II Prêmio Fórum Justiça de Direitos Humanos do Rio Grande do Sul
O Fórum Justiça do Rio Grande do Sul informa que estão abertas as inscrições do II Prêmio Fórum Justiça de Direitos Humanos, o qual selecionará as melhores práticas e experiências em direitos humanos executadas no território do Rio Grande do Sul, conforme as categorias relacionadas aos eixos temáticos do Fórum Justiça. Nesta edição serão contempladas às proposições que considerem o enfrentamento à crise climática que assola o Rio Grande do Sul em decorrência das enchentes, conforme categorias: Enfrentamento às injustiças ambientais e seu entrelaçamento com o racismo, sexismo e desigualdades sociais; Ações solidárias emergenciais da sociedade civil para a reconstrução do estado; Violência institucional e seu agravamento nas emergências climáticas; A defesa do trabalho e emprego no contexto das emergências climáticas; Arte, Educação e sua vinculação com os Direitos Humanos. Serão conferidos certificados às três experiências e práticas em direitos humanos em cada uma das categorias do Prêmio, elencadas, as quais serão selecionadas pela Comissão Avaliadora. Para conferir publicidade às experiências e práticas inscritas, as propostas selecionadas serão divulgadas em evento a ser realizado em data e local posteriormente publicizados, aberto à participação da comunidade jurídica, acadêmica e de movimentos sociais. O Fórum Justiça Rio Grande do Sul e os apoiadores do II Prêmio Fórum Justiça de Direitos Humanos buscarão viabilizar fomentos culturais aos vencedores de cada categoria, que serão indicados no dia da premiação. O prazo de envio da(s) proposta(s) é até o dia 20 de outubro de 2024. Veja mais informações sobre as inscrições no edital do II Prêmio Fórum Justiça de Direitos Humanos. Link para o edital: https://forumjustica.com.br/wp-content/uploads/2024/09/Edital_Premio_FJ_RS_20241.pdf
AJD repudia declarações do prefeito Sebastião Melo
A Associação Juízas e Juízes para a Democracia - AJD - por meio do Núcleo do Rio Grande do Sul, José Paulo Bisol -, vem a público, em face da declaração proferida em entrevista concedida, no dia de ontem (12), pelo Prefeito do Município de Porto Alegre, Sr. Sebastião Mello, registrar, observar, repudiar, lamentar, enfatizar e esclarecer, o que segue: 1. REGISTRAR que a Constituição Federal, Carta Magna do Estado Democrático de Direito, é clara e inequívoca ao determinar que os Poderes são independentes e harmônicos entre si. Sendo assim, não há obrigatoriedade da participação do Poder Judiciário em reuniões que, neste caso, buscam implementar ações higienistas e desumanas, capitaneadas pelo Poder Executivo Municipal, em detrimento de pessoas que, mesmo ainda em cumprimento de pena, encontram-se em regime de liberdade decorrente do sistema progressivo, previsto em lei (art. 112 da LEP), e que tem por escopo a reintegração das pessoas condenadas ao convívio social e familiar; 2. OBSERVAR que muitas dessas pessoas, ainda em cumprimento de suas penas, deveriam estar sob a constante vigilância do Estado, porém isto não ocorre por omissão do Poder Executivo Estadual, que há 12 anos não oferta vagas nas unidades prisionais para o regime semiaberto, tampouco disponibiliza as tornozeleiras eletrônicas, em número suficiente, para o cumprimento da pena mediante monitoramento eletrônico; 3. REPUDIAR a tentativa de imputar responsabilidade de casos que possam atentar contra a Segurança Pública ao Poder Judiciário e seus integrantes, quando cediço que tal responsabilidade, de acordo com a Constituição Federal, compete aos diferentes órgãos policiais, todos vinculadas ao Poder Executivo; 4. LAMENTAR a afirmação de que as pessoas que cumprem suas penas, em regime autorizado por lei e por decisão judicial, encontrando-se em situação de liberdade, com ou sem monitoramento eletrônico, sejam consideradas seres humanos indignos e, por isso, capazes de “CONTAMINAR” outras pessoas, quando em convívio comum nos abrigos oferecidos a partir da situação de catástrofe socioambiental que assola nosso Estado. Ademais disso, a palavra "contaminação" sugere que as demais pessoas abrigadas passariam a delinquir pelo mero contato com pessoas apenadas, conjectura ofensiva a todas essas pessoas em momento de extrema vulnerabilidade; 5. ENFATIZAR que a situação de catástrofe ambiental não suspende o dever e a responsabilidade do Estado de zelar pelos direitos humanos de toda e qualquer pessoa afetada, prestando-lhe assistência, incluindo aquelas em cumprimento de pena. Dessa forma, estando os apenados desalojados em decorrência das condições socioambientais adversas, merecem tratamento isonômico com os demais desabrigados, porquanto a pena imposta não lhes retira o atributo da dignidade da pessoa humana, fundamento da República Federativa do Brasil nos termos do art. 1º, III, da Constituição Federal; 6. ESCLARECER que tais declarações proferidas pelo Sr. Prefeito Sebastião Mello, ao invés de tranquilizarem as pessoas que estão amargando as consequências físicas, emocionais e materiais do desabrigamento (perdas de parentes e amigos, destruição das residências com perdas materiais e de valor afetivo), servem para agravar o sofrimento que já enfrentam, ao trazer mais preocupações. Nesse momento de tanta tristeza e desesperança, o que se almeja de um chefe do executivo municipal são condutas concretas - que não sejam discriminatórias e preconceituosas – em estrito cumprimento aos termos de nossa Constituição Federal, propiciando às vítimas, independentemente de suas condições pessoais, sociais e econômicas, acolhimento seguro e adequado, abstendo-se, inclusive, de desviar o foco da gravíssima situação do nosso Estado. Por fim, eventuais omissões do Poder Público na adoção de medidas preventivas, tais como aquelas apontadas por opiniões técnicas abalizadas, veiculadas pela imprensa em relação ao sistema de contenção de cheias em Porto Alegre, deverão ser apuradas oportunamente. O momento atual reclama a efetivação, pelo Poder Público, de medidas concretas que atenuem as consequências e o sofrimento da população gaúcha, direcionando todos os esforços nesse sentido. Porto Alegre, 13 de maio de 2024.
Decolonialismo Judicial Amazônico: a urgência de uma justiça representativa e emancipatória na Amazônia
Imagem: Wirestock no Freepik A Amazônia, bioma de importância vital para o equilíbrio climático global, encontra-se em xeque. A região é alvo de graves ameaças como o desmatamento, a escravidão contemporânea renitente, a grilagem, a mineração ilegal, o tráfico de drogas e a violência. Essas ameaças não são apenas ambientais, mas especialmente de caráter social e econômico. Impactam diretamente a vida dos povos indígenas, das comunidades tradicionais e dos trabalhadores e trabalhadoras de toda a região amazônica. A Justiça brasileira tem papel fundamental a desempenhar na defesa da Amazônia, na consecução e conformação da conduta humana em seu espaço geográfico. No entanto, a estrutura judicial da região é marcada por um colonialismo endógeno que, ao fim, acentua suas desigualdades e desconsidera suas especificidades. Na Amazônia vivem cerca de 13% (dez por cento) da população brasileira, mais de 28 milhões de habitantes, que habitam mais da metade do território nacional. Paradoxalmente, o Sistema de Justiça se apresenta neste território de forma limitada, amputada, parcial, sem efetiva representação dos povos da floresta. Essa ausência de representatividade aponta para um grave déficit democrático. Disse a Ministra Rosa Weber, então presidente do STF e do CNJ, por ocasião do Seminário Direitos Humanos, CNJ, em 22 de setembro de 2023: Racismo Ambiental, Migrações e Ações Coletivas: “A Amazônia, a despeito da grande visibilidade no Brasil e no mundo pela importância assumida no cenário ambiental, é território de escassa presença do Estado, inclusive do Estado-juiz. (...) Quanto à proteção judicial, a Amazônia Legal igualmente congrega a menor capilaridade do Judiciário, não obstante sedie grande diversidade de povos e comunidades tradicionais e alcance cerca de 60% do território brasileiro, desafios a exigir organização e integração do Poder Público para garantia do exercício de direitos fundamentais e da dignidade humana às pessoas residentes na região”. A Amazônia não alcança representatividade judicial em especial nos órgãos de cúpula. Nenhum dos 11(onze) ministros do Supremo Tribunal são amazônidas. Também não há tribunal federal com sede na região. É a única região brasileira com essa negação jurisdicional. Questões fundamentais para a sustentabilidade amazônica - ambientais, indígenas, fundiárias, previdenciárias - são decididas por e a partir da longínqua Brasília, sede do TRF1 Tribunal Regional Federal da 1ª Região. Adiante, os únicos estados brasileiros que não possuem um tribunal do trabalho próprio são o Amapá, o Acre, Rondônia e o Tocantins, estados amazônicos. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) possui 1(um) único representante amazônico entre seus 33(trinta e três) ministros. O Tribunal Superior do Trabalho (TST) não possui nenhum ministro da Região Norte entre os seus 27(vinte e sete) ministros. Os únicos estados brasileiros que não detém turmas recursais próprias também estão na Amazônia. Essas negações e desigualdades em relação às demais regiões do país conspiram contra o ideal constitucional de redução das desigualdades regionais. Mais, dificultam a defesa dos interesses legítimos da Amazônia, de sua biodiversidade, do meio ambiente, bem como da promoção dos direitos dos povos indígenas e tradicionais e da promoção do direito ao trabalho decente dos trabalhadores e das trabalhadoras da região, tão necessários na presente quadra histórica. O decolonialismo judicial amazônico é expressão que - a partir dos conceitos de necessária desconstrução do colonialismo que nos permeia - tem a clara pretensão de promover um processo de transformação da estrutura judicial da região, de modo a torná-la mais representativa e, portanto, inclusiva e democrática. Essa transformação precisa contemplar os seguintes aspectos, sem prejuízo de outras valiosas contribuições: Presença no STF e nos Tribunais Superiores de representantes amazônicos(as): evidente a carência representativa, tal se impõe pela observância e proteção da própria sociedade democrática que se visa construir em território nacional. Criação de um tribunal federal amazônico: esse tribunal seria o responsável por julgar os casos mais candentes e relevantes para a sustentabilidade da região, como os relacionados ao meio ambiente, aos direitos previdenciários e às questões indígena e fundiária, incluída aí a necessária criação de turmas recursais em todos os estados amazônicos. Criação de tribunais do trabalho nos estados amazônicos: essa medida facilitaria o acesso à justiça para os trabalhadores e trabalhadoras da região e em todas as suas unidades federativas, conformando a atividade humana no seu sentido emancipatório e protetivo, conspirando ao fim e ao cabo para a sustentabilidade do meio ambiente amazônico, incluído aí necessária higidez do meio ambiente laboral constitucional. O decolonialismo judicial amazônico é, portanto, um processo urgente e necessário com a consequente criação e implementação de tribunais e órgãos jurisdicionais que conformem a atividade humana e promovam a vida e a sustentabilidade amazônicas. Ele é fundamental para a construção de uma Amazônia mais justa, sustentável e próspera. A Justiça amazônica deve ser adequada às especificidades da região e ser aplicada por quem entenda e viva os desafios da região. Só assim ela poderá ser um instrumento de transformação social, promover o trabalho decente e emancipatório e contribuir para o urgente equilíbrio climático global.