento respectivo não é necessariamente oferecido pelo Estado. As presas soropositivas que já se tratavam antes do encarceramento reclamam que ao ingressarem no cárcere ficam meses sem acesso aos remédios interrompendo seus tratamentos e, por conseqüência colocando em risco suas vidas. Outras denunciam que após tomarem ciência da contaminação também não receberam medicamento necessário.

 Medicamentos

A carência de medicamentos constitui um dos maiores problemas do sistema prisional em praticamente todos os estados.A falta de medicamentos determina que os médicos ministrem analgésicos para aliviar a dor, ou segundo as detentas, para resolver qualquer problema de saúde. Nos estados do Espírito Santo e Rio de Janeiro, as unidades pesquisadas afirmaram ser a falta de medicamentos o mais grave problema de saúde.
Dos 17 estados pesquisados, 8 afirmaram abrigar presas que estão sob tratamento com remédios controlados. Desses estados destacam-se o Espírito Santo no qual das presas da Penitenciária Estadual Feminina 1/5 se encontra em tal situação; o Distrito Federal no qual a unidade pesquisada apresenta 117 das 318 presas sob medicação controlada e o estado de Goiás, no qual 18 das 70 presas na Penitenciária Feminina de Goiânia tratam-se com os referidos medicamentos.
As Cadeias Públicas, e mesmo algumas penitenciárias dependem de doações da comunidade local para adquirir os medicamentos que as detentas necessitam.

 Vacinação

O Governo Federal e os Governos Estaduais realizam anualmente diversas campanhas de vacinação, mas à população encarcerada não é garantido, ou mesmo possibilitado, o acesso a essas vacinas.
Por exemplo, a vacinação contra gripe para idosos acontece todos os anos e em muitos estados a população carcerária está sendo permanentemente excluída do atendimento.
Os dados do Censo Penitenciário, realizado pela Funap/SP, indicam que há cerca de 2% de presos na faixa etária superior a cinqüenta e cinco anos e cerca de 3% de presas. Este percentual deve se repetir, com pequenas variantes em todo o país.

 Exame pré-natal e atendimento na gravidez e no parto

Atendimento pré-natal é um direito tanto do nascituro quanto da mãe, que amiúde não é respeitado nos cárceres do Brasil. Há presas sem qualquer atendimento pré-natal e acabam descobrindo serem soropositivas e portadoras de outras doenças transmissíveis, como sífilis, só na hora do parto. Esta situação, além de colocar em risco a saúde do neonato, causa um impacto psicológico profundo na mãe.
As direções das cadeias públicas, e de algumas penitenciárias, mesmo quando preocupadas em promover o acompanhamento pré-natal das gestantes, vêem-se impossibilitadas de tomar qualquer atitude.
Uma cadeia com capacidade para 24 pessoas e com uma população de mais de 200 presas , geralmente funciona com o número de carcereiros para uma cadeia de 24 pessoas. Ou seja, nesses anos, quando aumentou a população prisional feminina, não se viu um correspondente aumento do número de funcionários. Faltam viaturas ou faltam carcereiros para cumprir qualquer diligência além do transporte ao pronto socorro. Entre uma consulta de pré-natal e uma audiência no fórum ou uma emergência de saúde, a consulta de pré-natal não será realizada.
Somente no ano 2006, vários partos acontecerem nos pátios ou nas celas de unidades prisionais. Há o conhecimento de casos que uma mulher deu à luz na viatura policial no caminho do hospital. Entre esses partos, um bebê nasceu no pátio da cadeia e chegou a falecer no hospital; um outro, nascido numa cela da Penitenciária Feminina de Sant´Ana, com outra presa como parteira, era de uma mãe soropositiva e a criança não recebeu o devido atendimento a tempo. Na Cadeia Pública de Santo António de Posse, três detentas chegaram a receber injeções para secar o leite materno e foram informadas que não havia como “usufruir” o direito de amamentar seus filhos.

B. Controle e prevenção de doenças

Em muitas unidades prisionais, especialmente em cadeias públicas, o controle e prevenção de doenças são inexistentes. Com relação à prevenção, não existe qualquer programa voltado à prática de atividades físicas, laborais e recreativas, que são de extrema importância à saúde mental, física, além de contribuírem para evitar doenças. As mulheres estão submetidas ao ócio.

C. Saúde mental

Para presas com problemas psiquiátricos, faltam hospitais de custódia em muitos estados brasileiros e geralmente não existe tratamento adequado na unidade onde elas se encontram. Com a falta de unidades específicas para portadoras de doenças mentais ou transtornos psicológicos, muitas detentas acabam vivendo em meio a população geral, onde são exploradas, as vezes agredidas, ou simplesmente suportadas pelas demais, sem receber o devido tratamento especializado que necessitam . Muitas vezes, elas são colocadas no “castigo” (isolamento) porque não conseguem se adequar às regras internas das detentas ou da unidade, ou ainda, são alocadas no seguro por não serem mais aceitas pela população carcerária .
Às presas que se encontram detidas em caráter provisório não recebem qualquer atendimento ou consulta médica pra detectar e acompanhar eventuais problemas de saúde mental. É apenas e tão somente a partir da sentença, cuja espera pode durar anos, que essa preocupação pode passar a ser considerada e atendida pelo estado. As conseqüências dessa omissão são desastrosas. Muitas mulheres com transtornos mentais são colocadas no convívio cotidiano com as demais presas, onde sofrem maus-tratos, até que se descubra que seus atos, não compreendidos e aceitos, são próprios de quem sofre algum transtorno psíquico.
Há um alto número de mulheres que fazem uso de medicamentos controlados ou antidepressivos.

Presídio/Estado Ano População do presídio População que toma remédio controlado % da população geral
Consuela Nasser, GO 2005 70 18 26%
Tucum, ES 2007 351 35 10%
Conjunto Penal Feminina, BA 2007 220 37 17%
Pará 2007 180 11 6%
Rio Grande do Sul 2007 235 54 23%
Brasília 2007 318 117 37%
Amapá 2007 57 1 1,7%
Romero Neto, RJ 2006 280 41 15%
Talavera Bruce, RJ 2006 310 18 6%

Tendo em vista a inexistência de informações e estudos sobre a situação da mulher presa, é difícil analisar porquê há um índice tão alto de mulheres utilizando remédios controlados dentro do presídio. Em quase todos os Estados da Federação essa realidade está presente, indicando que muitas mulheres que não necessitavam de medicamentos controlados até serem presas passam a uitlizá-los depois do encarceramento para lidar com as dificuldades que a realidade de ser presa traz.

Nos últimos anos, com o aumento do uso de “crack”, o perfil da mulher sob medida de segurança, ou necessitando tratamento médico voltado ao consumo de drogas, tem se aumentado muito. É uma população mais agitada, mais jovem e com mais dificuldade em suas relações sociais.


 Isolamento

O isolamento tem gerado conseqüências danosas para a saúde mental das mulheres, que parecem encontrar mais dificuldades que os homens quando são obrigadas a permanecer por muito tempo isoladas. Este quadro se agravou depois da criação do regime disciplinar diferenciado (RDD) , para onde homens e mulheres são enviados, como forma de sanção, para permanecer por até um ano em isolamento. Muitas mulheres entram em depressão profunda apresentando risco da pratica de suicídio.

D. Drogas

Não se pode tratar da mulher presa sem entrar da relação que ela tem com a droga. Basta recordar que só no estado de São Paulo mais de 50% das mulheres presas foram condenadas devido ao envolvimento com o tráfico de drogas. Esse índice eleva-se para 60% no estado do Rio e Janeiro. Algumas unidades prisionais alcançam a cifra de 80% de mulheres presas pelo envolvimento com drogas. São mulheres que geralmente ocupam papel menor no tráfico ou que o fazem somente porque também são usuárias e necessitam comercializar para consumir. Ainda, em algumas unidades prisionais encontramos mulheres envolvidas com o tráfico e a prostituição. As próprias detentas costumam dizer que se prostituem e praticam um pequeno comércio de drogas por serem dependentes de entorpecentes. As unidades pesquisadas nos estados de Pernambuco e Goiás afirmaram ser as drogas um grave problema para a Pentenciária.
O consumo de drogas é demasiadamente alto nas unidades prisionais. Porém o Estado não reconhece oficialmente a existência de drogas em locais de detenção, pois se o faz, admite que seus próprios agentes participam do acesso e distribuição da droga ou, no mínimo, convivem pacificamente com a presença ilegal da droga no interior das unidades prisionais. Como conseqüência, as autoridades responsáveis deixam de agir preventivamente pelo controle do consumo de drogas. No Estado do Rio de Janeiro estudo oficial indic